18 janeiro 2011

As coisas belas são difíceis


















A frase do título acima foi mencionada por Platão e revela uma sabedoria que pode ser aplicada à vida, às artes em geral e, mais especificamente, às tragédias gregas.

A tragédia é um gênero literário que, apesar de passados 25 séculos, ainda mantém o fascínio e a sua importância. Continuamos, de tempos em tempos, a tomar emprestado dos gregos seus temas e seus personagens trágicos para aprender mais sobre nós mesmos e, quiçá, experimentarmos alguma catarse.

O trágico é uma dimensão fundamental da condição humana e da história. Para nos reconhecermos como demasiadamente humanos que somos e daí podermos extrair algo que nos transcenda, ou nos redima, temos que re-conhecer o trágico.

Importante notar que o trágico não é a infelicidade ou o dramalhão, nem a catástrofe propriamente dita e televisada de nossa era. O trágico é uma contradição, um paradoxo, uma dialética, mais existencial do que lógica e sem qualquer superação. É a vivência plena do destino ou missão de cada um. Para o grego antigo, a existência é trágica por excelência.

Ler e conhecer as tragédias gregas são fundamentais para nutrir nosso espírito, para fortalecer nossa humanidade em toda a sua fragilidade.

A tragédia Édipo Rei (ou Édipo Tirano, ou o Rei dos Pés Inchados – dependendo da tradução), de Sófocles, talvez seja a representação mais acabada da condição trágica do ser humano. A ideia que permeia a história de Édipo e sua esposa/mãe Jocasta é a de que “nenhuma criatura humana pode fugir a seu destino”. Por mais que Édipo tenha tentado driblar o que o oráculo no templo de Delfos lhe vaticinara não o conseguiu. Mesmo sem saber (inocente, entre aspas), matou o seu pai Laio e acabou casando com sua mãe (que também não sabia ser ele o filho mandado para a morte, justamente para que não pudesse cumprir o oráculo terrível de que mataria o próprio pai).

Édipo é confrontado por Tirésias (talvez o personagem mais interessante da peça), o cego adivinho que tem a coragem de enfrentar o poder instituído, o Rei, e revelar-lhe sua verdadeira condição. Tirésias nada teme, pois está do lado da verdade. Mas não deixa de manifestar um lamento pungente: “Ai de mim! Como é terrível saber, quando o saber de nada serve a quem o possui!”

Outra revelação enunciada pelo coro (cujas falas representam o senso comum da cidade e da cultura daquela época) é a de que não existe felicidade para os mortais, no sentido que chamamos no budismo de “felicidade absoluta”. O coro entoa: “Pobres gerações humanas, como vossa existência nada vale a meus olhos! Qual o homem que obtém mais felicidade do que parecer feliz, para depois, dada essa aparência, desaparecer do horizonte? Tendo teu destino como exemplo, ó desditado Édipo, não posso mais julgar feliz quem quer que seja entre os homens”.

No fundo, a moral de qualquer tragédia é explicitada pela fala final do Corifeu. Ele lembra que Édipo havia sido invejado por todos na cidade. Quem não havia desejado estar no lugar dele? Édipo, o decifrador de enigmas famosos, que se tornou o primeiro dos humanos e se casou com a mais bela das rainhas. Sua fortuna não durou muito. Hoje, a miséria se apossou dele. “Guardemo-nos, então, de chamar um homem feliz, antes que ele tenha transposto o termo de sua vida sem ter conhecido a tristeza.”

Sábios, esses gregos.

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