11 junho 2009
Canção do Venerável - 2
Preciso completar algumas coisas:
1. Devo ter empastelado uma resposta, ficou um "não" sobrando quando digo que o esforço argumentativo de Krishna era para convencer Arjuna a não lutar etc etc... É bem o contrário disso: convencê-lo a lutar...
2. O que eu estava fazendo com o Górgias... É o seguinte: há 22 anos constituímos professores de grego e latim da UNESP de Araraquara (pela vertente grega e latina do repertório) e eu (pelo lado indiano) um Grupo de Leituras Dramatizadas de nome Giz-en-Scène (ver http://epwidos.sites.uol.com.br/giz/index.htm, que está carecendo de atualização urgente). Os membros fundadores ainda estão na ativa, e passaram pelo grupo ao longo desse tempo muitos alunos de línguas clássicas e não-clássicas daquela faculdade. No dia que lhe escrevi aquelas notas estávamos ensaiando "O misantropo", de Menandro, para estréia. Quem for ao nosso site vai ver que não fazemos apenas "leituras": temos figurinos, adereços, marcação, iluminação, sonoplastia, cenário etc... e o texto na mão. Depois de ensaios que correspondem a duas ou três sessões de contato com o texto e suas possibilidades, vamos para o palco com horário marcado e platéia e que Dioniso nos ajude e acuda!
3. a questão sobre os Hare Krishna e o Gita precisa de algum espaço, eu teria que dizer alguma coisa sobre o que é "vedismo", por exemplo... e bramanismo...´
abraço
Carlos Alberto
Email: carendip@uol.com.br
10 junho 2009
Canção do Venerável
Carlos Alberto da Fonseca foi professor de Sânscrito e Cultura Indiana na USP por muito tempo. Ele é doutorado em Linguística com o trabalho “Teias sobre o Sânscrito. Um estudo da consciência linguística na Índia antiga”. Em outras palavras, o cara é um mestre no assunto. Ou melhor, doutor. Fiz um pequeno curso sobre o Mahabharata com ele na Casa das Rosas e fiquei encantado.
O que me levou a procurá-lo não foi um interesse súbito pelas coisas da Índia nem a sedução pelos caminhos globais da Índia. A questão é que assumi uma encomenda da Editora Paulinas: adaptar para o público jovem o grande clássico indiano Mahabharata. Tinha uma pálida idéia da encrenca em que havia me metido. Bem pálida. Estou devidamente encrencado.
O texto é monumental. Como ele diz, em pequena entrevista abaixo, tem cerca de 200 mil versos. Duzentos mil e não 78 mil como encontramos em algumas fontes. E tudo em sânscrito, que eu teria que levar mais de uma existência para aprender... Mas deixemos isso pra lá e vamos direto ao assunto que interessa aqui.
Carlos Alberto lança sua tradução, direta do sânscrito, do famoso e pouco lido, citado por bruxos milionários e cantores de rock — Bhagavadgita, ou Canção do Venerável. Texto que faz parte do livro 3 do Mahabharata.
Além do rigor da tradução, com a adequação de vários termos que haviam perdido sua real significância por nossa ignorância na matéria ou pela folga semântica que adquiriram em suas passagens por várias línguas ocidentais, ela se propõe a reproduzir a linguagem poética do livro em linguagem poética, deixando as explicações e paráfrases para as notas. Não é pouco.
Aproveitei o momento do lançamento e lhe enviei algumas perguntinhas básicas. Confira suas respostas.
Olá Edson...
já de volta, depois de me enfronhar nos meandros do caráter de um trapalhão chamado Górgias numa peça do Menandro de que depois Molière se adonou e deu a conhecer ao mundo, o Misantropo... mas no cd que eu trouxe não estão nem a apresentação nem o texto da tradução do Gita... vou ficar devendo...
Mas vou responder às perguntas... menos à última, e me explico: eu recusei um convite da produção da novela (da produção, não da autora) para lhe dar assessoria, por isso me vejo impossibilitado de falar qualquer coisa a qualquer mídia sobre a novela... espero que compreenda...
E vamos lá:
1) Quais as principais dificuldades encontradas para um tradutor do sânscrito? Sua tradução mantém a estrutura em versos da obra?
Em minha tradução procurei manter o esquema da estrutura em dísticos do poema; nele há algumas estrofes com 4 versos, e assim formulei sua tradução. Mas é interessante observar o lugar do verso na literatura indiana de expressão sânscrita; com reserva da poesia dos períodos védico e clássico (anterior e posterior ao período de elaboração dos poemas épicos), o verso serve mais às técnicas de memorização dos textos para sua transmissão oral, e não propriamente como elemento estético.
a) colocação no mercado: uma tradução de texto da Índia, antiga ou não, por conta da enorme diferença de dados culturais, precisa ser uma tradução anotada, profusamente anotada - o que sempre acaba dando ao texto traduzido um aspecto acadêmico - não que isso seja um problema, mas comercialmente causa estranheza...
b) é difícil, e tem de ser um trabalho cuidadoso e referenciado, encontrar adequação ou correspondência termo a termo nos vocabulários em confronto do português e do sânscrito no caso de uma tradução; a palavra dharma é um bom exemplo, correspondendo a "religião, filosofia, justiça, direito" e um longo etc... a semântica é sempre o maior problema na tradução de um texto sânscrito;
2) Sabemos que o Bhagavadgita faz parte do grande épico indiano Mahabharata. Qual a divisão dos livros do Mahabharata? O Gita é seu principal livro? E por que ele é o mais conhecido, se é que podemos verdadeiramente afirmar isso?
