Em João Pessoa, encontrei-me com o ficcionista e editor Pedro Salgueiro, que me mostrou seus novos rebentos: dois números da revista Para Mamíferos. Uma grande surpresa a revista. Criação de alto nível, traduções, entrevistas, dossiês, fotografia. Esses cearenses, realmente, não brincam em serviço. Já havia comentado, recentemente, sobre o Corsário, que além de virtual também terá edição impressa. Carlos Emílio C. Lima me avisa que recebeu um prêmio para continuar editando a famosa Arraia PajéUrbe. Que, por sinal, também terá versão on-line.
Na edição 1 da revista, temos um conto inédito de Dalton Trevisan (O viúvo) e uma longa entrevista com a escritora Ana Miranda (e suas múltiplas dicções) que diz coisas como:
“Acho que é do Mário Quintana a frase que diz que os livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas, os livros só mudam as pessoas. Depois de ler um livro, a pessoa não é mais a mesma, claro, é um processo antropofágico de devoração mútua, o leitor se transforma no autor e o autor se transforma no leitor.”
“Meu novo romance percorreu um longo caminho, desde um sonho que tive nos anos 1980, ao ler os textos instrumentais de Antonio Vieira, um sonho com o padre Vieira e uma índia que lhe remendava a batina, até chegar a Yuxin. Sempre desejei entrar no tema indígena, porque somos, os cearenses, descendentes de índios, carregamos a alma indígena em nosso ser. E porque minha irmã Marlui Miranda manteve esse tema vivo em minha vida, trazendo-me seu trabalho com a música indígena. […] Minha irmã saía em direção a alguma aldeia, e retornava trazendo a atmosfera selvagem. Mas com tudo isso eu não conseguia penetrar na dicção de uma narradora índia, o material referente à fala dos índios é parco, eles são ágrafos, e quando publicam, geralmente é usando padrões não-índios. Então eu só encontrava pequenos depoimentos citados em livros, ou ouvia as gravações de minha irmã. Um dia encontrei um livro preparado por Capistrano de Abreu, um vocabulário da língua caxinauá, com umas setecentas páginas de depoimento de dois índios, na língua original e traduzidas literalmente, onde pude observar a construção, as repetições, o ritmo… era o que eu mais desejava encontrar. Mergulhei no livro, e ele foi me afastando do sonho com Vieira, levou-me a uma situação pessoal, pois a região a que se refere o livro de Capistrano de Abreu foi colonizada por cearenses, no Alto Juruá, Acre. Essa é mais ou menos a gênese do livro. Ele é uma narrativa da floresta, são as vozes da floresta, cantadas pela voz de uma índia. Os índios não têm um ego, como nós, então ela, a floresta, os bichos, são um ser só.”
Sobre crítica literária:
“A verdadeira crítica literária é benéfica, e isso existe no Brasil, embora encerrada no meio acadêmico. […] A imprensa tem altos e baixos. É algo mais com o intuito de reportar, do que de refletir sobre algum livro. É mais notícia do que crítica, e feita em más condições, pressa, falta de recursos, muitas vezes por jornalistas não especializados, que se vêem com caixas pretas em suas mãos. […]”
Nessa mesma edição, a revista disponibiliza encartada a reprodução de uma página do texto original do romance Yuxin. Um quitute para a crítica genética.
E olha que só dei alguns exemplos da edição 1. Imaginem, então, a Nº 2.
A revista é editada por: Glauco Sobreira, Jesus Irajacy, Nerilson Moreira, Pedro Salgueiro, Raymundo Netto e Tércia Montenegro. O projeto gráfico é de Saul Ferreira. Para conseguir um exemplar, envie um email para paramamiferos@gmail.com
Que venham mais rebentos como esses. Aguardo, também, notícias literárias do incansável Nilto Maciel – que por sinal está de site novo.
oi edson, que boa notícia tê-lo como colega colunista de o correio da paraíba. e ainda mais escrevendo sobre cibercultura, que tem merecido minha atenção cuidadosa nos últimos 2 anos e meio. bem-vindo ao cda. com muita alegria lerei sua coluna e a divulgarei com meu grupo de pesquisa sobre poesia em novos suportes, da universidade federal da paraíba. abraço forte. amador
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