29 janeiro 2009
Claudio Daniel à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Perplexidade; descoberta; incerteza; encantamento; conflito entre palavra e coisa, sonoridade e sentido; criação de um universo próprio, logo, invenção de linguagem.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Conquistar um repertório, pela leitura incessante ("a poesia vem da poesia", conforme ensinou Jorge Luis Borges); conquistar um léxico e saber usar as palavras de modo preciso, conforme a intenção estética; conquistar uma sintaxe, que não é apenas a da gramática, mas sobretudo a da imaginação; e conquistar uma mitologia pessoal, pela elaboração de suas próprias obsessões.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Ou o poema contínuo, de Herberto Helder, pela estranheza imagética, pelo uso de novas metáforas, pela dissonância rítmica, pelo imaginário, pela maneira como o poeta organiza o poema longo.
A morte é uma flor, de Paul Celan, pela arquitetura poética concisa, elíptica, quase silenciosa, que faz de cada poema um enigma a decifrar.
Poesia completa, de João Cabral de Melo Neto, por todo o arsenal de recursos poéticos utilizados pelo autor, especialmente na Anti-Ode, Psicologia da Composição e Fábula de Anfion.
Claudio Daniel, poeta, tradutor e ensaísta, nasceu em São Paulo (SP), em 1962. Publicou os livros de poesia Sutra (ed. do autor, 1992), Yumê (Ciência do Acidente, 1999), A sombra do leopardo (Azougue Editorial, 2001, vencedor do prêmio Redescoberta da Literatura Brasileira, oferecido pela revista CULT) e Figuras Metálicas (Perspectiva, 2005), e o de contos Romanceiro de Dona Virgo (Lamparina, 2004). Publicou também a antologia Na Virada do Século, Poesia de Invenção no Brasil (Landy, 2002), em co-autoria com Frederico Barbosa, e Ovi-Sungo, Treze Poetas de Angola (2007), entre outros livros. Organizou os eventos literários internacionais Galáxia Barroca e Kantoluanda, em 2006, e foi um dos curadores do Tordesilhas, Festival Ibero-Americano de Poesia Contemporânea, em 2007. É editor da revista eletrônica de poesia e debates Zunái (www.revistazunai.com) e mantém o blog Cantar a Pele de Lontra (http://cantarapeledelontra.zip.net). Atualmente, faz mestrado em Literatura Portuguesa na Universidade de São Paulo. E-mail: claudio.dan@gmail.com
28 janeiro 2009
Ricardo Aleixo à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
O contrário do que é “ensinado” em boa parte das escolinhas de letras. O contrário do que pode ser encontrado nas prateleiras das livrarias. O contrário do que escrevem 99% dos atuais cantautores de MPB. O contrário do que se lê na maioria das nove ou dezessete revistas ditas de literatura que circulam por aí. O contrário do que mofa nas estantes das bibliotecas públicas e centros culturais. O contrário do conformismo generalizado – que, com os blogues, só fez conquistar maior visibilidade. O contrário disso que publicamos, o mais das vezes, por simples vaidade, e que só mesmo nossos amigos e familiares fingem ler com algum interesse.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Quem sou eu para dizer o que alguém deve fazer, na vida ou na poesia? Digo só o que eu mesmo faço desde que me meti pela primeira vez neste estranho mundo que é o da invenção, via linguagem, de outras formas de realidade: continuo a me ver como um iniciante, depois de 30 anos de tentativas. Foi a maneira que encontrei para impor limites ao ego e, ao mesmo tempo, para manter acesa a chama do desejo de ser poeta. Persigo esse sonho lendo (vendo e ouvindo) e relendo (revendo e reouvindo) a poesia de outros que me dão a impressão de que também não se considera(va)m prontos como poetas. E lendo, vendo, ouvindo os que sequer se definem – ou são definidos – como poetas. Outro exercício que me imponho é manter distância dos mandarins do poder literário, sejam eles editores, críticos ou meros coleguinhas de ofício que se consideram com “autoridade” suficiente para definir quem é e quem não é poeta.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Deixo de lado os textos, mas, em compensação, te dou 5 poetas e os motivos que me fazem escolhê-los: Augusto de Campos, Clementina de Jesus, John Cage, Milton Santos, Jean Luc Godard. Augusto porque explode com as noções correntes de poesia. E porque funda – e tensiona – todo um modo de “ouver” a poesia de outros contextos e épocas. Clementina, com seus impressionantes graves e seus não menos impactantes agudos, sua respiração quase sempre fora do tempo e a liberdade folgazã de atacar as notas iniciais sem qualquer respeito pela tonalidade em que a música se encontra, é nosso exemplo mais realizado de “poesia sonora”. Cage: como defini-lo? Milton Santos: a ideia de que a escassez material é o motor da vida do pobre, porque induz ao deslocamento, e daí à solidariedade, é importantíssima para a concepção de poesia que eu pratico e defendo. Godard: é quem nos ensina a usar a matéria sonora como elemento estruturante – e não como “ilustração” – no projeto audiovisual.
Ricardo Aleixo é poeta, artista visual e sonoro, compositor, performador, ensaísta e editor geral da revista “RODA - Arte e Cultura do Atlântico Negro”. Publicou, entre outros, os livros "Trívio" e "Máquina Zero". Como solista ou integrante da Cia. SeráQuê? e do Combo de Artes Afins Bananeira-ciência, já se apresentou na Argentina, na Alemanha, em Portugal, na França e nos EUA. Desde julho de 2007 concentra suas atividades de criação e pesquisa no LIRA (Laboratório Interartes Ricardo Aleixo), onde também oferece oficinas, cursos e aulas particulares nas áreas em que atua. É professor de Design Sonoro na universidade Fumec. Desenvolve atualmente o projeto do livro/DVD "Modelos vivos", produzido com recursos da Bolsa Petrobras Cultural.
26 janeiro 2009
Carlito Azevedo à queima-roupa
[foto: Marília Garcia]
1) O que é poesia para você?
Algo tão generoso que às vezes até se dá ao trabalho de aparecer uma ou duas vezes num bom livro de poemas.
Desde a invenção do cinema ela também tem gostado de dar as suas caras na grande tela, principalmente em filmes de René Clair, Jean Vigo, ou naquele, belíssimo, de Jean Cocteau em que Orfeu, antes de dar o primeiro passo inferno abaixo, em busca de Eurídice, pronuncia as palavras mágicas: “O espelho deveria refletir um pouco mais antes de nos devolver a nossa face”.
Hokusai, que sabia do que ela era feita, às vezes a colocava numa onda, num galo, numas mulheres atravessando uma ponte.