O MBh tem 18 livros, num total de cerca de 200.000 versos; o Gita faz parte do livro 3; talvez se tenha tornado o texto mais conhecido porque, embora engastado no poema como um conjunto de conceitos destinados a persuadir o personagem Arjuna a não combater os exércitos diante dele perfilados, tenha assumido o caráter de um texto teórico sobre questões discutidas por todas as correntes filosóficas indianas; no Ocidente, talvez sua popularidade também se deva ao fato de ter sido o primeiro texto sânscrito a ser traduzido neste lado do mundo... ou uma junção das duas razões... também tem o caráter de texto didático, mas nele não são fábulas que misturam seres humanos e animais que pensam e falam que transmitem os ensinamentos - mas o deus Krishna, avatar de Vishnu, o aspecto conservador da trindade hindu...
3) Um ocidental pode compreender e aproveitar com profundidade uma obra tão diversa e com uma cosmogonia tão diferente da nossa? Não há o risco da proposta estética essencial da obra não ser apreciada, de seus reais conteúdos não se tornarem temas de reflexão?
Claro que todo e qualquer texto de intenção doutrinal ou não corre esse risco de não ser compreendido e aproveitado em profundidade... isso só aumenta a necessidade das notas, sem vieses (a Índia não tem anjo, nem alma, nem pecado...) - e daí a oportunidade que minha tradução oferece de discussão, de construção por parte do leitor de questões apontadas no texto...
4) O movimento Hare Krishna está fundamentado nesta obra, ou dito de outra forma, o Gita é o manuscrito doutrinal de alguma religião?
5) Não poderia deixar de perguntar: o que está achando da visão passada da Índia feita pela novela da Globo?
Trechos:
Não queremos matar os filhos de Dhrtarastra nossos próprios parentes.
Como seríamos felizes tendo morto nossa própria gente, Madhava?
Mesmo que aqueles de mente dominada pela cobiça não vejam erro
na destruição do corpo da família e no crime da traição aos amigos,
como não podemos aprender a manter longe de nós essa culpa,
nós que consideramos erro a destruição da família, ó Janardana?
Na destruição da família, perecem os imemoriais dharma das famílias;
com a perda do dharma toda a família se volta para o adharma.
[...]
Ah que grande culpa nos arranjaremos por fazer
matar nossa própria gente por ambição pelas delícias do reino!
Seria melhor para mim se os filhos de Dhrtarastra, armas na mão,
me matassem a mim na batalha, desarmado e sem resistência.
Assim falando na batalha, Arjuna está desabando no assento do carro
deixando caírem o arco e a flecha, a mente dominada pela dor.
08 junho 2009
SIMPOESIA-último dia
06 junho 2009
Flashs - Dizendo sim à poesia
[Gustavo Lopes e Paloma Vidal]
Gustavo Lopes, editor argentino, participou de debate ontem, no Instituto Cervantes, sobre a edição de poesia e o papel das pequenas editoras. A mesa foi mediada pela editora da revista Grumo, Paloma Vidal. Participaram da mesa, também, o editor Vanderley Mendonça (editor do selo Demônio Negro) e a poeta, tradutora, editora (mostrou várias plaquetes de sua produção) e curadora do evento, Virna Teixeira.
O destaque da noite foi o questionamento de Gustavo Lopes sobre as novas mídias para leitura e circulação de livros e como as novas gerações se adaptam rapidamente a elas. Frase dele que gerou controvérsia e aparte apaixonado do grande poeta Rodrigo de Haro: "Os livros são objetos da Idade Média". Rodrigo pediu a palavra várias vezes e falou sobre o encanto do livro, seu cheiro, a passagem do tempo estampada em suas amareladas páginas, a alimentação dos cupins etc., e sua categórica frase: "A relação com o livro é uma relação carnal, sexual. O livro nunca deixará de existir".
[Claudio Willer apresentando o poeta e leitura de Rodrigo de Haro]
O recital da noite ficou por conta do poeta espanhol Rodolfo Häsler, do cubano Efrain Rodrigues Santana — dedicou sua leitura ao poeta e tradutor Claudio Daniel; disse com firmeza que o poeta deveria estar no evento compartilhando com os colegas e reafirmou sua importância para a poesia hispano-americana —, do português Luís Serguilha e do mexicano Victor Sosa. Belas leituras e poesia de alto nível. A leitura em dueto de Victor Sosa e Serguilha foi maravilhosa.
Um comentário bem-humorado, atrás de mim, depois da apresentação de Rodrigo de Haro feita pelo poeta Claudio Wllier: "Ele nem precisa ler mais...".
05 junho 2009
04 junho 2009
Artimanhas Poéticas
O festival literário Artimanhas Poéticas será realizado nos dias 12 e 13 de junho, no Real Gabinete Português de Leitura no Rio de Janeiro, com curadoria do poeta Claudio Daniel. O evento, que contará com a participação de críticos literários, poetas jovens e consagrados e editores de revistas, incluirá palestras, debates, recitais, lançamentos, performances musicais e de poesia sonora.
Dia 12 de junho, sexta-feira:
14h
Palestra: A crítica literária reflete a criação poética contemporânea?
Com Luiz Costa Lima
16h
Debate: As revistas literárias definem o momento literário?
Claudio Daniel, André Vallias, Márcio-André, Sérgio Cohn
Lançamento: revistas Confraria, Errática e Zunái
18h
Recital: Virna Teixeira, Camila Vardarac, Leonardo Gandolfi, Lígia Dabul, Luiz Roberto Guedes, Luís Serguilha, Rodrigo de Souza Leão, Izabela Leal.
