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22 março 2011

BANZO




















carrego em meu lombo
várias máculas onomásticas

sou Zé, filho de Edward
um desterro sem quilombo
e sobre o nome
a Cruz

sou nenhum
mulato negro índio
      ninguém tingido d’água
salgada vindo

mesmo depois de liberto
sapatos a luzir
— inédita condição —
um ilhéu
que o destino não quis
soteropolitano

um grapiúna no sul-
maravilha quase
impecável
sem marcas
       cicatrizes
não ungido
sem excesso
       de melanina

algo assim próximo à matéria
alva que se tinge o mundo
visão última
dos que erram o alvo
e encontram
a morte


[foto: Pierre Verger]

11 fevereiro 2011


o mendigo


o mendigo morreu.
calado.
calejado da luta pela vida.
herói anônimo de tantos
milagres econômicos.

não teve homenagens póstumas.
nem epitáfios espirituosos.

foi enterrado
sem pompas em cova rasa
o indigente.

apenas
um sabiá trinava
ao ouvido do morto
um canto melancólico
e pungente.








09 fevereiro 2011

   saliva


não vou falar

sobre aquilo tudo
que não sei
       faço de conta

não vou nomear
o que não carece
fazer aquela pergunta
desnecessária
constelação de saliva
em boca úmida

vou ficar aqui
eu e meu teclado
amarelado
o monitor Flatron
a piscar
uma folha Word
a esperar

palavras
palavras
palavras

mundos não
mudos habitados
por ninguém.

27 janeiro 2011

bile negra


há manhãs quando
nem o cheiro
do café
o jornal aberto
sobre a mesa
o sorriso franco
da amada
o chamado doce
de meu filho
o latido amigo
do cachorro
o frescor florido
da jabuticabeira
o canto verde
das maritacas
o azul-celeste
de janeiro
suprem o oco
do corpo a corpo
com a vida
o sumo
desperdiçado
a dádiva
                                                  imerecida

    

25 novembro 2010

vestais

um coro de virgens
em uníssono:
aqueles que se alçaram
à completa inocência
- só eles -
podem tomar o fogo
sagrado de meu sexo
- que venham Bispos
do Rosário
em cardumes.
silêncio.

10 março 2010

caravana solitária


duas flores desiguais: o amor e o desamor. entre a pétala e a sépala floresce um cosmos. do nascimento à morte o mistério jaz. de um limite ao outro o extremo se perfaz. há gente que mata como quem vive. há outros que imitam um serial killer.

de tudo sobra quase nada. gota de orvalho na manhã do Saara.

os cães já não me seguem. os lugares todos me desertam. vivo pisando no chão dos nefelibatas. toda a vida é um acontecimento sinistro. o segredo da noite recolhe meus cacos. uma flor oferece seu pistilo. eu sigo acariciando meu destino.