04 novembro 2007

Charles Willer


[quadro de André Albuquerque]


O quadro acima é incrível. Você poderia dizer (o autor também diz) que é o Baudelaire, mas eu continuo visualizando o Cláudio Willer. É o Charles Willer, ou talvez o Cláudio Baudelaire.

O André Albuquerque pinta com essa pegada que nos lembra o irlandês Francis Bacon . Uma pintura nada naturalista, extremamente essencial, arrasadora das aparências.

Como na arte nós dizemos muitos mais do que nos propusemos antes de realizá-la (isso se, realmente, formos artistas), vejo nos quadros de André uma consciência aguda de que o ser humano, no final das contas, sempre recuará diante da visão de sua crueldade. A pós-modernidade talvez seja o momento da camuflagem e do fascínio das mudanças superficiais. Talvez.

Vejam esse poema de Cláudio Willer, que o próprio diz ter-se lembrado, posteriormente ao lê-lo, da noção do moderno e da modernidade em Baudelaire.


Poemas para ler em voz alta

6

Seus olhos têm muitas cores
que refletem o brilho de cada hora
estranhas palavras
atravessam nossas conversas
É PRECISO QUE SEJAMOS MODERNOS COMO O AMOR
mas não sei
se não recuaremos
confundidos diante da visão da nossa crueldade.


E para terminar, uma tradução de Guilherme de Almeida de meu poema preferido de Baudelaire. Claro, está em sua “Flores do Mal”. Uma visão romântica do poeta, mas que nos faz lembrar da busca incessante da tempestade, mesmo nas coisas mais prosaicas, no exercício existencial da poesia.


O ALBATROZ

Às vezes, por prazer, os homens de equipagem
Pegam um albatroz, enorme ave marinha,
Que segue, companheiro indolente de viagem,
O navio que sobre os abismos caminha.

Mal o põem no convés por sobre as pranchas rasas,
Esse senhor do azul, sem jeito e envergonhado,
Deixa doridamente as grandes e alvas asas
Como remos cair e arrastar-se a seu lado.

Que sem graça é o viajor alado sem seu nimbo!
Ave tão bela, como está cômica e feia!
Um o irrita chegando ao seu bico um cachimbo,
Outro põe-se a imitar o enfermo que coxeia!

O Poeta é semelhante ao príncipe da altura
Que busca a tempestade e ri da flecha no ar;
Exilado no chão, em meio à corja impura,
As asas de gigante impedem-no de andar.

03 novembro 2007

Escher brasileiro


[desenho de Levi Ciobotariu]

Conheço o Levi há muito tempo. Já moramos, viajamos, e fizemos muitas coisas juntos. Levi é do bairro Bom Retiro e eu era da Ponte Pequena. Dividindo um bairro do outro está a fatídica avenida Tiradentes.

Levi é um grande artista. Meticuloso, quase obsessivo. Cursou Arquitetura, mas é com o desenho que se realiza. Nós sempre fomos parceiros de alguma forma e vamos tentar reabilitar essa parceria, agora já maduros e cada qual com seu trabalho e direção.

Levi tem vários livros infantis, com ilustrações e textos próprios. Já ganhou um prêmio Pirelli de pintura jovem e um prêmio Jabuti de melhor programação visual de coleção.

Imaginem um carinha que, logo ao terminar a faculdade, totalmente desconhecido, chega ao Masp, com seus desenhos debaixo do braço, e pede pra falar com o todo poderoso Pietro Maria Bardi. Não conseguiu, claro! A secretária ficou com seus trabalhos e uma semana depois o secretário do Bardi liga para ele. Bardi vira seus desenhos, gostara e ainda convida-o para uma exposição no Masp. Uau!

Foi assim que começou a carreira do Levi. Levi é aquele amigo que cito em texto sobre o nascimento de minha filha Sophia . Um nascimento livrou sua mãe da morte em um campo de concentração nazista. Um nascimento permitiu que posteriormente Levi viesse a nascer.

Levi mandou o desenho acima para nosso Sambaquis. Se não me engano o nome original é “Resquícios da Maré”. Ele tem muitos desenhos feitos em Bico de Pena, de sua primeira fase, em preto-e-branco. São meus preferidos. Principalmente o “Transecular talking with Giordano Bruno about the creation and destruction of the worlds”: uma obra-prima. Há até um quadro seu em que eu apareço tocando violão. Uma grande honra para mim.