Local: Rua Luís de Camões, 30 - Centro - Rio de Janeiro - RJ
Dia 13 de junho, sábado:
14h
Debate: Como está a poesia brasileira hoje? Com Claudio Daniel e Paulo Henriques Britto
15h
Lançamentos de livros de poesia (títulos do selo Arqueria, da Lumme, Azougue e de outras editoras.)
16h
Recital: Claudio Daniel, Diana de Hollanda, Thiago Ponce de Moraes, Gabriela Marcondes, Ismar Tirelli, Pablo Araújo, Sebastião Edson Macedo, Victor Paes, Ronaldo Ferrito
17h
Show de Tavinho Paes e Arnaldo Brandão
03 junho 2009
SIMPOESIA
Experiência literária de quatro dias, que reunirá entre 4 a 7 de junho de 2009, poetas e críticos literários do Brasil e exterior, além de uma feira de editoras independentes de poesia do Brasil e Argentina promovida pela revista Grumo.
Um encontro que envolve a troca de idéias, a exposição da diversidade intelectual e o intercâmbio artístico e cultural entre diversas expressões da poesia contemporânea.
Farei a mediação da última mesa, no dia 7, e participarei de um recital logo após. Confira a programação.
Realização: Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo
Produção: Casa das Rosas e Organização Social POIESIS de Cultura
Patrocínio: Instituto Cervantes, Consulado do México e Centro Cultural da Espanha em São Paulo
Curadoria: Virna Teixeira
PROGRAMAÇÃO:
04 DE JUNHO
19:30h - Apresentação e abertura do evento
20h - Recital com Horácio Costa, Maria Esther Maciel, Micheliny Verunsck, Alfredo Fressia, Virna Teixeira
21h - Show: Canções do Estúdio Realidade, com Rodrigo Garcia Lopes
Local: Casa das Rosas
05 DE JUNHO
19:30h - Debate: Editoras Independentes de Poesia
Com: Gustavo López, Virna Teixeira e Vanderley Mendonça.
Mediação: Paloma Vidal
21h - Recital: Rodolfo Hasler, Rodrigo de Haro, Efrain Rodrigues Santana, Luís Serguilha, Victor Sosa.
Após o recital haverá o lançamento da revista Grumo.
Local: Instituto Cervantes
06 DE JUNHO
COLÓQUIO – POETAS DE LÍNGUA INGLESA
14:30h - Debate: Brazilian poetry in translation.
Com Steven Buttermann, Stefan Tobler, Flávia Rocha e Rodrigo Garcia Lopes.
16h - Palestra: Language poetry
Professor William Alegrezza
17h - Palestra-Editing Contemporary Poetry – Litmus Press Experience
Com E.Tracy Grinnell e Julian Brodanski
18h - Recital- Poetry reading
Com William Allegrezza, Tracy Grinnell, Julian Brodanski e Stefan Tobler.
Stefan Tobler lerá traduções para o inglês do poeta Antônio Moura. Os demais poetas serão traduzidos para o português por Virna Teixeira.
19h - Poesia: palavra impacto. Palestra com Frederico Barbosa
20h - Recital: Sérgio Medeiros, Carlos Augusto Lima, Marco Vasques, Silvia Iglesias, Tatiana Fraga, Marcelo Tápia.
21h - Show: grupo de jazz Patavinas
Local: Casa das Rosas
07 DE JUNHO
16h - Debate: Poesia, Sadomasoquismo e Diversidade Sexual.
Com: Steven Buttermann, Antônio Vicente Pietroforte e Glauco Mattoso.
Mediação: Contador Borges
17h30 - Debate-Poesia e Fronteiras Geográficas
Com Silvia Iglesias, Carlos Augusto Lima e Marco Vasques
Mediação: Edson Cruz
19h - Recital: Edson Cruz, Contador Borges, Andréa Catrópa, Luis Roberto Guedes, Donny Correia, Antônio Vicente Pietroforte, Greta Benitez.
Local: Casa das Rosas
Programação completa no site Http://www.simpoesia.wordpress.com.
Email para contato: simpoesia2009@yahoo.com.br
30 maio 2009
BlablaBlogue <=> Blooks
Tinha que ser o Nelson de Oliveira. O cara sai na frente mais uma vez mostrando um apanhado de textos literários que circulam febrilmente na net. Tudo isso, a partir de logo mais, no suporte livro de papel. De pijama ou sem pijama, o que importa é o texto e o se o cara que batuca no teclado tem o que dizer e sabe como fazê-lo.
De certa forma a exposição no Sesc Pinheiros, com curadoria de Heloisa Buarque de Hollanda, a tal de BLOOKS, diáloga com este lançamento do Nelson e da Terracota Editora. Seria um outro bom nome para a antologia. A síntese de livro+blogue=BLOOKS. Voltarei ao assunto da exposição, depois.
27 maio 2009
João Miguel Henriques à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
A poesia foi sendo para mim coisas diferentes ao longo dos anos. Mas algo que nunca deixou de ser é esse trabalho da memória sobre a linguagem. Ou será que é a linguagem que trabalha sobre a memória? É por vezes difícil distinguir...