Minha mais recente visão dessa metamórfica criatura foi aqui, em letras e sons:
http://www.palabravirtual.com/index.php?ir=ver_voz1.php&wid=381&p=Ernesto%20Cardenal&t=Como%20latas%20de%20cerveza%20vacías
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Sapos de verdade em jardins imaginários, como queria Marianne Moore.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Em primeiro lugar vou avisando que é uma escolha prospectiva, e não retrospectiva. Em vez de falar do que é uma referência para o que eu fiz, vou falar do que é uma referência para o que eu quero fazer. Ah, e em vez de "explicar" a minha escolha prefiro "ilustrar" a minha escolha, por isso, cada poeta será acompanhado por um poema de sua autoria. Lembrei agora de uma menina japonesa que vi na exposição de Miró, anos atrás, e que diante do namorado que pedia que ela lhe "explicasse" Miró pois ele, ao fim da exposição, não tinha entendido nada, respondeu apenas que se ele já tinha visto os quadros e não entendia nada, não adiantava explicar, porque o que ele ia entender era a explicação e não os quadros.
A) Susana Thénon, a notável poeta argentina nascida em 1935, e falecida ao 56 anos. Utilizo aqui a ótima tradução feita por Angélica Freitas e publicada na "Modo de usar & co" digital.
– onde é a saída?
– desculpe?
– perguntei onde é a saída
– não
não há saída
– mas como se eu entrei?
– claro
lembro de você
e além disso a vejo
mas saída
saída não há
viu?
– mas não pode ser
vou sair por onde entrei
– não
já está muito tarde
desde as dez a entrada está proibida
e além disso o que você quer? que me façam uma lavagem
cerebral
por deixar uma pessoa sair
pela entrada?
– escute
deve haver uma maneira de chegar à rua
– já perguntou em informações?
– sim
mas me mandaram vir aqui
– pois é
e eu estou dizendo que não há saída
– onde é o telefone?
– vai ligar para quem?
– para a polícia
– aqui é a polícia
– mas você está louco? aqui é uma sala de
concertos
– isso até certa hora
depois é a polícia
– e o que vai acontecer comigo?
– depende do delegado de plantão
se for o Loiácono
pode te deixar barato
e em menos de alguns dias você está fora
– mas isso é uma loucura
onde estão as outras pessoas
– setor de detidos
primeiro subsolo
– por que
estão fazendo
isso?
– vamos tia
não me diga que nunca foi a um concerto
*
B) Frank O'Hara, o incrível poeta norte-americano, morto tão jovem (aqui em tradução da poeta Luiza Franco Moreira que saiu na Inimigo Rumor 9):
Uma Coca-cola com Você
é ainda melhor que uma viagem a San Sebastian, Irun, Hendaye, Biarritz, Bayonne
ou que ficar enjoado na Travessera de Gracia em Barcelona
em parte porque nessa camisa laranja você parece um São Sebastião melhor e mais feliz
em parte porque eu gosto tanto de você, em parte porque você gosta tanto de iogurte
em parte por causa das tulipas laranja fluorescente contra a casca branca das árvores
em parte pelo segredo que nos vem ao sorriso perto de gente e de estatuária
é difícil quando estou com você acreditar que exista alguma coisa tão parada
tão solene tão desagradável e definitiva como estatuária quando bem na frente delas
na luz quente de Nova York às quatro da tarde nós estamos indo e vindo
de um lado para o outro como a árvore respirando pelos olhos de seus nós
e a exposição de retratos parece não ter nenhum rosto, só tinta
de repente você se surpreende que alguém tenha se dado ao trabalho de pintá-los
olho
pra você e prefiro de longe olhar para você do que para todos os retratos do mundo
exceto talvez às vezes o Cavaleiro Polonês que de qualquer maneira está no Frick
aonde graças a Deus você nunca foi de modo que eu posso ir junto com você a primeira vez
e isso de você se mover tão bonito mais ou menos dá conta do Futurismo
assim como em casa nunca penso no Nu Descendo a Escada ou
num ensaio em algum desenho de Leonardo ou Michelangelo que costumava me deslumbrar
e o que adianta aos Impressionistas tanta pesquisa
quando eles nunca encontraram a pessoa certa para ficar perto de uma árvore quando o sol baixava
ou por sinal Marino Marini que não escolheu o cavaleiro tão bem quanto o cavalo
acho que eles todos deixaram de ter uma experiência maravilhosa
que eu não vou desperdiçar por isso estou te contando
*
C) Bertolt Brecht (poema da antologia organizada e traduzida por Paulo César Sousa e publicada pela editora 34).
A DESPEDIDA
Nós nos abraçamos.
Eu toco em tecido rico
Você em tecido pobre.
O abraço é ligeiro
Você vai para um almoço
Atrás de mim estão os carrascos.
Falamos do tempo e de nossa
Permanente amizade. Todo o resto
Seria amargo demais
Carlito Azevedo nasceu no Rio de Janeiro (Ilha do Governador) em 1961. Publicou 4 livros de poemas: "Collapsus linguae", 1991; "As banhistas", 1993; "Sob a noite física", 1996; "Sublunar", 2001. Atualmente prepara, para lançamento em 2010, o livro "As aventuras do anjo boxeador". Edita desde 1997 a revista de poesia INIMIGO RUMOR, cuja longa duração (atualmente se encontra no número 20) se encerrará em abril deste ano com o lançamento de seu último número. E-mail: carlitoazevedo@hotmail.com
23 janeiro 2009
Frederico Barbosa à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Durante muitos anos recusei-me a responder a essa pergunta. Considerava precipitado ou enganador quem a tentava responder. E muitas tentativas de definição da poesia são mesmo superficialidades subjetivas demais para meu gosto: palavras vagas que formam quase sempre a mesma ladainha difusa e mistificadora.
Mas, paradoxalmente, se me recusava a definir a poesia, adorava e adotava a definição de Roman Jakobson, de que a função poética da linguagem é a projeção do “princípio de equivalência do eixo de seleção sobre o eixo de combinação”, ou seja, na criação literária a composição se sobrepõe, como princípio construtivo, à mera escolha das palavras guiada apenas pela semântica. Jakobson acrescenta ainda que a função poética é caracterizada por três aspectos básicos: imagens, sonoridade e ritmo. A partir destes conceitos do mestre linguista, eu inventei uma oficina de poesia que ministrei em vários cantos do país. Foi na troca instigante com os participantes destas oficinas que cheguei, sem abandonar os conceitos fundamentais de Jakobson, à minha definição de poesia que, embora pareça simples, norteia hoje meu pensamento sobre poesia.
• Poesia é a palavra/impacto, é uma composição construtora de efeitos. É a linguagem organizada da forma mais meticulosa possível para fazer sentir.
Decorrente desta definição, podemos deduzir que:
• Fazer um poema é escrever usando todos os recursos imagináveis para causar o maior impacto possível no leitor.
• Compor um poema é controlar nos mínimos detalhes os efeitos que o texto vai provocar no leitor.
• A poesia dissolve as fronteiras entre som e sentido, forma e conteúdo.
• O verdadeiro poeta, de Homero a Augusto de Campos, sempre será o mais consciente artífice da linguagem.
• No poema sempre se usarão os recursos mais econômicos e sutis para atingir os resultados mais impactantes.
