[quadro de André Albuquerque]
O quadro acima é incrível. Você poderia dizer (o autor também diz) que é o Baudelaire, mas eu continuo visualizando o Cláudio Willer. É o Charles Willer, ou talvez o Cláudio Baudelaire.
O André Albuquerque pinta com essa pegada que nos lembra o irlandês Francis Bacon . Uma pintura nada naturalista, extremamente essencial, arrasadora das aparências.
Como na arte nós dizemos muitos mais do que nos propusemos antes de realizá-la (isso se, realmente, formos artistas), vejo nos quadros de André uma consciência aguda de que o ser humano, no final das contas, sempre recuará diante da visão de sua crueldade. A pós-modernidade talvez seja o momento da camuflagem e do fascínio das mudanças superficiais. Talvez.
Vejam esse poema de Cláudio Willer, que o próprio diz ter-se lembrado, posteriormente ao lê-lo, da noção do moderno e da modernidade em Baudelaire.
Poemas para ler em voz alta
6
Seus olhos têm muitas cores
que refletem o brilho de cada hora
estranhas palavras
atravessam nossas conversas
É PRECISO QUE SEJAMOS MODERNOS COMO O AMOR
mas não sei
se não recuaremos
confundidos diante da visão da nossa crueldade.
E para terminar, uma tradução de Guilherme de Almeida de meu poema preferido de Baudelaire. Claro, está em sua “Flores do Mal”. Uma visão romântica do poeta, mas que nos faz lembrar da busca incessante da tempestade, mesmo nas coisas mais prosaicas, no exercício existencial da poesia.
O ALBATROZ
Às vezes, por prazer, os homens de equipagem
Pegam um albatroz, enorme ave marinha,
Que segue, companheiro indolente de viagem,
O navio que sobre os abismos caminha.
Mal o põem no convés por sobre as pranchas rasas,
Esse senhor do azul, sem jeito e envergonhado,
Deixa doridamente as grandes e alvas asas
Como remos cair e arrastar-se a seu lado.
Que sem graça é o viajor alado sem seu nimbo!
Ave tão bela, como está cômica e feia!
Um o irrita chegando ao seu bico um cachimbo,
Outro põe-se a imitar o enfermo que coxeia!
O Poeta é semelhante ao príncipe da altura
Que busca a tempestade e ri da flecha no ar;
Exilado no chão, em meio à corja impura,
As asas de gigante impedem-no de andar.