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Dar conselhos não é de facto o meu forte, mas creio que um iniciante deve acima de tudo procurar alguma pureza. Dedicar-se ao labor da poesia sem se preocupar muito com publicações ou reconhecimento público. Não deixar-se contaminar pelas instituições da cultura. E nesse trabalho poético puro, não deve também descurar uma certa consciência do percurso histórico da própria poesia. Julgo que era T.S. Eliot quem afirmava que sem esse sentido histórico nenhum poeta poderia continuar a escrever após os vinte e cinco anos de idade.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Não sei se os que vou citar são textos referenciais, mas fazem seguramente parte das minha predilecções mais ou menos constantes. O Livro de Cesário Verde, de Cesário Verde, pela linguagem trabalhada, pelo requinte formal e pelas visões da cidade; Na Terra e no Inferno, de Thomas Bernhard, pelo exercício da memória acompanhado de um belíssimo sentido trágico da existência; e A Musa Irregular, reunião da poesia de Fernando Assis Pacheco, um poeta infelizmente não muito conhecido fora de Portugal, mas que tem poemas de amor extraordinários e um admirável sentido de equilíbrio entre o coloquial e o mais lírico ou erudito.
João Miguel Henriques nasceu em Cascais em 1978. Estudou Literatura em Lisboa, Jena (Alemanha) e Edimburgo (Escócia). Vive e trabalha em Lisboa. Estreou-se em poesia com o livro O Sopro da Tartaruga (Edição do Autor, 2005) e em 2007 participou no Tordesilhas, Festival Ibero-Americano de Poesia Contemporânea. Publicou também um conjunto de poemas no nº 12 da revista DiVersos e em publicações online como a Zunái ou a sèrieAlfa. Desde finais de 2003 que mantém o blogue Quartos Escuros (www.quartosescuros.blogspot.com).
23 maio 2009
Glauco Mattoso à queima-roupa
1. O que é poesia para você?
Já dei várias respostas a essa pergunta, mas acho que a melhor foi aquela que usei numa oficina que ministrei na Casa das Rosas: a poesia é uma metralhadora na mão dum palhaço. Seu poder de fogo pode ser apenas intencional, e seu efeito apenas hilário, mas o franco-atirador, ao expor-se em sua ridícula revolta, no mínimo consegue provocar alguma reação, ainda que meramente divertindo o público, e alguma reflexão sobre o papel patético dos idealistas e visionários, que, no fundo, somos todos nós.
2. O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Depende justamente da concepção poética que ele adotou. No meu caso, trata-se de vomitar algo visceral, de me expor, me devassar e desabafar uma biografia excêntrica para me identificar com outros excêntricos e tirar, dessa diversidade de individualidades, o traço de humanidade que nos une, isto é, o sofrimento e a revolta contra as opressões e repressões. Uma das "missões" do poeta - mas não a única - é ser porta-voz dos perseguidos, injustiçados, excluídos, rejeitados e humilhados, ainda que tais angústias sejam meramente sentimentais ou emocionais - frustrações amorosas, por exemplo. Voltando à questão do iniciante, eu recomendaria três coisas: primeiro, muita leitura, poesia de várias épocas e estilos, para estabelecer preferências e simpatias; segundo, fidelidade à própria biografia, nada de fingir demais, ainda que o poeta seja um fingidor, como dizia Pessoa; terceiro, estudar versificação, mesmo que o cara não pretenda fazer poesia rimada nem metrificada. Assim, ele estará minimamente instrumentado para o "ofício".
3. Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Isso é sempre muito pessoal e intransferível, mas vamos lá. Gregório de Matos, por ser pioneiro na nossa história e por ter praticado duas coisas que utilizo: os jogos verbais barrocos (antíteses, paradoxos, paronomásias, paródias, trocadilhos) e sátira desbocada (inclusive enveredando pelo fescenino); Bocage, por duas características que adotei: apuro formal do soneto e deboche obsceno; Bandeira, por uma única e fundamental razão: provar que é perfeitamente possível praticar todas as modalidades poéticas, desde o verso mais ritmado e rimado até o experimentalismo mais iconoclasta e anárquico, sem perder de vista o lado humano, confessional e emocional. Quanto aos textos referenciais, sugiro, primeiro, "Os Lusíadas", não para ler de cabo a rabo, mas para passear nele, viajar no ritmo, ir se acostumando a discorrer, raciocinar metrificando, pensar em decassílabo; segundo, "Eu", de Augusto dos Anjos, para, ao contrário dos "Lusíadas", percorrer, num único e curto livrinho, toda a obra duma vida, o que nos dá noção de que o poder de síntese pode ser essencial e suficiente; terceiro, "Poesia completa e prosa", a obra reunida do Manuel Bandeira, que tenho em papel-bíblia mas que existe em diferentes edições, incluindo o "Itinerário de Pasárgada", roteiro autobiográfico-intelectual, e a "Apresentação da poesia brasileira", que, embora incompleta e parcial, dá uma visão panorâmica.