• Na poesia menos é sempre mais.
• O maior efeito que um poeta pode produzir não é dizer ao leitor o que ele (poeta) sente, mas é fazer o leitor sentir o mesmo ao ler o poema.
No meu entender é isso o que define a poesia. O resto, pode ser filosofia, religião, psicologia, sociologia, mistificação... qualquer coisa, menos poesia.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Precisa se despir de todas as ideias preconcebidas, românticas e preconceituosas que rondam o fazer poético. Como os conceitos de dom, talento e inspiração. Como a ideia de que o poeta é mais sensível ou que escrever poesia é sentir ou vivenciar emoções... Deve desconfiar de todos as mistificações da poesia e do papel do poeta.
Deve saber que escrever poesia é um trabalho meticuloso e preciso e que, muitas vezes, não recebe o reconhecimento que merece, até porque está envolto em tanta mistificação... Se os próprios poetas consideram seu trabalho uma “inspiração divina”, um “dom artístico”... quem irá respeitar o trabalho do poeta?
O iniciante deve tentar lutar contra a sedução da facilidade e busacra sempre os caminhos mais difíceis.
O iniciante deve correr da troca de elogios fáceis do compadrio, típico da vida literária brasileira.
O iniciante não deve querer ser poeta, deve querer fazer bons poemas.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Poetas:
Seguindo a minha definição acima, minha escolha recai sobre três poetas que escrevem usando todos os recursos imagináveis para causar o maior impacto possível e que controlam nos mínimos detalhes os efeitos que o texto vai provocar no leitor. São, portanto, três dos mais conscientes artífices da nossa língua:
• Fernando Pessoa
• João Cabral de Melo Neto
• Augusto de Campos
Textos:
Três textos teóricos fundamentais para a elaboração da teoria da poesia como palavra/impacto são:
• "A Filosofia da Composição" de Edgar Allan Poe, que expõe em detalhes o processo de criação racional e meticuloso do poema O Corvo. Até hoje choca os defensores da inspiração mistificadora.
• "O ABC da Literatura" de Ezra Pound, que apresenta o conceito de grande literatura como “linguagem carregada de sentido ao máximo grau possível”.
• “Linguística e Comunicação” de Roman Jakobson, que apresenta a teoria da função poética da linguagem, que precisa ser levada em conta em toda e qualquer discussão sobre a definição de poesia.
Frederico Barbosa. Poeta e professor de literatura, é diretor executivo da Poiesis – Organização Social de Cultura, que administra a Casa das Rosas, o Museu da Língua Portuguesa, a Casa Guilherme de Almeida e os projetos São Paulo, um Estado e Leitores e PraLer – Prazeres da Leitura, em São Paulo. Formado em Letras pela USP, publicou os livros de poesia Rarefato (Iluminuras, 1990), Nada Feito Nada (Perspectiva, 1993), que ganhou o Prêmio Jabuti, Contracorrente (Iluminuras, 2000), Louco no Oco sem Beiras (Ateliê, 2001), Cantar de Amor entre os Escombros (Landy, 2002), Brasibraseiro (Landy, 2004), em parceria com Antonio Risério, pelo qual recebeu seu segundo Prêmio Jabuti, e A Consciência do Zero (Lamparina, 2004). Pela Landy Editora, publicou a coletânea Cinco Séculos de Poesia (2000), a seleção de sermões de Antônio Vieira, O Sermão do Bom Ladrão e outros sermões (2000), a edição comentada dos episódios camonianos Inês de Castro e O Velho do Restelo (2001) e a antologia Na Virada do Século, Poesia de Invenção no Brasil (2002). Organizou também diversas coleções de livros destinadas a popularizar a leitura dos clássicos da literatura luso-brasileira, vendidas nas bancas de jornal, vinculadas aos jornais O Estado de São Paulo (SP), O Globo (RJ) e Zero Hora (RS). A maior parte de sua produção poética está no site http://fredbar.sites.uol.com.br
21 janeiro 2009
Claudio Willer à queima-roupa
[foto: Carol Mendonça]
1) O que é poesia para você?
Uma aventura. Um modo de expressar a imaginação. E de expressar a paixão. Uma operação sobre a linguagem. Uma experiência de liberdade, e também de possessão.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Não deve perseguir nada - deve deixar acontecer. Mas é preciso ler poesia, e através da leitura, encontrar sua própria identidade literária.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Só três? Federico García Lorca, Poeta em Nova York. Jorge de Lima, Invenção de Orfeu. André Breton, Union Libre (principalmente, e também o restante). Mais - Ginsberg de Uivo, Herberto Helder, Fernando Pessoa, Octavio Paz - tantos outros... Ampliaram minha percepção de poesia.
Claudio Willer é poeta, ensaísta e tradutor. Nasceu em São Paulo, em 1940. Publicações mais recentes, Estranhas Experiências, poesia (Lamparina, 2004); Volta, narrativa em prosa (Iluminuras, 1966, terceira edição em 2004); preparou Lautréamont - Os Cantos de Maldoror, Poesias e Cartas - Obra Completa (Iluminuras, nova edição em 2005) e Uivo, Kaddish e outros poemas de Allen Ginsberg (L&PM, 1984 e reedições, nova edição de bolso de 2005). Teve lançado Poemas para leer en voz alta, editorial Andrómeda, San Jose, Costa Rica, 2007 (tradução de Eva Schnell, posfácio de Floriano Martins) e uma série de ensaios sobre poesia surrealista na coletânea Surrealismo, Perspectiva, coleção Signos, 2008. É autor de outros livros de poesia e da coletânea Escritos de Antonin Artaud, esgotados. Consta em antologias e coletâneas, brasileiras e em outros países. Seus vínculos são com a criação literária mais rebelde e transgressiva, como aquela ligada ao surrealismo e à geração beat. Ocupou cargos públicos em administração cultural. Presidiu por vários mandatos a UBE, União Brasileira de Escritores. Deu inúmeras palestras, cursos e oficinas literárias. Doutor em Letras, DLCV-FFLCH-USP, tese de doutorado defendida e aprovada em março de 2008, com o título Um Obscuro Encanto: Gnose, Gnosticismo e a Poesia Moderna. Co-edita, com Floriano Martins, agulha, www.revista.agulha.nom.br. Mais em:
cjwiller@uol.com.br
www.secrel.com.br/jpoesia/cw.html
www.triplov.com/willer/index.html
www.tvcronopios.com.br/bitniks04/
19 janeiro 2009
Horácio Costa à queima-roupa
[foto: Regina Stella]
1) O que é poesia para você?
Um registro da voz humana, a arte do vento.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Registrar a sua voz humana e colaborar com o vento.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Eliot, os Quatro Quartetos. Cada vez leio mais e mais gosto.
Foucault, História da Sexualidade. Abriu os meus olhos, que continuam wide open.
A antologia da poesia russa moderna, trad. Campos/Schnaiderman, que comprei na Praça da República aos treze anos, em pleno 1968. Sou fiel à minha história.
