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23 janeiro 2009

Frederico Barbosa à queima-roupa




1) O que é poesia para você?

Durante muitos anos recusei-me a responder a essa pergunta. Considerava precipitado ou enganador quem a tentava responder. E muitas tentativas de definição da poesia são mesmo superficialidades subjetivas demais para meu gosto: palavras vagas que formam quase sempre a mesma ladainha difusa e mistificadora.
Mas, paradoxalmente, se me recusava a definir a poesia, adorava e adotava a definição de Roman Jakobson, de que a função poética da linguagem é a projeção do “princípio de equivalência do eixo de seleção sobre o eixo de combinação”, ou seja, na criação literária a composição se sobrepõe, como princípio construtivo, à mera escolha das palavras guiada apenas pela semântica. Jakobson acrescenta ainda que a função poética é caracterizada por três aspectos básicos: imagens, sonoridade e ritmo. A partir destes conceitos do mestre linguista, eu inventei uma oficina de poesia que ministrei em vários cantos do país. Foi na troca instigante com os participantes destas oficinas que cheguei, sem abandonar os conceitos fundamentais de Jakobson, à minha definição de poesia que, embora pareça simples, norteia hoje meu pensamento sobre poesia.

• Poesia é a palavra/impacto, é uma composição construtora de efeitos. É a linguagem organizada da forma mais meticulosa possível para fazer sentir.

Decorrente desta definição, podemos deduzir que:

• Fazer um poema é escrever usando todos os recursos imagináveis para causar o maior impacto possível no leitor.
• Compor um poema é controlar nos mínimos detalhes os efeitos que o texto vai provocar no leitor.
• A poesia dissolve as fronteiras entre som e sentido, forma e conteúdo.
• O verdadeiro poeta, de Homero a Augusto de Campos, sempre será o mais consciente artífice da linguagem.
• No poema sempre se usarão os recursos mais econômicos e sutis para atingir os resultados mais impactantes.
• Na poesia menos é sempre mais.
• O maior efeito que um poeta pode produzir não é dizer ao leitor o que ele (poeta) sente, mas é fazer o leitor sentir o mesmo ao ler o poema.


No meu entender é isso o que define a poesia. O resto, pode ser filosofia, religião, psicologia, sociologia, mistificação... qualquer coisa, menos poesia.



2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

Precisa se despir de todas as ideias preconcebidas, românticas e preconceituosas que rondam o fazer poético. Como os conceitos de dom, talento e inspiração. Como a ideia de que o poeta é mais sensível ou que escrever poesia é sentir ou vivenciar emoções... Deve desconfiar de todos as mistificações da poesia e do papel do poeta.
Deve saber que escrever poesia é um trabalho meticuloso e preciso e que, muitas vezes, não recebe o reconhecimento que merece, até porque está envolto em tanta mistificação... Se os próprios poetas consideram seu trabalho uma “inspiração divina”, um “dom artístico”... quem irá respeitar o trabalho do poeta?
O iniciante deve tentar lutar contra a sedução da facilidade e busacra sempre os caminhos mais difíceis.
O iniciante deve correr da troca de elogios fáceis do compadrio, típico da vida literária brasileira.
O iniciante não deve querer ser poeta, deve querer fazer bons poemas.


3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?

Poetas:
Seguindo a minha definição acima, minha escolha recai sobre três poetas que escrevem usando todos os recursos imagináveis para causar o maior impacto possível e que controlam nos mínimos detalhes os efeitos que o texto vai provocar no leitor. São, portanto, três dos mais conscientes artífices da nossa língua:

• Fernando Pessoa
• João Cabral de Melo Neto
• Augusto de Campos


Textos:
Três textos teóricos fundamentais para a elaboração da teoria da poesia como palavra/impacto são:

• "A Filosofia da Composição" de Edgar Allan Poe, que expõe em detalhes o processo de criação racional e meticuloso do poema O Corvo. Até hoje choca os defensores da inspiração mistificadora.

• "O ABC da Literatura" de Ezra Pound, que apresenta o conceito de grande literatura como “linguagem carregada de sentido ao máximo grau possível”.

• “Linguística e Comunicação” de Roman Jakobson, que apresenta a teoria da função poética da linguagem, que precisa ser levada em conta em toda e qualquer discussão sobre a definição de poesia.




Frederico Barbosa. Poeta e professor de literatura, é diretor executivo da Poiesis – Organização Social de Cultura, que administra a Casa das Rosas, o Museu da Língua Portuguesa, a Casa Guilherme de Almeida e os projetos São Paulo, um Estado e Leitores e PraLer – Prazeres da Leitura, em São Paulo. Formado em Letras pela USP, publicou os livros de poesia Rarefato (Iluminuras, 1990), Nada Feito Nada (Perspectiva, 1993), que ganhou o Prêmio Jabuti, Contracorrente (Iluminuras, 2000), Louco no Oco sem Beiras (Ateliê, 2001), Cantar de Amor entre os Escombros (Landy, 2002), Brasibraseiro (Landy, 2004), em parceria com Antonio Risério, pelo qual recebeu seu segundo Prêmio Jabuti, e A Consciência do Zero (Lamparina, 2004). Pela Landy Editora, publicou a coletânea Cinco Séculos de Poesia (2000), a seleção de sermões de Antônio Vieira, O Sermão do Bom Ladrão e outros sermões (2000), a edição comentada dos episódios camonianos Inês de Castro e O Velho do Restelo (2001) e a antologia Na Virada do Século, Poesia de Invenção no Brasil (2002). Organizou também diversas coleções de livros destinadas a popularizar a leitura dos clássicos da literatura luso-brasileira, vendidas nas bancas de jornal, vinculadas aos jornais O Estado de São Paulo (SP), O Globo (RJ) e Zero Hora (RS). A maior parte de sua produção poética está no site http://fredbar.sites.uol.com.br