Glauco Mattoso (paulistano de 1951) é um dos mais radicais representantes da ficção erótica e da poesia fescenina em língua portuguesa, descendente direto de Gregório, Bocage e, em prosa, de Sade e Masoch. Na década de 1980, celebrizou-se entre a "marginália" literária como autor do fanzine anarco-poético "Jornal Dobrabil" e do romance fetichista "Manual do podólatra amador" (reeditados, vinte anos depois, respectivamente pela Iluminuras e pela Casa do Psicólogo); após perder a visão, já na década de 1990, publicou mais de vinte volumes de poesia (entre os quais a antologia "Poesia digesta: 1974-2004", pela Landy), além do romance paródico "A planta da donzela" (editado pela Lamparina), que revisita "A pata da gazela" de Alencar. Adepto fervoroso da glosa decimal e do soneto clássico, destaca-se também como lexicógrafo no bilíngüe "Dicionarinho do palavrão" (pela Record) e como esticólogo numa "Teoria do soneto" e num tratado de versificação, "O sexo do verso: machismo e feminismo na regra da poesia", a sair em livro. Colaborador nas mídias impressa e virtual, assina colunas na revista "Caros Amigos" e no portal "Cronópios", entre outros veículos. Como letrista, tem sido musicado por nomes singulares do porte de Arnaldo Antunes, Itamar Assumpção, Falcão, Ayrton Mugnaini e outros experimentalistas independentes ou irreverentes. Seus livros mais recentes vêm saindo pela Dix Editorial (da Annablume), na série "Mattosiana", entre os quais uma história do rock e uma pesquisa do cancioneiro popular brasileiro, tudo em forma de soneto. Eis os endereços e contatos:
www.annablume.com.br
http://glaucomattoso.sites.uol.com.br
E-mail: glaucomattoso@uol.com.br
22 maio 2009
Ney Ferraz à queima-roupa
1. O que é a poesia para você?
Nunca tive como saber o que é a poesia. Para o poeta ela é uma estranha proximidade. Uma força anônima. Como poeta e como leitor sei que a poesia é muito rara. Tarda a acontecer. Abre-se o livro e é tão difícil encontrá-la ali. Mas se ela se manifesta, encontramos o poeta. Há um abismo que só faz crescer entre quem escreve e a poesia. Houve um tempo em que o poeta escrevia municiado pelos tratados de poética. Outro, em que ter uma máquina de escrever era ser criminoso. Hoje, a tecnologia governa a nossa vida. Mas nem por isso é mais fácil. Tanto que cada vez mais parece que ser poeta é um ofício antiquado. Inútil. Menosprezado. O poeta sumiu do assim chamado “discurso público”. E a poesia talvez já seja outra coisa que mais uma vez nos escapa.
2. O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Fazer coisas em desuso. Ler, observar, anotar, sair à rua. Ir ao encontro dos seus espectros. Surpreendentemente foi Vinícius de Moraes e não João Cabral de Melo Neto que viveu como poeta. A poesia tem também as suas leis e regras difíceis de serem perscrutadas. O poeta deve estar atento. Escolher. Fugir. Ir em frente. Sem que nada disso deixe de ser um recolhimento. Arder, arder, arder como um fogo de artifício, como diz Jack Kerouac.
3. Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Ana Cristina Cesar. Eu havia saído da universidade, início dos anos 1990, e dei de cara com ela numa livraria em Belém. Não era suicídio sobre a relva, título do meu primeiro livro publicado em 2000, é um conhecido verso dela. Depois veio meu encontro com Max Martins. Muitos papos. Muitas leituras. Redescobri Henry Miller. Lawrence Ferlinghetti. Os poetas beats. Paulo Plínio Abreu, Robert Stock, Mário Faustino. Nesse início dos anos 1990 inaugurou-se em Belém a Casa da Linguagem. Foram tempos agitados. Lá tínhamos a liberdade que o curso de letras da universidade não podia oferecer. O Max Martins dirigia a Casa da Linguagem. Tudo era misturado ali. Um Caldeirão. Vicente Franz Cecim. Benilton Cruz. Antônio Moura. Sérgio Wax. Uma sensibilidade sismográfica. Bem, não tem como ser três, o poeta é sempre cercado por uma legião. Outros autores e outros textos vieram e foram se impondo. Jorge Luis Borges, Herman Melville, Sylvia Plath, Thomas Bernhard, Blanchot. Mais recentemente descobri a poesia estonteante e sem rumo de Luís Serguilha, em suas Embarcações. Como poeta nada mais surpreendente que achar um autor e seu texto – é sempre deles que posso partir.
Ney Ferraz Paiva nasceu em Belém em 1962. Publicou dois livros pela Fundação de Cultura Cidade de Recife, como resultado do Prêmio Eugênio Coimbra Júnior: Não era suicídio sobre a relva (2000) e Nave do Nada (2004). Prepara o terceiro, Val-de-cães, para ser lançado este ano pela Pazulin. Reside em Palmas, Tocantins. E-mail: neyferrazpaiva@gmail.com
19 maio 2009
12 maio 2009
08 maio 2009
Minuto
Minuto de Augusto de Campos - videoPoema de Mardônio França [poeta multimeios]
Email - mardfranca@gmail.com
www - www.corsario.art.br
03 maio 2009
Ivaldo Ribeiro Filho à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Não possuo uma definição de poesia, mas lembro que Paulo Leminski enumerou mais de quinze definições de poesia. São tantas e tão variadas, geralmente dando relevo a algum aspecto, deixando os demais de fora, que não ouso.
Mesmo assim, adoro que estejam procurando estas definições. Valery, Jakobson, os românticos, os concretos procuraram uma definição para poesia. Com eles, algo se transformou e isso é ótimo.
Por enquanto, basta-me escrever.
Mas se fosse dar uma definição de poesia, por acaso não seria a definição da poesia que faço?
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Não sei o que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira, mas sei contar o meu caminho. Quando a necessidade de escrever poemas surgiu, procurei ler os autores do Modernismo, visto serem os mais divulgados e os que apareciam nos livros da escola.
Depois, passei a comprar revistas literárias e a passear pelos sites literários, na internet. Se alguém dizia que algum autor era importante, eu comprava o livro e ia ler aquele autor até saber por que ele era importante.
No começo foi difícil: alguns autores eram sentimentais demais e outros herméticos em demasia. Mesmo com estas dificuldades, continuei a ler.