Horácio Costa tem 54 anos e nasceu em 1954, formou-se em Arquitetura e Urbanismo pela FAU-USP, fez mestrado e doutorado em letras em Yale, Estados Unidos, foi professor-titular da Universidad Nacional Autónoma de México-UNAM e hoje é professor da USP. Tem 23 livros publicados, distribuídos em vários países. No Brasil, tem oito livros de poesia; o último deles é Ravenalas (Selo Demônio Negro, 2008). E-mail: horaciocosta23@hotmail.com
17 janeiro 2009
Augusto de Campos à queima-roupa
[foto: Pipol]
O Soulman da poesia brasileira responde:
1) O que é poesia para você?
De preferência, a poesia dos outros. E o que é poesia?
Respondendo à pergunta “o que é música?”, Schoenberg saíu-se com esta historinha:
Um cego perguntou ao seu guia: — Como é o leite?
O outro: — O leite é branco.
O cego: — E o que é esse “branco”? Me dê um exemplo de algo que seja “branco“!
O guia: — Um cisne. Ele é totalmente branco e tem um pescoço longo e curvo.
O cego: — Pescoço curvo? Como é isso?
O guia, imitando a forma do pescoço do cisne com o braço, fez com que o cego o apalpasse.
O cego: “Ah! agora eu sei como é o leite…”
Bom, para não desanimar o leitor, dou duas definições de poesia de dois outros cegos:
Paul Valéry: “Hesitação entre o som e o sentido.”
Ezra Pound: “Uma espécie de matemática inspirada que nos dá
equações não para imagens abstratas, triângulos, esferas, etc, mas
equações para as emoções humanas.”
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Perseguir implacavelmente a si próprio. Jamais perseguir o sucesso.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Um Lance de Dados Jamais Abolirá o Acaso, de Stéphane Mallarmé.
Inaugurou a poesia do século 20 e continua a presidir o espaço poético-cyberal.
Finnegans Wake, de Joyce, panAroma das flores da fala, telescopagem vocabular, racionalidade do caos.
Os Cantos, de Pound, montagem-colagem-ideograma, estratégias básicas para a poesia de nosso tempo.
Augusto de Campos nasceu em São Paulo, em 1931. Poeta, tradutor, ensaísta, crítico de literatura e música. Em 1951, publicou o seu primeiro livro de poemas, O REI MENOS O REINO. Em 1952, com seu irmão Haroldo de Campos e Décio Pignatari, lançou a revista literária "Noigandres", origem do Grupo Noigandres que iniciou o movimento internacional da Poesia Concreta no Brasil. O segundo número da revista (1955) continha sua série de poemas em cores POETAMENOS, escritos em 1953, considerados os primeiros exemplos consistentes de poesia concreta no Brasil. O verso e a sintaxe convencional eram abandonados e as palavras rearranjadas em estruturas gráfico-espaciais, algumas vezes impressas em até seis cores diferentes, sob inspiração da Klangbarbenmelodie (melodia de timbres) de Webern. Em 1956 participou da organização da Primeira Exposição Nacional de Arte Concreta (Artes Plásticas e Poesia), no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Sua obra veio a ser incluída, posteriormente, em muitas mostras, bem como em antologias internacionais como as históricas publicações Concrete Poetry: an International Anthology, organizada por Stephen Bann (London, 1967), Concrete Poetry: a World View, por Mary Ellen Solt (University of Bloomington, Indiana, 1968), Anthology of Concrete Poetry, por Emmet Williams (NY, 1968). Sua poesia está coligida principalmente em Viva Vaia (1979, 4ª ed. 2008), Despoesia (1994) e Não (2003, 2ª ed. 2008). Últimos estudos e traduções: Poesia da Recusa (2006), Quase-Borges (2006) e Emily Dickinson: Não sou Ninguém (2008). Site: www2.uol.com.br/augustodecampos
12 janeiro 2009
Carlos Felipe Moisés à queima-roupa
No dia de meu aniversário dou-lhes de presente as generosas respostas do poeta e professor Carlos Felipe Moisés às perguntas:
1) O que é poesia para você?
No começo, aos 13-14 anos, era só uma brincadeira. No colégio onde estudei, poesia era praticamente sinônimo de “rima”, e havia uma tal de “métrica”, esse negócio de contar as sílabas, umas fortes, outras fracas, e por aí vai (ou melhor, ia). Então, eu achei divertidíssimo brincar de procurar rimas, contar as sílabas nos dedos, para ver se eu tinha um decassílabo, um alexandrino ou um redondilho. Achei, desde o começo, que isso era tão divertido quanto fazer palavras cruzadas, colecionar figurinhas, jogar bola na rua, empinar papagaio, chocar traseira de caminhão, paquerar as meninas etc. Não era nada que eu levasse a sério. E ainda bem... Nessa idade, não acho saudável levar a sério seja lá o que for. Aconteceu que, lá pelos 16-17, eu li por acaso uns poetas modernos, quer dizer, do início do século XX, e de repente descobri que a poesia é a expressão mais apurada, mais densa, mais inquietante e mais verdadeira que o ser humano é capaz de dar ao seu “sentimento do mundo”, como diz Carlos Drummond de Andrade. Passei a encarar a poesia como uma espécie de síntese superior de tudo quanto você for capaz de pensar e sentir, sobre a vida, a natureza, o amor e a morte, o destino, a amizade e assim por diante. Desde essa época, a poesia me acompanha, como uma espécie de cúmplice imprescindível. Escrever os meus poemas tem-me ajudado a ir filtrando aquilo que vale a pena ser lembrado, tem-me ajudado a ir deixando no papel umas imagens, umas cenas, umas impressões, que me dão a certeza de algo afinal tão banal, que é simplesmente estar vivo. Mas estar vivo como alguém que vai deixando o seu testemunho, e não como alguém que apenas sobrevive e vê o tempo passar. O que é poesia para mim? Começou como brincadeira, depois foi-se tornando a representação simbólica do sentido (possível) da minha existência, aquela atividade sem a qual a (minha) vida não faria sentido. E, pensando bem, nunca deixou de ser, de um modo ou de outro, uma espécie de brincadeira, embora eu nunca mais me preocupasse com as rimas e com as sílabas contadas nas pontas dos dedos.