Desde 1989, Levi colabora com pesquisadores botânicos de várias universidades e, por conta desta produção, é conhecido como um artista naturalista (confira alguma coisa em seu site). Quem diz isso desconhece sua fase “viajandona”, que reúne sua técnica e precisão naturalista com devaneios e toques surreais – são seus trabalhos mais interessantes.

Levi Ciobotariu vai fazer sua primeira exposição internacional em 2008. Ele mesmo contará os detalhes posteriormente, pois o convidei para escrever uma coluna sobre artes plásticas no Cronópios. Irá apresentar trabalhos e artistas de que gosta e falar de artes plásticas em geral.

Evoé!



30 outubro 2007

O Portal do Dragão


[ilustração: Tania Ricci]


quando o torpor do sono vem
e o ser apaziguado fica

algo enfim desperta e bem
com o sonido d’água precipita

tal sonho dentro de um sonho
a imagem de um peixe nos habita

salta pra fora num dançar bisonho
buscando alçar-se ao topo da queda entrevista

(nunca é fácil a uma carpa
transformar-se em um varão)

assim como os ciprinos buscam
o portal do dragão

assim como os poetas anseiam
enxergar na escuridão

assim como o plebeu almeja
algum dia ser barão

todos o seres ensejam
atingir a iluminação

parece fácil feito tocar harpa
tatuar o sim na água do não

um canto grave como bordão
vem repetir o mesmo refrão

não desanimem, insistam
superem o limite do ego falastrão

pois ninguém escapa da morte
nem mesmo o grande dragão

25 outubro 2007

El encuentro perfecto


Fernando Butazzoni e Edson Cruz
[foto tirada pela esposa de Fernando]

No Encuentro de Escrituras de Maldonado, Uruguai, tive o prazer de conhecer um escritor que me fez correr à livraria e gastar quase todos os meus pesos para adquirir o livro que ele acabara de lançar e de ler um trecho para nosotros. Seu nome é Fernando Butazzoni.

Seu romance, El profeta imperfecto, foi editado pela Planeta no Uruguai e já é um dos dez finalistas do Prêmio Planeta/Casamérica de 2007. Segundo ele me confirmou, posteriormente, seu livro está em tradução e será lançado no Brasil em 2008.

Butazzoni, além de escritor, é jornalista nascido em Montevidéu. Estudou Ciências Biológicas em Cuba. Uau! Trabalhou por lá como professor e escreveu programas para rádios de Cuba. Logo em seu primeiro livro Los dias de nuestra sangre, de 1979, abocanhou o prestigioso Prêmio Casa de las Américas, na categoria contos.

Fez parte da resistência nicaragüense em 1978 e esteve na frente de batalha pela Frente Sandinista de Liberación Nacional. Ainda bem que sobreviveu. Aliás, conheci durante o Encontro vários escritores marcados, de alguma forma, por suas opções e ações políticas. Um deles foi o uruguaio Carlos Caillabet, que esteve 13 anos preso por pertencer ao movimento tupamaro e só foi libertado com a anistia.

Mas, voltando a Butazzoni, ele criou, juntamente com o escritor argentino Mempo Giardinelli, o Comitê Internacional de Intelectuais Contra a Guerra, resistindo às políticas bélicas dos EUA. Desse Comitê participaram vários escritores importantes como Mario Benedetti, Eduardo Galeano, Luis Sepúlveda, Antonio Cisneros, entre outros.

No mesmo dia em que ouvi sua leitura participei de uma mesa com sua presença. Um belo encontro. Ele me perguntou algo sobre a sonoridade e musicalidade de meus poemas, que eu acabara de ler, e cuja emoção quase me deixou sem fala. Eu estava meio dopado depois da leitura e nem lembro o que respondi. Acho que falei de música popular, como a música me influenciou e da velha questão sobre letras de música e poesia no Brasil. Ele foi bem bacana e receptivo à minha poesia. É um grande escritor. Vejam vocês mesmos...