Então, chegou o dia em que passei a ler os autores contemporâneos, visto que amigos, também apreciadores de poesia, me apresentavam esses autores. Aos poucos, fui encontrando o meu caminho.
Como não tenho formação em letras, nem em filosofia, passei a ler estes assuntos e isso muito me ajudou.
Após ter publicado o primeiro livro, continuei os estudos lendo livros direcionados à escrita, fiz cursos, mini-cursos, participei de eventos em universidades, continuei vasculhando textos pela internet, fui a centros culturais e aprendi um pouquinho de cinema, dança, teatro, fotografia, artes plásticas, música e a ver relação da literatura com essas outras linguagens.
Infelizmente, não fiz parte de oficinas literárias, visto não existir nenhuma em Fortaleza ou Teresina. No entanto, creio que muito me ajudariam.
Ainda hoje acompanho o que está sendo publicado, viajo em sites de universidades e busco entender as discussões em torno da literatura, o que os escritores dizem. Aliás, gosto, principalmente, de escutar o que eles têm a dizer.
Quase esqueço de falar que, no início, eu mostrava os meus textos a um amigo que estudava letras. Um grande amigo, o Marcelo Magalhães, que possuía uma paciência enorme comigo.
Quase esqueço de contar que eu possuía uma turma que me emprestava livros, discutia literatura comigo, a quem, mais tarde também mostrei meus textos. São poetas inteligentes e sensíveis, a quem eu dava a liberdade de dizerem quando não gostassem de um texto meu. Júlio Lira, Eduardo Jorge, Diego Vinhas, Eli Castro, Rodrigo Magalhães.
Era difícil escutar de alguém que não gostou de um poema meu, mas eu cresci muito com isso. O mais interessante é que nós, da turma, seguimos caminhos diferentes e que nossas maneiras de ver a poesia nunca foram iguais, mas que, mesmo assim, sempre nos respeitamos bastante.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Publiquei quatro livros e eles são tão distintos entre si que parecem não terem sido escritos pela mesma pessoa. Apesar disso, são meus e eu os adoro. Digo isso, porque eu me encontro em uma situação em que meus textos talvez não formem um conjunto. Tenho procurado trilhar sempre um novo caminho e me sinto já uma pessoa multifacetada.
O meu livro Cruviana, por exemplo, traz uma temática nordestina que destoa de tudo o que é produzido nos grandes centros, como São Paulo e Rio. É por isso que me pergunto sobre quais autores me influenciaram e que foram referenciais para o meu trabalho.
Leio os autores brasileiros da década de 90 para cá, principalmente. Sinto atração por certa poesia americana do século vinte como William Carlos Williams e Robert Creeley. Quanto aos modernistas, prefiro Drummond, Bandeira e Murilo Mendes.
Gosto de ler autores inventivos, experimentais e que trabalhem a linguagem. No entanto, acredito que nem as obras destes autores, muito menos eles, se reconheçam como referenciais ao meu trabalho.
Ivaldo Ribeiro Filho. Nasci em Picos, Piauí, em 1974. Como meu pai era bancário, morei em várias cidades do interior do nordeste, durante a infância. A maior parte no Ceará. Residi durante dezoito anos em Fortaleza, e moro pela segunda vez em Teresina, onde estou desde 2006.
Sou graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará e tio da Marina.
Publiquei quatro livros: "O Chão Visitado" (2003), "No Intuito de Nenhuma via" (2005), "Cruviana" (2005) e "Quebranto" (2007). Publiquei a reunião "Poesia até Agora" (2007) e participei de três antologias.
Estive na Bienal Internacional do Livro do Ceará de 2006, no Primeiro Encontro de Revistas Literárias do Brasil, como debatedor.
Escrevi artigos que foram publicados nos sites Corsário (CE), Cronópios (SP) e Poema Show (RJ), além de outros.
Atuei como jornalista cultural no Portal de Internet Tribuna do Sol (PI), nos anos de 2006 e 2007.
Tenho textos na internet que podem ser encontrados ao colocar o meu nome completo (ivaldo ribeiro filho), entre aspas, no google – gerando uma pesquisa específica.
Participo do site Clicfolio. Um site voltado para portfólios de trabalhadores do setor criativo. Basta por Clicfolio no google e procurar escritores do estado do estado do Piauí. Lá são encontradas informações detalhadas das atividades que desenvolvi. E-mail: ivaldoribeirofilho@gmail.com
28 abril 2009
Micheliny Verunschk à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
A poesia para mim é a forma mais eficaz de alcançar algo inatingível, a essência do real ou, antes, o real em essência. É também o único modo pelo qual posso enxergar o mundo. Ela está um degrau acima da filosofia e um degrau abaixo do amor.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Ter uma dicção própria apesar de todas as referências que o acompanham.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
João Cabral de Melo Neto
Ezra Pound
Sophia de Mello Breyner Andresen
Os três, em diferentes momentos da minha vida, me ensinaram (e continuam a ensinar) os caminhos não só para um bom poema, como para a poesia. Isso é tudo e não é pouco.
Micheliny Verunschk é autora de Geografia Íntima do Deserto (Landy, 2003), indicado ao prêmio Portugal Telecom de 2004, e O Observador e o Nada (Edições Bagaço, 2003). Escreve o blog Ovelha Pop (www.ovelhapop.blogspot.com).