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Apesar dos vários livros publicados, alguns premiados, ou justamente por isso, não me sinto em condições de dar conselho a ninguém. Ainda que seja um “iniciante”? Ainda assim. Iniciante, na verdade, é exatamente como eu próprio me sinto, com toda a suposta “experiência” acumulada em tantos anos. Cada livro, cada poema, é aquela mesma angústia, aquela mesma dúvida dos primeiros: será que eu vou ser capaz? Será que vale a pena tentar escrever sobre isto? E, depois de escrito: será que funcionou, será que eu acertei a mão? É sempre como se eu estivesse começando tudo de novo. Com o iniciante não é assim mesmo? Conselhos eu recebi muitos, e sou grato a todos: os que eu acatei e deram certo, os que eu acatei e não deram certo, os que eu rejeitei e poderiam ter dado certo (mas eu não tenho mais como saber) e os que eu rejeitei porque eram pura besteira. O que o iniciante deve perseguir? A sua verdade. Se ainda não tem uma, vá atrás dela. Ainda que não a encontre, valerá a pena procurar. E não acredite em nenhum conselho que lhe diga (em matéria de poesia ou outra matéria qualquer): aqui está a verdade. Mais conselhos (só para confirmar que eu sou mesmo contraditório): não acredite muito em elogios, prefira sempre ficar com as críticas, se elas forem inteligentes e honestas. Com os elogios excessivos, a sua busca da verdade se interrompe, você dá um suspiro de alívio e fica achando, bestamente, que já chegou lá. Com as críticas, as boas, você cresce, você se supera, e segue em frente. Como distinguir as boas das más críticas? Ah! Só você vai ser capaz de distinguir. Por fim, por melhor que seja o poema que você acabou de escrever (na sua opinião e na de “todo mundo”), ache, sempre, que você pode escrever outro ainda melhor.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Retomando o que eu já comentei na primeira pergunta, os poetas modernos (não foram só três, mas vou ficar com “os três mais”) que me marcaram para sempre, que me ajudaram a encontrar o que talvez seja uma vocação, que me revelaram o que há de verdadeiramente humano na poesia foram: Mário de Andrade, Fernando Pessoa e Carlos Drummond de Andrade. Quando li esses poetas pela primeira vez, lá pelos 16-17 anos, a sensação foi uma só: eu tinha acabado de levar uma descomunal porrada, ao mesmo tempo na boca do estômago, no meio da cara e no fundo da alma. Minha vida, minha visão de mundo, nunca mais foram as mesmas. Então decidi: um dia eu vou escrever um poema, um só, do jeito deles, quem sabe misturando um pouco do jeito de cada um. Ainda não consegui, mas continuo tentando. Naquela idade, e depois, não tive pejo nenhum: vou imitar esses poetas. E imitei mesmo, e segui imitando, embora sempre tentando disfarçar, isto é, acrescentando à imitação alguma coisa própria. E acho (sinto) que deu mais ou menos certo: hoje não imito mais, mas não saberia dizer a partir de que momento o disfarce passou a prevalecer. Bem, os três poetas são esses, embora eu pudesse acrescentar mais alguns. Três poemas? Quer dizer, um de cada? Aí já fica mais difícil. Mas posso tentar: do Mário, a Paulicéia Desvairada, inteira, especialmente a série com o título “Paisagem” e a “Ode ao burguês”; do Pessoa, a dificuldade aumenta, mas digamos que o Alberto Caeiro e o Álvaro de Campos, inteiros, especialmente o “Há metafísica bastante em não pensar em nada”, do primeiro, e a “Tabacaria”, do segundo; do Drummond, a dificuldade é a mesma, mas vou destacar o Sentimento do mundo, A rosa do povo e o Claro enigma, inteiros, especialmente, na ordem, “Mãos dadas”, “Procura da poesia” e “A máquina do mundo”. Escolhas? A impressão que tenho, tantos anos depois, tanto tempo de convívio, é que eu não os escolhi, eles é que me escolheram. Ou o acaso se incumbiu de tudo.
Carlos Felipe Moisés nasceu em São Paulo, SP (1942). É formado em Letras pela USP, onde lecionou, assim como em várias outras universidades, no Brasil e nos Estados Unidos. Estreou em 1960, como poeta (A poliflauta), e publicou até hoje nove livros de poesia (o mais recente, Noite nula, 2008). Publicou vários livros de crítica literária (como Poética da rebeldia, 1983; O desconcerto do mundo, 2001; Poesia e utopia, 2007) e de literatura infanto-juvenil (O livro da fortuna, 1992; A deusa da minha rua, 1996; Conversa com Fernando Pessoa, 2007 – entre outros). É tradutor de Sartre (O que é a literatura?), Joseph Campbell (O poder do mito), Marshall Berman (Tudo o que é sólido), Proust (Alta traição – uma coletânea, que reúne vários poetas) etc. Desde que se aposentou pela USP(1991), coordena oficinas de criação literária, dá umas palestras de vez em quando, colabora esporadicamente na imprensa ou com editoras e dedica o tempo que sobra (pouco) a escrever. E-mail: carlos_moises@uol.com.br
09 janeiro 2009
Ricardo Silvestrin à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Um texto da função poética da linguagem. Ver o meu artigo Balanço, mas não caio. Ali, está uma explicação clara e um pouco rápida sobre essa função.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Deve ler boa poesia e bons ensaios a respeito do tema poesia (Roman Jakobson e as funções da linguagem, Haroldo de Campo em A Arte no Horizonte do Provável, Décio Pignatari em Comunicação Poética, Otávio Paz no Signos em Rotação...). Ou seja, deve se ocupar de ler bons poetas para ver o fazer dos outros e também se ocupar do pensar sobre a arte da poesia, tanto sozinho como acompanhado pelos bons pensadores/poetas/críticos. Também conta fazer cursos e/ou oficinas com bons poetas. Tudo isso para perseguir a criação de, primeiro, um bom poema. Depois, um bom poema que tenha as contribuições pessoais à contemporaneidade e, por último, se conseguir, alguma contribuição à história do gênero poético.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Fiz três trios:
Bandeira/Drummond/Quintana – esse trio foi o primeiro time que me fez entender o que é um bom poema. Comecei a escrever depois que li o Bandeira. Até hoje, ele é o poeta que mais encanta. Equilibra invenção, idéia e sensibilidade. Uma boa leitura é essa dos 50 poemas escolhidos, seleção feita por ele, reeditada recentemente pela Cosac Naify.
Chacal/Leminski/Alice Ruiz – esse foi o segundo trio que me reabriu a cabeça. Com eles, encontrei uma linguagem mais próxima da minha geração e da minha visão de mundo. Ler o Belvedere, reunião da poesia do Chacal, lançada pela Cosac, 2 em 1 com os dois livros Pelos Pelos e Vice-versos da Alice, lançado recentemente pela Iluminuras, e Caprichos e Relaxos, Distraídos Venceremos... e tudo o que achar do Leminski. Valem também os ensaios do Leminski, as biografias que ele escreveu de Bashô, Cruz e Souza...
Augusto/Haroldo/Décio – esse trio chuta a bola para outros campos, amplia a cabeça de qualquer poeta. Ler Viva Vaia do Augusto, Não, Despoesia, todos do Augusto – Poetc., Poesia, pois é poesia, do Décio, A educação dos 5 sentidos, do Haroldo. E também tudo o que eles lançaram de teoria e tradução.
E sobram ainda os simbolistas, com o quarteto Rimbaud/Mallarmé/Verlaine/Baudelaire, sobram Marcial, Bashô, Issa, Ferreira Gullar, Cabral, Emily Dinckinson, Benedetti, Borges...