“[...] Resulta que este hombre es experto en practicar un juego secreto que consiste en no pronunciar ni una palabra durante todo el fin de semana. Es mi tiempo libre y hago lo que quiero, piensa. O sea, silencio. Cuando cultiva el arte de callarse la boca ni siquiera se permite una exclamación mientras de despereza, o un susurro al afeitarse frente al espejo. Nada. Ningún sonido. Se dedica a la lectura o a sus pasatiempos: las palabras cruzadas y la televisión. Es un orfebre de los crucigramas, y hasta se há comprado de liquidación un viejo diccionario enclopédico Sopena del año 1952, nada más que para corroborar de manera fehaciente algunos de los múltiples gazapos com que suelen estropearse muchas definiciones, realizadas la mayoría de las veces con torpeza por iletrados aprendices.
Esa es, para él, una posible forma de estar: televisión, palabras cruzadas y silencio. Vodka y silencio. Como si el tiempo se quedara allí y lo pusiera a salvo de los desastres del pasado, a los que há sobrevivido de manera inexplicable. Silencio y tiempo. Una posible forma, también, de no estar. Así se las arregla, en el tédio de esos larguísimos fines de semana, para hacer las compras – em general los sábados sobre el mediodía – sin saludar ni consultar precios ni despedirse de la cajera del supermercado. Es un maestro del mutismo. Claro que no há podido sacar, de esos parêntesis, casi ninguna conclusión, excepto tal vez la certeza de su inutilidad, lo que viene a reforzar su tesis acerca de la estupidez humana. [...]”

[Trecho do romance El profeta imperfecto, Planeta, 2007]

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23 outubro 2007

Meu poeta preferido


Manoel de Barros


Uma Dialéctica da Invenção


I

Para apalpar as intimidades do mundo é preciso saber:

a) Que o esplendor da manhã não se abre com faca
b) O modo como as violetas preparam o dia para morrer
c) Por que é que as borboletas de tarjas vermelhas
tem devoção por túmulos
d) Se o homem que toca de tarde sua exist6encia num
fagote tem salvação
e) Que um rio que flui entre dois jacintos carrega
mais ternura que um rio que flui entre dois
lagartos
f) Como pegar na voz de um peixe
g) Qual o lado da noite que humedece primeiro.
etc
etc
etc
Desaprender oito horas por dia ensina os princípios.


II
Desinventar objectos. O pente, por exemplo. Dar ao
pente funções de não pentear. Até que ele fique à
disposição de ser uma begónia. Ou uma gravanha.


III
Repetir repetir - até ficar diferente.
Repetir é um dom do estilo.


IV
No Tratado das Grandezas do Ínfimo estava escrito:
Poesia é quando a tarde está competente para dálias.
É quando
Ao lado de um pardal o dia dorme antes.
Quando o homem faz sua primeira lagartixa.
É quando um trevo assume a noite.
E um sapo engole as auroras.


VII
No descomeço era o verbo
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá onde a
criança diz: Eu escuto a cor dos passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não funciona
para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um verbo, ele
delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta, que á a voz de fazer
nascimentos-
O verbo tem que pegar delírio.


XIX
O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa era a
imagem de um vidro mole que fazia uma volta atrás
de casa.
Passou um homem depois e disse: Essa volta que o
rio faz por trás de sua casa se chama enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro que
fazia uma volta atrás de casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.


XXI
Ocupo muito de mim com o meu desconhecer.
Sou um sujeito letrado em dicionários.
Não tenho que 100 palavras.
Pelo menos uma vez por dia me vou no Morais ou
no Viterbo -
A fim de consertar a minha ignorância,
mas só acrescenta.
Despesas para minha erudição tiro nos almanaques:
Ser ou não ser, eis a questão.
Ou na porta dos cemitérios:
Lembra que és pó e que ao pó tu voltarás.
ou no verso das folhinhas:
Conhece-te a ti mesmo.
ou na boca do povinho:
Coisa que não acaba no mundo é gente besta
e pau seco.
Etc
Etc
Etc
Maior que o infinito é a encomenda.


XIV
Poesia é voar fora da asa.