24 abril 2009
Alfredo Fressia à queima-roupa
1. O que é poesia para você?
Caro Edson, elétrico e aceso, primeiro minhas desculpas pelo meu atraso (três meses?) em responder as tuas perguntinhas sapecas. Confesso que não gosto dessas perguntas gigantes –o que é a vida, o mundo, para que existe o homem-. Uma resposta “ontológica” está condenada a ser incompleta. Idem as respostas fenomenológicas. Eu prefiro dar uma “resposta” –gigante também- assumidamente incompleta, a saber, a poesia é o melhor, mais profundo e mais denso espaço de reflexão da experiência humana. Por isso ela não é simpática ao capitalismo (assim dizia um verso de Gelman), nem aos tempos que correm, regidos pela pressa, pelo sumiço do homem nas multidões e pelas manipulações mediáticas. Ela é sabidamente perigosa e rebelde, uma teimosa mosca na sopa.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Iniciante ou velho de guerra, o poeta deve lembrar dessa rebeldia da poesia. O trabalho poético é artesanal, e não é vendável. A unidade da poesia é o poema, eventualmente até o verso, por isso o suporte livro não é absolutamente da sua natureza intrínseca. A poesia pode existir em qualquer mídia e qualquer paisagem humana, o jornal, a tela do computador, ou nessa “mídia” chamada memória. Ou na lua, lembraria o peruano Jorge Eduardo Eielson, onde queria ser enterrado e queria enterrar um poema dele, coitadinho.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Não, meu caro Edson, só três textos de só três poetas eu não escolho. A poesia é feita por todos, dizia meu patrício, o Isidoro Ducasse (e olha que ele se dizia Conde), ela é um tecido infinitamente polifônico, até pelo avesso do avesso o poeta é referência. Não há lugar para a penumbra em se falando de poetas. Quanto aos meus poetas mais amados, não somente eles são “íntimos” como também a obra deles quase não ilumina os poemas que me tocou escrever. Juro, é assim.
Caso Edson, não acho uma fichinha em português. Não tem tu vai tu mesmo em espanhol:
Alfredo Fressia nació en Montevideo en 1948. Radica en Saõ Paulo, Brasil, desde 1976, donde ha sido profesor y periodista cultural. Su trabajo literario, que incluye la traducción de poesía, la crítica y la crónica, se centra sin embargo en la creación poética. Su obra, traducida a varias lenguas, se compone hasta el presente de los siguientes poemarios:
Un esqueleto azul y otra agonía. Ediciones de la Banda Oriental. Montevideo. 1973. Premio del Ministerio de Educación y Cultura.
Clave final (Montevideo-Niterói 1975-1979). Ediciones del Mirador. Montevideo. 1982.
Noticias extranjeras. Ediciones del Mirador. Montevideo. 1984.
Destino: Rua Aurora. Edición del Autor. São Paulo. Primera y segunda ediciones. 1986.
Cuarenta poemas. Ediciones de UNO. Montevideo. 1989.
Frontera móvil. Aymara. Colección Arequita. Montevideo. 1997. Premio del Ministerio de Educación y Cultura.
El futuro/O futuro. Edición bilingüe. Versión portuguesa a cargo de Hermínio Chaves Fernandes. Edições Tema. Lisboa (Portugal). 1998.
Amores impares. Collage de poesía sobre la obra de nueve poetas uruguayos. Aymara. Colección Cuestiones. Montevideo. 1998.
Veloz eternidad. Vintén Editor. Montevideo. 1999. Premio del Ministerio de Educación y Cultura.
Eclipse. Cierta poesía 1973-2006. Civiles iletrados. Montevideo-Maldonado. 2003. Reeditado por Alforja Conaculta-Fonca, Colección Azor, México D.F., 2006.
Senryu o El árbol de las sílabas. Linardi y Risso. Col. La hoja que piensa. Montevideo, 2008. Premio Bartolomé Hidalgo 2008.
E-mail: alfress@uol.com.br
22 abril 2009
Marcelo Ariel à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
A busca do Real fora da ficção do eu, onde a linguagem renasce como uma luz e um mapa para a descoberta do mundo.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Deve perseguir a renúncia ao eu através da linguagem, mesmo que para isso esbarre na incompreensibilidade e na obscuridade, aliás, a obscuridade limpa. Deve ler muito e sempre, principalmente os antigos que tinham a elegância de não assinar, ler os livros sagrados: Os Vedas, o I-Ching, a Bíblia (Nas versões de Martin Buber e André Chouraqui), O Tao Te King, o Dhammpada, o Alcorão, o Masnavi, enfim a leitura dos livros sagrados é a fonte da melhor poesia , não existiria Shakespeare sem a Bíblia do Rei James.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Herberto Helder e sua Poesia Toda, Helder abriu para mim um campo vasto de significados para a imagem como o acontecimento mágico, no sentido mais profundo e menos metafísico dessa palavra.
Wittgenstein e seu Tractatus Lógicus Filosoficus, um livro que me emociona até as lágrimas, porque seu autor tenta recuperar a dignidade do silêncio e desmontar a grande falcatrua do iluminismo, que até hoje serve de base para uma visão equivocada da vida e do mundo.
Fernando Pessoa e sua Obra Poética, Pessoa me mostrou a possibilidade que temos de criar universos quando nos afastamos um pouco da ficção do eu ou o reviramos pelo avesso, a poesia é a essência da magia e só a magia é real, aprendi isso com Pessoa.
Marcelo Ariel, nasceu em Santos-SP em 1968, Poeta, autodidata e perfomer. Autor dos livros: ME ENTERRE COM A MINHA AR 15 (Coletivo Dulcinéia catadora-SP-2007), TRATADO DOS ANJOS AFOGADOS (Letraselvagem-SP-2008) e O CÉU NO FUNDO DO MAR (a ser lançado pelo Coletivo Dulcinéia Catadora). E-mail: marceloahriel@yahoo.com.br
20 abril 2009
Paulo de Toledo à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Poesia é a arte de transformar signos simbólicos em signos icônicos (sempre no sentido peirceano).