Ricardo Silvestrin é autor dos livros de poesia O menos vendido, ex-Peri,mental, Palavra mágica, Quase eu, Bashô um santo em mim e Viagem dos olhos, além dos infantis O baú do Gogó, Pequenas observações sobre a vida em outros planetas, É tudo invenção, Mmmmonstros! e Transpoemas. Lançou em 2008 o livro de contos Play. Integra o grupo musical os poETs. É editor da ameopoema. Recebeu por 3 vezes o Prêmio Açorianos de Literatura. Assina uma coluna no Segundo Caderno do jornal Zero Hora. Apresenta o programa Transmissão de Pensamento na Rádio Ipanema FM. Site: www.ricardosilvestrin.com.br E-mail: silvestrin@uol.com.br
08 janeiro 2009
Essa moça tem o duende!
A endiabrada Mathilda Kóvak me indicou este vídeo e eu só tenho que concordar: a moça é demais. Uma judiazinha que incorpora toda a negritude em sua voz e parece que vai terminar como uma Billie Holiday contemporânea. Como disse o arguto Augusto de Campos sobre a Joss Stone: a moça tem o duende.
07 janeiro 2009
Nicolas Behr à queima-roupa
[foto: Juan Pratginest]
Três perguntas para poetas
Estou fazendo um inquérito quase policial com os principais poetas em atividade, sejam novos, novíssimos, ou já tarimbados e carimbados pelo tempo ou pelo (des)reconhecimento.
As perguntinhas são só três, pois é um numero que deixa as coisas em aberto e incitam o movimento, o seguir adiante – diferentemente do dois e do quatro. São básicas, mas nem por isso menos espinhosas. Alguns poetas já reagiram a elas. A primeira é considerada quase ofensiva para alguns. Se muitos responderem poderemos ter, provavelmente, um vasto apanhado de idéias e de fazeres que nos farão pensar e repensar, pois uma das características da poesia moderna (e da pós-moderna, se ela existir...) é a imensa variedade de perspectivas e de fazeres.
Nicolas Behr responde:
1) O que é poesia para você?
POESIA É TUDO O QUE VOCE ESTÁ SENTINDO AGORA.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
UM CONSELHO: LER MUITO, ESCREVER MUITO E RASGAR MUITO.
SÓ PUBLICAR (EDIÇAO DE AUTOR) QUANDO ESTIVER BEM SEGURO. CORAGEM É MAIS IMPORTANTE QUE CRIATIVIDADE. POESIA EM BLOG VOCE APAGA, EM LIVRO NÃO. LIVRO É MAIS IMPORTANTE QUE BLOG.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
POEMA EM LINHA RETA, DE FERNANDO PESSOA. OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO, DE DRUMMOND E QUEM FAZ UM POEMA ABRE UMA JANELA, DE MARIO QUINTANA. SÃO OS UNICOS POEMAS QUE EU SEI DE COR.
Nicolas Behr (Nikolaus Von Behr) nasceu em Cuiabá, em 1958. Queria ser geólogo e mora em Brasília desde 1974. Em 1977, lançou seu best seller “Iogurte com Farinhas”, em mimeógrafo. Em agosto de 1978, após ter escrito “Grande Circular”, “Caroço de Goiaba” e “Chá com Porrada” foi preso e processado pelo DOPS por “porte de material pornográfico”, sendo julgado e absolvido. Trabalhou como redator de publicidade e, posteriormente, na Fundação Pró-Natureza. Dedicou-se, profissionalmente, a produção de mudas de espécies nativas do cerrado. A partir de 1993, voltou a publicar seus livros de poesia, com “Porque Construí Braxília”. É sócio-proprietário da Pau-Brasília Viveiro Eco.loja. Mantém o site WWW.nicolasbehr.com.br, e-mail: paubrasilia@paubrasilia.com.br . Você pode conferir, também, uma seleta de seu novo trabalho em www.cronopios.com.br/site/poesia.asp?id=3715
05 janeiro 2009
04 janeiro 2009
revelação
tenho uma certeza
uma epifania pessoal
- quase religiosa -
o caminho que escolhi é o melhor
- entre os caminhos -
é o melhor, pois foi o que escolhi.
tenha uma certeza
apesar da convicção que me anima
- quase fanática -
não estou disposto a enforcar
ninguém, por não compartilhar
de meu júbilo
de minha sina solitária.
uma epifania pessoal
- quase religiosa -
o caminho que escolhi é o melhor
- entre os caminhos -
é o melhor, pois foi o que escolhi.
tenha uma certeza
apesar da convicção que me anima
- quase fanática -
não estou disposto a enforcar
ninguém, por não compartilhar
de meu júbilo
de minha sina solitária.
03 janeiro 2009
Cage
som é onda
os corpos vibram
as vibrações exalam
nossos ouvidos captam
o cérebro interpreta
o coração cala
a audição foi a última
a consciência veio antes
as emoções antes ainda
o átomo é partícula
em outras tira onda
dança em nossa retina
não há som sem pausa
como é certo o silêncio
máxima que nos extingue
ou nos distingue
26 dezembro 2008
23 dezembro 2008
04 dezembro 2008
Dona Aranha
Hoje eu tropecei pela primeira vez na dona aranha. É assim que meu pai a chama. Ele é muito respeitoso com as aranhas. Diz que elas são damas do reino animal e que algumas se tornam, depois, viúvas negras e alegres. Não entendi direito, mas rimos um bocado. Meu pai sempre me enche de pipoca para que eu assista o filme do homem-aranha com ele. Eu tenho medo de aranha, pai, digo, mas ele não me ouve. Repara no uniforme dele, insiste.
Realmente, a roupa do homem-aranha é bem bacana. Meu amiguinho José já foi com ela para a escolinha. Não queriam deixar ele entrar, pois só nas segundas-feiras é que podemos levar brinquedos, mas não vir vestido de brinquedo. O José não entendeu, chorou, esperneou e acabou conseguindo, ficou o dia todo sendo o próprio homem-aranha. Se bem que no meio da tarde ele já estava todo molhado. Acho que ser o homem-aranha deve ser muito cansativo.
Mas a aranha que eu esbarrei é menina e tem muitas perninhas. Eu pensava que elas tinham muitas perninhas para piscar a gente mais vezes. Meu pai fez uma careta e disse “ah, picar, você quer dizer... mas não é bem assim”. As perninhas eram para se segurar e correr mais rápido. Assim como as baratas. Arrgh. Não vamos falar delas agora não, pai. Que nojo! Mamãe, o papai está falando de baratas!
Ufa, meu pai mudou de assunto. Ele está dizendo que todos os miúdos têm algo muito precioso que é a vida. Hum... Miúdos é como ele chama tudo que é pequeno, bebês, plantinha, bichinhos e até eu que já não sou mais um bebê. Aliás, minha mãe perguntou outro dia se eu gostaria de ter um miudinho. Ela queria dizer um irmãozinho. Ah, seria bom mais um miúdo nesta casa.