In “O Livro das Ignorâncas” - 6ª ed. - Rio de Janeiro, Editora Record, 1998
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20 outubro 2007

Chegando em Maldonado



O mote do 2º Encuentro de Escrituras de Maldonado foi "Cruzando los Puentes". Não poderia ser mais adequado. Autores e editores da Argentina, Uruguai e Brasil trocaram experiências, leram seus textos, apresentaram seus livros e revistas.
Maldonado é um município colado a Punta del Este, um balneário conhecido pelos turistas de todo o mundo. Dizem que Punta del Este foi um "paradero" indígena (como eles acentuam) e depois um povo de pescadores. Hoje já não é assim. É um lindo balneário de luxo, com cassinos, praias bravas e praias mansas, um porto mui rico de cara para o Rio de la Plata.
Quando cheguei ao aeroporto, que fica mais para Montevideo do que para Maldonado, me surpreendi pois tive que sair por dentro de um free shop com o ar saturado de perfume que me deixou tonto e querendo sair correndo dali. Não foi uma boa primeira impressão. Você é forçado a passar por aquilo. Não tem como fugir.
Mas essa impressão passou rapidamente, pois fui muito bem recebido e instalado. O tempo estava nublado naqueles dias e, dizem, quando chove por lá a temperatura despenca. Comprovei na pele, pois quase não havia levado roupas para o frio.
O caminho do aeroporto até o hotel foi maravilhoso. Campos nublados que me lembravam paisagens de um filme de Tarkovski. Um país agrário, basicamente. Mas não só, claro. Quando chegamos à orla não pude desviar os olhos dos imensos casarões com arquiteturas diferenciadas: mediterrâneas, européias, um quê de década de quarenta.
Bem... foi a primeira vez que saí de meu país. E graças a literatura e ao Cronópios. E foi a primeira vez, também, que vi uma baleia. E isso não é pouco... pelo menos não para mim.




19 outubro 2007

Recuerdos de Maldonado


da direita para esquerda: Aldyr Garcia Schlee, Laís Chaffe, Ana Maria Gonçalves e Edson Cruz (o time brasileiro)

Comecemos por esta. As fotos tiradas no Uruguai, no 2º Encuentro de Escrituras de Maldonado, já estão em minhas mãos.
Vou recompor a memória e começar a mostrar o encontro.
Foram dias maravilhosos. Muito vinho e carne no La Balanza.
Claro, muita literatura, também... veremos...
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18 outubro 2007

Caída

anuros
de etimología oscura

zambullidas
en estanques inmundos

sapos croando allí
todo se rebela contra mí

injurias
en el alma


[Tradução de Luis Benítez]

16 outubro 2007

Devir

nem branco, nem negro
nem verde ou amarelo
meu ser derradeiro
ainda está no prelo

14 outubro 2007

regalo

o seio da face
é a maça do rosto

o que é do gosto
regala a vida

mais vale a lida
que o fácil gozo

em todo ovo
labuta o novo

12 outubro 2007

Hechizo

algo así tan
innatural
que llega a ser
otra naturaleza

algo así sin nada
más ficticio
por demás tal
cosa hecha

que de tanto artificio
se convierte en arte
se convierte en libro
se convierte en oficio

11 outubro 2007

Arquitetura de algodão

Um acontecimento
se desloca
o pensamento
é o trabalho de uma jornada
corredores longos
que terminam
nos paradigmas dos cantos
o azul finge o céu
o quadro faz fluir
o imaginável.

***

O inverno se acomoda
na palma da mão
a escrita descansa
no muro
à espera
de um código.
Invisível estilo
que esconde
a insatisfação
na distância
entre o frio
e o calor dos cabelos.

***

A retórica varre
a retina
obstáculos
doses de filosofia
uma sutil
experiência da loucura
a sombra roubada
não esconde
as galerias
invade
suas vitrines.



[Poemas do livro Arquitetura de Algodão de Almandrade]

Almandrade é artista plástico, poeta e arquiteto de Salvador. Email: almandrade@ibestvip.com.br

10 outubro 2007

Flor-de-lótus



se no hoje contemplamos o ontem
o que dizer do amanhã que nos almeja?

se no tanque afogamos a rã
o que fazer da morte que nos beija?

se no vôo a libélula se espanta
o que escrever com o sangue que goteja?