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
O novel deve tentar descobrir as características que tornam os melhores poetas melhores do que os não-melhores-poetas. Depois de descobertas essas características, ele deve tentar descobrir uma forma de incorporar essas características de maneira a parecer que essas características sejam exclusivas dele. De que maneira? Não sei. Ainda estou tentando descobrir.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Os poetas e livros citados a seguir referem-se àqueles que serviram de base para a minha formação.
Os poetas: Fernando Pessoa, e. e. cummings e Augusto de Campos.
O Pessoa foi o poeta que primeiro causou em mim o deslumbramento poético. Quando li pela primeira vez coisas como o poema “Aniversário”, só consegui pensar em virar poeta.
Já em cummings e Augusto, encontrei um aspecto lúdico que tem muito a ver com o meu temperamento e biografia. Pra quem foi alfabetizado lendo gibis da Marvel, as Letras devem necessariamente ter cor, sabor, movimento etc. O preto no branco nem sempre dá conta do que rola na cabeça e no coração.
Os textos: ABC da Literatura (Ezra Pound), Understanding Media (Marshall McLuhan) e Semiótica e Literatura (Décio Pignatari).
Só quando descobri o ABC, é que comecei realmente minha alfabetização literária. A lição poundiana me possibilitou ter uma atitude crítica com relação a todo e qualquer paideuma — ou coisa que o valha—, inclusive aquele elaborado pelo magnífico autor dos Cantares.
McLuhan me revelou as engrenagens das coisas. Ler Marshall McLuhan foi como ingressar numa escola de relojoaria. Com ele, pude entender melhor as especificidades da literatura em relação às outras formas de arte. E, principalmente, pude compreender melhor a diferença entre poesia e prosa, entre poesia oralizada e poesia escrita, entre som e letra.
Semiótica e Literatura foi um dos livros mais importantes da minha vida. Posso dizer que ele, juntamente com a leitura posterior dos escritos peirceanos, foi o hardware que permitiu que eu pudesse “rodar” todos os softwares artísticos e poéticos com que me deparei vida afora.
PAULO DE TOLEDO (Santos/SP, 1970) é poeta. Publicou 51 Mendicantos (Ed. Éblis, 2007, Porto Alegre). Venceu o V Projeto Nascente (USP/Ed. Abril). Tem poemas, contos, traduções e ensaios em vários sites de arte e literatura e nas revistas Babel, Sítio, Coyote, Cult e nos jornais Augusto, Casulo e Correio das Artes. Participou da edição crítica de "Catatau" (ed. Travessa dos Editores), obra de Paulo Leminski. Alimenta um blog de estimação: http://paulodtoledo.blog.uol.com.br E-mail: paulodtoledo@uol.com.br
18 abril 2009
Jairo Pereira à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Até tempos atrás sustentava que poesia era produto fenomênico do pensamento, extrato de experiências cósmicas... extrema liberdade das linguagens. Hoje fujo de qualquer definição da dita.
Na verdade, poesia é mistério apreendido por um milagre das linguagens. Nem sempre acontece, mas com técnica (tipo um método subjetivo detido pelo verdadeiro poeta) o milagre tende a se repetir inúmeras vezes.
Poesia supera a filosofia na inauguração dos novos espaços do pensar, que o próprio visionarismo possibilita. Poesia, acata a dinâmica das linguagens que sempre se renovam, e atrás do poeta devem correr antropólogos, filósofos, exegetas e toda sorte de pensadores.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Considerar a poesia quase como um ofício, do qual não se pode esperar retorno financeiro. É missão na vida do sujeito criador. Missão de fé e descoberta das linguagens. Ninguém se mantém poeta por que quer, mas algo misterioso o faz poeta pra toda vida.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Angusto dos Anjos, me marcou com sua poesia forte. Não pela forma, mas sempre pelo conteúdo.
Edgar Allan Poe, pelo poema “O corvo” que lia e relia abismado.
Manuel Bandeira q. me emocionou quando li na escola o poema “A última canção do beco”.
Os poetas que cito, apenas me chamaram a atenção pra poesia, numa época em que sequer escrevia poemas, dos 17 aos 21. Comecei a escrever em poesia somente aos 24 anos, embora já tivesse alguns manuscritos bem amadores.
jAirO pEreIra. Nascido em 23/03/56 em Passo Fundo-RS. vive e trabalha em Quedas do Iguaçu-PR há mais de vinte anos. editou sete livros, sendo: O artista de quatro mãos – contos - ; O antilugar da poesia – manifesto poético - ; Signo de minha prática – poesia - ; Meus dias de trabalho – poesia - ; O abduzido – romance/ensaio e o livro-poema Capimiã pela Editora Medusa, Coleção Ruptura Réptil e ESPIRITH OPÉIA, Editora dos Recusados, poesia. Tem ensaios e artigos publicados em várias revistas e jornais (revistas escritas e eletrônicas como TANTO, EM TEMPO, A ARTE DA PALAVRA, BLOCOS, VERBO 21, COYOTE, PALAVREIROS,ONTEM CHOVEU NO FUTURO, REVISTA ZUNÁI, CRONÓPIOS, CAPITU, as últimas três de São Paulo e outras.
E-mail: jairopereiraadv@hotmail.com
Site: www.jairopereira.com.br
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