Mas papai, a dona aranha tem outra coisa bem preciosa? Não sabe? É que eu acabei de esmagar aquele algo muito preciso da dona aranha. E todas as suas perninhas. Foi sem querer, papai!
[Meu primeiro texto infantil, que fará parte do livro MIÚDOS, histórias de gente e seres miúdos, tudo do ponto de vista de uma menina politicamente quase incorreta]
18 novembro 2008
Distâncias
Leitura de distância from virna teixeira on Vimeo.
[Apresentação da versão em espanhol do livro Distancia (lunarena editorial, 2007) pela poeta Virna Teixeira e os tradutores Berenice Huerta e Jair Cortés. Jornadas Lopezvelardeanas. Zacatecas, México, junho de 2008.]
Sopa de Poesia
Gustavo Felicíssimo - O que o contato com a música traz de relevante para a sua poesia?
Edson Cruz – O contato com a música para mim foi a própria abertura para a poesia e para a vida. Com ela (a música) apurei meus sentidos, meu ouvido, minha sensibilidade em relação às palavras e aos sentidos. Como já disse Shakespeare em O mercador de Veneza, “Todo homem que em si não traga música... É de traições, pilhagens, armadilhas. ... Não se confie em homem tal...”.
Por outro lado, embora saibamos que o isomorfismo entre o som e o signo tenha limites, não podemos desconsiderar o fato de que a própria comunicação através de palavras começou com onomatopéias, gestos vocais imitando a natureza das coisas, etc.
O psicólogo Wolfgang Köhler fez aquela famosa experiência para descobrir se ocorria para as pessoas uma ligação entre algumas formas visuais e certos sons. Inventou as palavras “takete” e “maluma”, que são foneticamente opostas, e apresentou-as a indivíduos de línguas diferentes com duas figuras geometricamente opostas. Uma figura era angulosa (parecia uma estrela), a outra curvilínea (como círculos concêntricos). A pergunta fatal era: qual das figuras poderia ser chamada “takete” e qual “maluma”? A maior parte das pessoas inquiridas (embora falassem línguas totalmente diferentes) associou a palavra “takete” à figura angulosa, estrelada e “maluma” à figura curvilínea. Coincidência? Não, de forma (de som) alguma (algum).
O que eu quero dizer com isso? Simples. A musicalidade é tudo em poesia. Se não houver ritmo, sonoridades encantatórias permeando o texto poético, poderá até haver tema, discurso, sentido, mas sempre faltará alguma coisa, a música, que para mim tende ao essencial. Isso não quer dizer que precisemos, necessariamente, de rimas.
Aquelas categorias aventadas por Ezra Pound são importantes: o enfoque nas imagens (a fanopéia), nas idéias (a logopéia) e nos sons (a melopéia). Um poema que permanecerá, em minha opinião, deverá ter os três elementos dialogando entre si. Mas há grandes poemas que privilegiam aspectos de um dos três enfoques. Agora, o poema pode até não contemplar as imagens, ou as idéias, mas, para mim, se não tiver melopéia, meu ser simplesmente o rejeita. É instintivo.
Isso, que não é nenhuma novidade desde os gregos, foi a maior influência que a música teve sobre mim e sobre a minha poesia — se é que eu a tenho.
GF – Você vê o poeta como um ser deslocado perante a sociedade prática em que vivemos?
EC – De certa forma isso já se tornou um clichê, e também deve ser combatido, como todos os clichês. O poeta, e todos os seres criativos, terão que desenvolver as habilidades necessárias para interferir e alterar o estado das coisas, gerado pelas pessoas que se dizem práticas e pragmáticas. Ele não deve aceitar passivamente ser colocado (ou colocar-se, o que é pior...) de escanteio no jogo da vida com a desculpa de que não sabe lidar com as coisas práticas do mundo. O poema de Baudelaire O Albatroz é lindo. Constata uma verdade que se relacionava ao mundo romântico.
...O Poeta se compara ao príncipe da altura [ao Albatroz] / Que habita os vendavais e ri da seta no ar; / Exilado no chão, em meio à turba obscura, / As asas de gigante impedem-no de andar. [em tradução de Ivan Junqueira]
É uma verdade relativa que não nos cabe mais. O mundo precisa ser transformado e não será com uma atitude “canhestra e envergonhada”, digna de um monarca em meio à turba obscura, que faremos a diferença.
É justamente por estarmos nessa sociedade pragmática, egoísta e desumana, que o poeta deve recolocar-se com voz e atitude dignas. Com consistência do princípio ao fim. Levar o potencial revolucionário da poesia para as coisas práticas da vida.
GF – Que sentido você atribui a esses seus versos: “o que não sei/ eu intuo/ o que sei/ é entulho”?
EC – Esse é um dos grandes trunfos/triunfos da poesia. Poder dizer em poucas palavras, com certa graça, o que de outra forma seria necessário um tratado, uma tese, uma dissertação. E há, com certeza, inúmeros textos, tanto na tradição oriental quanto na ocidental, que buscam esclarecer o que tento dizer com estes quatros versos: o excesso de conhecimento, de informação, não é sabedoria. Esse acúmulo de pretensos saberes, nas horas cruciais podem muitas vezes atrapalhar, mais do que ajudar. A intuição é o que nos salva, se ela não for completamente obliterada pela pretensa erudição.
Na hora em que você for atacado por uma onça, ou estiver na iminência de ser atropelado, ou de se apaixonar, se parar para pensar, já era. E muitos já foram salvos (ou criaram coisas novas, inovaram, atingiram a iluminação, acertaram na mega-sena, conquistam o amor) justamente porque deixaram a massa de informação de lado e permitiram que outra coisa atuasse. É como se deixar levar pela música. Não dá pra pensar muito em qual seria o próximo passo. Tem que se entregar e, de repente, surge uma estrela cintilante, um gesto, um passo jamais realizado, o poema, a dança, a saída, a resolução do problema, a beleza, enfim, a vida.
[Publicado no blog de Gustavo Felicíssimo, http://sopadepoesia.zip.net/]
Edson Cruz – O contato com a música para mim foi a própria abertura para a poesia e para a vida. Com ela (a música) apurei meus sentidos, meu ouvido, minha sensibilidade em relação às palavras e aos sentidos. Como já disse Shakespeare em O mercador de Veneza, “Todo homem que em si não traga música... É de traições, pilhagens, armadilhas. ... Não se confie em homem tal...”.
Por outro lado, embora saibamos que o isomorfismo entre o som e o signo tenha limites, não podemos desconsiderar o fato de que a própria comunicação através de palavras começou com onomatopéias, gestos vocais imitando a natureza das coisas, etc.
