15 novembro 2007
Roberto Piva
A PIEDADE
Eu urrava nos poliedros da Justiça meu momento
abatido na extrema paliçada
os professores falavam da vontade de dominar e da
luta pela vida
as senhoras católicas são piedosas
os comunistas são piedosos
os comerciantes são piedosos
só eu não sou piedoso
se eu fosse piedoso meu sexo seria dócil e só se ergueria
aos sábados à noite
eu seria um bom filho meus colegas me chamariam
cu-de-ferro e me fariam perguntas: por que navio
bóia? por que prego afunda?
eu deixaria proliferar uma úlcera e admiraria as
estátuas de fortes dentaduras
iria a bailes onde eu não poderia levar meus amigos
pederastas ou barbudos
eu me universalizaria no senso comum e eles diriam
que tenho todas as virtudes
eu não sou piedoso
eu nunca poderei ser piedoso
meus olhos retinem e tingem-se de verde
Os arranha-céus de carniça se decompõem nos
pavimentos
os adolescentes nas escolas bufam como cadelas
asfixiadas
arcanjos de enxofre bombardeiam o horizonte através
dos meus sonhos
[Confira, também, entrevista quentinha com o Piva na TV CRONÓPIOS]
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"Só eu não sou piedoso" me remeteu ao Poema em linha reta, do Álvaro de campos!
ResponderExcluirAna Guimarães
Edson, é uma felicidade saber que a poesia persiste, límpida e bizarra, como deve ser, depois das décadas onde foi subjugada por poetas cuja aspiração máxima é algo próximo a um mero telegrama.
ResponderExcluirEncontrar Roberto Piva é um privilégio, ainda mais nesses tempos de vozes adolescentes que balbuciam senilidades. Abraço, ótima parada o seu blog.