30 maio 2009
BlablaBlogue <=> Blooks
Tinha que ser o Nelson de Oliveira. O cara sai na frente mais uma vez mostrando um apanhado de textos literários que circulam febrilmente na net. Tudo isso, a partir de logo mais, no suporte livro de papel. De pijama ou sem pijama, o que importa é o texto e o se o cara que batuca no teclado tem o que dizer e sabe como fazê-lo.
De certa forma a exposição no Sesc Pinheiros, com curadoria de Heloisa Buarque de Hollanda, a tal de BLOOKS, diáloga com este lançamento do Nelson e da Terracota Editora. Seria um outro bom nome para a antologia. A síntese de livro+blogue=BLOOKS. Voltarei ao assunto da exposição, depois.
27 maio 2009
João Miguel Henriques à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
A poesia foi sendo para mim coisas diferentes ao longo dos anos. Mas algo que nunca deixou de ser é esse trabalho da memória sobre a linguagem. Ou será que é a linguagem que trabalha sobre a memória? É por vezes difícil distinguir...
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Dar conselhos não é de facto o meu forte, mas creio que um iniciante deve acima de tudo procurar alguma pureza. Dedicar-se ao labor da poesia sem se preocupar muito com publicações ou reconhecimento público. Não deixar-se contaminar pelas instituições da cultura. E nesse trabalho poético puro, não deve também descurar uma certa consciência do percurso histórico da própria poesia. Julgo que era T.S. Eliot quem afirmava que sem esse sentido histórico nenhum poeta poderia continuar a escrever após os vinte e cinco anos de idade.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Não sei se os que vou citar são textos referenciais, mas fazem seguramente parte das minha predilecções mais ou menos constantes. O Livro de Cesário Verde, de Cesário Verde, pela linguagem trabalhada, pelo requinte formal e pelas visões da cidade; Na Terra e no Inferno, de Thomas Bernhard, pelo exercício da memória acompanhado de um belíssimo sentido trágico da existência; e A Musa Irregular, reunião da poesia de Fernando Assis Pacheco, um poeta infelizmente não muito conhecido fora de Portugal, mas que tem poemas de amor extraordinários e um admirável sentido de equilíbrio entre o coloquial e o mais lírico ou erudito.
João Miguel Henriques nasceu em Cascais em 1978. Estudou Literatura em Lisboa, Jena (Alemanha) e Edimburgo (Escócia). Vive e trabalha em Lisboa. Estreou-se em poesia com o livro O Sopro da Tartaruga (Edição do Autor, 2005) e em 2007 participou no Tordesilhas, Festival Ibero-Americano de Poesia Contemporânea. Publicou também um conjunto de poemas no nº 12 da revista DiVersos e em publicações online como a Zunái ou a sèrieAlfa. Desde finais de 2003 que mantém o blogue Quartos Escuros (www.quartosescuros.blogspot.com).
23 maio 2009
Glauco Mattoso à queima-roupa
1. O que é poesia para você?
Já dei várias respostas a essa pergunta, mas acho que a melhor foi aquela que usei numa oficina que ministrei na Casa das Rosas: a poesia é uma metralhadora na mão dum palhaço. Seu poder de fogo pode ser apenas intencional, e seu efeito apenas hilário, mas o franco-atirador, ao expor-se em sua ridícula revolta, no mínimo consegue provocar alguma reação, ainda que meramente divertindo o público, e alguma reflexão sobre o papel patético dos idealistas e visionários, que, no fundo, somos todos nós.
2. O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Depende justamente da concepção poética que ele adotou. No meu caso, trata-se de vomitar algo visceral, de me expor, me devassar e desabafar uma biografia excêntrica para me identificar com outros excêntricos e tirar, dessa diversidade de individualidades, o traço de humanidade que nos une, isto é, o sofrimento e a revolta contra as opressões e repressões. Uma das "missões" do poeta - mas não a única - é ser porta-voz dos perseguidos, injustiçados, excluídos, rejeitados e humilhados, ainda que tais angústias sejam meramente sentimentais ou emocionais - frustrações amorosas, por exemplo. Voltando à questão do iniciante, eu recomendaria três coisas: primeiro, muita leitura, poesia de várias épocas e estilos, para estabelecer preferências e simpatias; segundo, fidelidade à própria biografia, nada de fingir demais, ainda que o poeta seja um fingidor, como dizia Pessoa; terceiro, estudar versificação, mesmo que o cara não pretenda fazer poesia rimada nem metrificada. Assim, ele estará minimamente instrumentado para o "ofício".
3. Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Isso é sempre muito pessoal e intransferível, mas vamos lá. Gregório de Matos, por ser pioneiro na nossa história e por ter praticado duas coisas que utilizo: os jogos verbais barrocos (antíteses, paradoxos, paronomásias, paródias, trocadilhos) e sátira desbocada (inclusive enveredando pelo fescenino); Bocage, por duas características que adotei: apuro formal do soneto e deboche obsceno; Bandeira, por uma única e fundamental razão: provar que é perfeitamente possível praticar todas as modalidades poéticas, desde o verso mais ritmado e rimado até o experimentalismo mais iconoclasta e anárquico, sem perder de vista o lado humano, confessional e emocional. Quanto aos textos referenciais, sugiro, primeiro, "Os Lusíadas", não para ler de cabo a rabo, mas para passear nele, viajar no ritmo, ir se acostumando a discorrer, raciocinar metrificando, pensar em decassílabo; segundo, "Eu", de Augusto dos Anjos, para, ao contrário dos "Lusíadas", percorrer, num único e curto livrinho, toda a obra duma vida, o que nos dá noção de que o poder de síntese pode ser essencial e suficiente; terceiro, "Poesia completa e prosa", a obra reunida do Manuel Bandeira, que tenho em papel-bíblia mas que existe em diferentes edições, incluindo o "Itinerário de Pasárgada", roteiro autobiográfico-intelectual, e a "Apresentação da poesia brasileira", que, embora incompleta e parcial, dá uma visão panorâmica.
Glauco Mattoso (paulistano de 1951) é um dos mais radicais representantes da ficção erótica e da poesia fescenina em língua portuguesa, descendente direto de Gregório, Bocage e, em prosa, de Sade e Masoch. Na década de 1980, celebrizou-se entre a "marginália" literária como autor do fanzine anarco-poético "Jornal Dobrabil" e do romance fetichista "Manual do podólatra amador" (reeditados, vinte anos depois, respectivamente pela Iluminuras e pela Casa do Psicólogo); após perder a visão, já na década de 1990, publicou mais de vinte volumes de poesia (entre os quais a antologia "Poesia digesta: 1974-2004", pela Landy), além do romance paródico "A planta da donzela" (editado pela Lamparina), que revisita "A pata da gazela" de Alencar. Adepto fervoroso da glosa decimal e do soneto clássico, destaca-se também como lexicógrafo no bilíngüe "Dicionarinho do palavrão" (pela Record) e como esticólogo numa "Teoria do soneto" e num tratado de versificação, "O sexo do verso: machismo e feminismo na regra da poesia", a sair em livro. Colaborador nas mídias impressa e virtual, assina colunas na revista "Caros Amigos" e no portal "Cronópios", entre outros veículos. Como letrista, tem sido musicado por nomes singulares do porte de Arnaldo Antunes, Itamar Assumpção, Falcão, Ayrton Mugnaini e outros experimentalistas independentes ou irreverentes. Seus livros mais recentes vêm saindo pela Dix Editorial (da Annablume), na série "Mattosiana", entre os quais uma história do rock e uma pesquisa do cancioneiro popular brasileiro, tudo em forma de soneto. Eis os endereços e contatos:
www.annablume.com.br
http://glaucomattoso.sites.uol.com.br
E-mail: glaucomattoso@uol.com.br
22 maio 2009
Ney Ferraz à queima-roupa
1. O que é a poesia para você?
Nunca tive como saber o que é a poesia. Para o poeta ela é uma estranha proximidade. Uma força anônima. Como poeta e como leitor sei que a poesia é muito rara. Tarda a acontecer. Abre-se o livro e é tão difícil encontrá-la ali. Mas se ela se manifesta, encontramos o poeta. Há um abismo que só faz crescer entre quem escreve e a poesia. Houve um tempo em que o poeta escrevia municiado pelos tratados de poética. Outro, em que ter uma máquina de escrever era ser criminoso. Hoje, a tecnologia governa a nossa vida. Mas nem por isso é mais fácil. Tanto que cada vez mais parece que ser poeta é um ofício antiquado. Inútil. Menosprezado. O poeta sumiu do assim chamado “discurso público”. E a poesia talvez já seja outra coisa que mais uma vez nos escapa.