O psicólogo Wolfgang Köhler fez aquela famosa experiência para descobrir se ocorria para as pessoas uma ligação entre algumas formas visuais e certos sons. Inventou as palavras “takete” e “maluma”, que são foneticamente opostas, e apresentou-as a indivíduos de línguas diferentes com duas figuras geometricamente opostas. Uma figura era angulosa (parecia uma estrela), a outra curvilínea (como círculos concêntricos). A pergunta fatal era: qual das figuras poderia ser chamada “takete” e qual “maluma”? A maior parte das pessoas inquiridas (embora falassem línguas totalmente diferentes) associou a palavra “takete” à figura angulosa, estrelada e “maluma” à figura curvilínea. Coincidência? Não, de forma (de som) alguma (algum).
O que eu quero dizer com isso? Simples. A musicalidade é tudo em poesia. Se não houver ritmo, sonoridades encantatórias permeando o texto poético, poderá até haver tema, discurso, sentido, mas sempre faltará alguma coisa, a música, que para mim tende ao essencial. Isso não quer dizer que precisemos, necessariamente, de rimas.
Aquelas categorias aventadas por Ezra Pound são importantes: o enfoque nas imagens (a fanopéia), nas idéias (a logopéia) e nos sons (a melopéia). Um poema que permanecerá, em minha opinião, deverá ter os três elementos dialogando entre si. Mas há grandes poemas que privilegiam aspectos de um dos três enfoques. Agora, o poema pode até não contemplar as imagens, ou as idéias, mas, para mim, se não tiver melopéia, meu ser simplesmente o rejeita. É instintivo.
Isso, que não é nenhuma novidade desde os gregos, foi a maior influência que a música teve sobre mim e sobre a minha poesia — se é que eu a tenho.
GF – Você vê o poeta como um ser deslocado perante a sociedade prática em que vivemos?
EC – De certa forma isso já se tornou um clichê, e também deve ser combatido, como todos os clichês. O poeta, e todos os seres criativos, terão que desenvolver as habilidades necessárias para interferir e alterar o estado das coisas, gerado pelas pessoas que se dizem práticas e pragmáticas. Ele não deve aceitar passivamente ser colocado (ou colocar-se, o que é pior...) de escanteio no jogo da vida com a desculpa de que não sabe lidar com as coisas práticas do mundo. O poema de Baudelaire O Albatroz é lindo. Constata uma verdade que se relacionava ao mundo romântico.
...O Poeta se compara ao príncipe da altura [ao Albatroz] / Que habita os vendavais e ri da seta no ar; / Exilado no chão, em meio à turba obscura, / As asas de gigante impedem-no de andar. [em tradução de Ivan Junqueira]
É uma verdade relativa que não nos cabe mais. O mundo precisa ser transformado e não será com uma atitude “canhestra e envergonhada”, digna de um monarca em meio à turba obscura, que faremos a diferença.
É justamente por estarmos nessa sociedade pragmática, egoísta e desumana, que o poeta deve recolocar-se com voz e atitude dignas. Com consistência do princípio ao fim. Levar o potencial revolucionário da poesia para as coisas práticas da vida.
GF – Que sentido você atribui a esses seus versos: “o que não sei/ eu intuo/ o que sei/ é entulho”?
EC – Esse é um dos grandes trunfos/triunfos da poesia. Poder dizer em poucas palavras, com certa graça, o que de outra forma seria necessário um tratado, uma tese, uma dissertação. E há, com certeza, inúmeros textos, tanto na tradição oriental quanto na ocidental, que buscam esclarecer o que tento dizer com estes quatros versos: o excesso de conhecimento, de informação, não é sabedoria. Esse acúmulo de pretensos saberes, nas horas cruciais podem muitas vezes atrapalhar, mais do que ajudar. A intuição é o que nos salva, se ela não for completamente obliterada pela pretensa erudição.
Na hora em que você for atacado por uma onça, ou estiver na iminência de ser atropelado, ou de se apaixonar, se parar para pensar, já era. E muitos já foram salvos (ou criaram coisas novas, inovaram, atingiram a iluminação, acertaram na mega-sena, conquistam o amor) justamente porque deixaram a massa de informação de lado e permitiram que outra coisa atuasse. É como se deixar levar pela música. Não dá pra pensar muito em qual seria o próximo passo. Tem que se entregar e, de repente, surge uma estrela cintilante, um gesto, um passo jamais realizado, o poema, a dança, a saída, a resolução do problema, a beleza, enfim, a vida.
[Publicado no blog de Gustavo Felicíssimo, http://sopadepoesia.zip.net/]
16 novembro 2008
Viajes
Cuando los famas salen de viaje, sus costumbres al pernoctar en una ciudad son las siguientes: Un fama va al hotel y averigua cautelosamente los precios, la calidad de las sábanas y el color de las alfombras. El segundo se traslada a la comisaría y labra un acta declarando los muebles e inmuebles de los tres, así como el inventario del contenido de sus valijas. El tercer fama va al hospital y copia las listas de los médicos de guardia y sus especialidades.
Terminadas estas diligencias, los viajeros se reúnen en la plaza mayor de la ciudad, se comunican sus observaciones, y entran en el café a beber un aperitivo. Pero antes se toman de las manos y danzan en ronda. Esta danza recibe el nombre de "Alegría de los famas".
Cuando los cronopios van de viaje, encuentran los hoteles llenos, los trenes ya se han marchado, llueve a gritos, y los taxis no quieren llevarlos o les cobran precios altísimos. Los cronopios no se desaniman porque creen firmemente que estas cosas les ocurren a todos, y a la hora de dormir se dicen unos a otros: "La hermosa ciudad, la hermosísima ciudad". Y sueñan toda la noche que en la ciudad hay grandes fiestas y que ellos están invitados. Al otro día se levantan contentísimos, y así es como viajan los cronopios.
Las esperanzas, sedentarias, se dejan viajar por las cosas y los hombres, y son como las estatuas que hay que ir a verlas porque ellas ni se molestan.
[Do livro Historias de Cronopios y de Famas, de Julio Cortázar]
Terminadas estas diligencias, los viajeros se reúnen en la plaza mayor de la ciudad, se comunican sus observaciones, y entran en el café a beber un aperitivo. Pero antes se toman de las manos y danzan en ronda. Esta danza recibe el nombre de "Alegría de los famas".
Cuando los cronopios van de viaje, encuentran los hoteles llenos, los trenes ya se han marchado, llueve a gritos, y los taxis no quieren llevarlos o les cobran precios altísimos. Los cronopios no se desaniman porque creen firmemente que estas cosas les ocurren a todos, y a la hora de dormir se dicen unos a otros: "La hermosa ciudad, la hermosísima ciudad". Y sueñan toda la noche que en la ciudad hay grandes fiestas y que ellos están invitados. Al otro día se levantan contentísimos, y así es como viajan los cronopios.
Las esperanzas, sedentarias, se dejan viajar por las cosas y los hombres, y son como las estatuas que hay que ir a verlas porque ellas ni se molestan.
[Do livro Historias de Cronopios y de Famas, de Julio Cortázar]
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