após
receber os sacramentos
a
fé no criador
a
plenitude
ele lambuzou-se
todo
mergulhou
foi até
o fim
nas águas
da vida
delfim
.
após
receber os sacramentos
a
fé no criador
a
plenitude
ele lambuzou-se
todo
mergulhou
foi até
o fim
nas águas
da vida
delfim
.
diapasão
a vibrar
desmedidas.
série
desarmônica.
princípio
das incertezas.
Heisenberg
bêbado
na
madruga.
coordenadas
dis
sonantes
cicatrizes
de
plâncton.
ardentia
sem lua.
saliva
de estrelas
cadentes.
cintilante
caos.
noite
profunda
ou ela já nos diz
tchau?
somos
todos impotentes
perante
a vida.
a vida é
um sonho
ou será
que é a morte?
hoje me
olhei no espelho
e não me
vi.
tudo que
havia em mim
não
reconheci.
quando
eu morrer
eu quero
fogo.
os
lábios e o jogo
mesmo
que no inferno.
hoje eu
renasci
percebi
que viver é estar
apegado
à morte.
quando estiver
realmente morto
quero
ver todos chorando.
principalmente
ela,
porque
por ela eu já chorei
muito.
quando
morrer,
não
quero luto.
quando
morrer,
eu quero
ludo.
na hora
de minha morte
vou
negociar.
berrar
como um bezerro.
se
quiser, leva o Silva
não eu,
vou gritar.
se não
quiser,
leve o
Bezerra.
para Donizete Galvão
Ficamos
atentos
aos ritmos,
aos movimentos
às bordas da mata.
Fiquei
atento
as suas falas
aos seus escritos
que só dizem
o necessário.
Fiquei
atento
aos pontos luminosos
de sua biografia lavrada
em páginas alvas.
Ainda
estou atento
aos frutos tardios
que despencam
sobre nossa ignorância.
Muitos
ficarão atentos
aos rizomas
que se tramam
em seu texto.
Os
poetas sabem,
comungam na religião original
da humanidade.
A atenção
é nossa forma natural
de oração.
quando estou sozinho
sou só
sou só eu
eu sou eu.
quando estás comigo
sou quase eu
sou mais que eu
sou nós
sou voz.
Aquelas águas-vivas
envolvidas em algas e sargaços
brilhavam na areia da praia
feito diamantes não lapidados.
Traziam a memória de um tempo
sem começo.
Uma infância irrealizada
entre as praias e a brisa
de Ilhéus.
Um menino arrancado
de seu berço de sal e sol
atirado sem dó,
sem nota
qualquer
no abraço concreto
das noites do sul.
Um cacau tomado
pelo fungo.
O exílio em outras terras
do sem fim.
Pra encantar mulher
muzamba
eis aqui outra ciranda.
Samba
é nome angolês
mas quem é bamba
canta
até em tirolês.
Imagem: Ciranda dos
Meninos, MATIZES DUMONT (bordados contemporâneos).
para Márcio-André
Enquanto o sol irradia
e a manhã nos impulsiona
sôfregos à procura
da paz
da plenitude da vida
da realização efetiva
de uma recepção ideal.
Um poeta revisita
corajoso
o lugar mais pacífico
do mundo
- sim, Freud, um poeta
sempre chega antes.
Com sua poesia,
em voz alta,
contamina o silêncio
petrificado – quase
absoluto - do local
radioativo.
Lá, a paz se fez
plena.
Lá, tudo conspira
a uma digna exaltação
da vida.
O poeta constata
com inapta resignação
que o coração humano
é realmente mais complexo
do que a fissão
de um átomo.
[Foto da abandonada Pripyat,
cidade fantasma do norte da Ucrânia. Ela ficava bem próxima à central nuclear
de Chernobil, onde ocorreu o maior acidente nuclear da história]
O rio
continua fluindo.
O pássaro-preto
bicando a porta.
O relógio
tiquetaqueando.
E as
perguntas, ainda sem respostas.
é preciso ser verdadeiro
para entrar em contato
com a verdade.
não nos é permitido
tomar o céu
de assalto.
tudo o
que ainda
não tem
cerca
nem
muros
o que
nos cerca
até um
monturo
tem vida
mesmo
que
moribunda.
muito
dos mundos
por nós
criados
já foram
há muito
devorados.
resta-nos
a tarefa
imensurável
não de explicá-los,
mas de reconfigurá-los.
Amar é como ouvir
música.
Intuir a frequência
de ondas
fundamentais.
Existenciar
o que ainda não é
no ser
amado.
Um gesto move o universo
inteiro.
Elimina o tempo. Reinventa
o espaço.
Hong Yan e seu nome
perderam-se nas dobras
da história.
Mas seu gesto continua
em minha gesta.
Seu mestre morto
na batalha
não podia ser profanado.
Hong Yan rasga
o próprio ventre
e nele assenta o fígado
do mestre.
A desonra assim foi evitada.
A morada do espírito manteve-se
intacta.
As gestas se desdobram.
No séc. 13, o buda Nichiren Daishonin louva seu
discípulo Shijo Kingo dizendo: “O senhor acompanhou Nichiren, jurando dar sua
vida como um devoto do Sutra do Lótus. Essa sua atitude é cem, mil, dez mil
vezes superior a de Hong Yan, que abriu o próprio ventre para inserir o fígado
de seu senhor falecido, o duque de Yi [a fim de salvá-lo da desonra e
humilhação]”.
Ouvir o repuxo das baleias.
Enfileirar todas as conchas
retiradas das areias que pisei.
Nomear cada uma
com os medos que superei.
Jogá-las de volta ao mar
como contas de um rosário.
O mar - lugar de onde nunca
deveriam ter saído.
Expelir a água salgada
pelos poros.
Rabiscar na areia um novo
escapulário: sou feliz
e não me arrependo de nada.