09 outubro 2007

Templo

lá em casa
o menino Jesus

com os meninos
tinha caso

com as meninas
engatinhava

o menino Jesus
lá em casa

08 outubro 2007

05 outubro 2007

Corazón

para Aldyr Garcia Schlee


aquí
en este lugar donde
el aire enrarecido arde
rehago mi inventario
de sombras

aquí
en este lugar como
la hecatombe en mi pecho actúa
dibujo garabatos
en matices

aquí
en este lugar cuando
el patio de mi casa yace
se encuentra la matriz
del universo

aquí
en el corazón de este lugar
con ojos húmedos a encararme
aquel chico que un día
fui


[Traduzido por Adriana de Almeida]


29 setembro 2007

Tartaruga de um só olho



para se traçar um simples gesto
não basta armar-se de vontade
a luz mente e na direita pode estar o sestro

é preciso saber esquecer a própria idade
pois nas profundezas de um mar escuro
até o sândalo não conduz à claridade

pode-se viver por muito tempo obscuro
a tatear diante de si o tal anseio
feito criança na noite inseguro

a almejar o tão amado enleio
sem nenhum ontem em círculo vazio
e um amanhã que traga algum esteio

pode-se esperar milanos o tronco arredio
e súbito vê-lo passar com enganosa visão
ou tentar alcançá-lo feito gato no cio

como um quelônio sôfrego a exaustão
e deparar-se com mais um logro desvario
o sândalo na onda indo noutra direção


[Poema inspirado em uma parábola budista de mesmo nome]

28 setembro 2007

Tatiana Oroño (Uruguay)

Areté

Se ponen del lado de Aquiles porque un rey prepotente merece ganarse adversarios. La arenga de Aquiles suena bien todavía: “aunque mi parte del botín nunca iguala a la tuya yo vuelvo a las tiendas teniéndola pequeña pero grata después de haberme cansado en el combate”. Le da un aire común al reclamo del semidiós que es inferior a un rey a la hora de los beneficios. Aquiles reclama su derecho al reconocimiento; el reconocimiento público del valor de cada uno es la areté. Él la defiende con el aplomo con que hoy se reclamaría, cheque en mano, un pago bancario negado. La areté es algo que se “aísla” –se comprueba que existe- en una clase de literatura, así como en la de química se aísla un elemento en el tubo de ensayo. Algo que no se olvida.
No existe otra palabra que ayude a ver qué es eso, a qué se debe eso que le venía pasando a una y que no se sabía qué era: ser defraudada por la indiferencia de los demás. Y que la indiferencia era, directamente, injusticia. Y que tres mil años atrás, era ilegal.



Los hombres

juegan en equipo. Esa práctica

de dividir al medio y tener de rival
a una mitad y a la otra de aliada

es jugada

maestra. Ordena
el mundo.
Vende

locus
amenus.
De talud
a tribuna numerada.



Hijos de las metáforas

las ideas

no se matan un fantasma

recorre Europa toda Dinamarca
es una cárcel
hay algo entre la tierra y el cielo que no había soñado
tu filosofía

no nos bañamos dos veces en el mismo río

todo lo sólido se disuelve en el aire
en el tren del

progreso
(una laguna lúgubre
de monedas de plata) el tiempo es
oro dadme

un ordenador
y os daré la globalización

navigare necesse

dadme mi caballo

Descendientes de
imágenes:
el que no tiene
nada

lo tiene todo sólo sé
que no sé nada no tenéis

para perder más que
las cadenas

la poesía
no se vende
porque no
se vende

la poesía tiene como fin la verdad práctica
la poesía es del que la necesita
la poesía debe ser hecha por todos

el paisaje es un estado de alma el pueblo / unido / jamás será vencido
quedará en la leyenda / esta guerra este volcán / los días de balachaiev / los soldados del soviet
/ los días de balachaiev / los soldados
del soviet /

Cuando despertó el elefante todavía estaba allí.



[Do livro morada móvil]




Tatiana Oroño é de São José, Uruguai. Poeta e profesora de Língua e Literatura Espanholas, com mestrado em Literatura Latinoamericana. Já publicou El alfabeto verde, 1979; Poemas, 1982; Tajos, 1990; Bajamar, 1996; Tout fut ce qui ne fut pas, ed. Bilingüe, 2004.