2. O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Fazer coisas em desuso. Ler, observar, anotar, sair à rua. Ir ao encontro dos seus espectros. Surpreendentemente foi Vinícius de Moraes e não João Cabral de Melo Neto que viveu como poeta. A poesia tem também as suas leis e regras difíceis de serem perscrutadas. O poeta deve estar atento. Escolher. Fugir. Ir em frente. Sem que nada disso deixe de ser um recolhimento. Arder, arder, arder como um fogo de artifício, como diz Jack Kerouac.
3. Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Ana Cristina Cesar. Eu havia saído da universidade, início dos anos 1990, e dei de cara com ela numa livraria em Belém. Não era suicídio sobre a relva, título do meu primeiro livro publicado em 2000, é um conhecido verso dela. Depois veio meu encontro com Max Martins. Muitos papos. Muitas leituras. Redescobri Henry Miller. Lawrence Ferlinghetti. Os poetas beats. Paulo Plínio Abreu, Robert Stock, Mário Faustino. Nesse início dos anos 1990 inaugurou-se em Belém a Casa da Linguagem. Foram tempos agitados. Lá tínhamos a liberdade que o curso de letras da universidade não podia oferecer. O Max Martins dirigia a Casa da Linguagem. Tudo era misturado ali. Um Caldeirão. Vicente Franz Cecim. Benilton Cruz. Antônio Moura. Sérgio Wax. Uma sensibilidade sismográfica. Bem, não tem como ser três, o poeta é sempre cercado por uma legião. Outros autores e outros textos vieram e foram se impondo. Jorge Luis Borges, Herman Melville, Sylvia Plath, Thomas Bernhard, Blanchot. Mais recentemente descobri a poesia estonteante e sem rumo de Luís Serguilha, em suas Embarcações. Como poeta nada mais surpreendente que achar um autor e seu texto – é sempre deles que posso partir.
Ney Ferraz Paiva nasceu em Belém em 1962. Publicou dois livros pela Fundação de Cultura Cidade de Recife, como resultado do Prêmio Eugênio Coimbra Júnior: Não era suicídio sobre a relva (2000) e Nave do Nada (2004). Prepara o terceiro, Val-de-cães, para ser lançado este ano pela Pazulin. Reside em Palmas, Tocantins. E-mail: neyferrazpaiva@gmail.com
19 maio 2009
12 maio 2009
08 maio 2009
Minuto
Minuto de Augusto de Campos - videoPoema de Mardônio França [poeta multimeios]
Email - mardfranca@gmail.com
www - www.corsario.art.br
03 maio 2009
Ivaldo Ribeiro Filho à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Não possuo uma definição de poesia, mas lembro que Paulo Leminski enumerou mais de quinze definições de poesia. São tantas e tão variadas, geralmente dando relevo a algum aspecto, deixando os demais de fora, que não ouso.
Mesmo assim, adoro que estejam procurando estas definições. Valery, Jakobson, os românticos, os concretos procuraram uma definição para poesia. Com eles, algo se transformou e isso é ótimo.
Por enquanto, basta-me escrever.
Mas se fosse dar uma definição de poesia, por acaso não seria a definição da poesia que faço?
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Não sei o que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira, mas sei contar o meu caminho. Quando a necessidade de escrever poemas surgiu, procurei ler os autores do Modernismo, visto serem os mais divulgados e os que apareciam nos livros da escola.
Depois, passei a comprar revistas literárias e a passear pelos sites literários, na internet. Se alguém dizia que algum autor era importante, eu comprava o livro e ia ler aquele autor até saber por que ele era importante.
No começo foi difícil: alguns autores eram sentimentais demais e outros herméticos em demasia. Mesmo com estas dificuldades, continuei a ler.
Então, chegou o dia em que passei a ler os autores contemporâneos, visto que amigos, também apreciadores de poesia, me apresentavam esses autores. Aos poucos, fui encontrando o meu caminho.
Como não tenho formação em letras, nem em filosofia, passei a ler estes assuntos e isso muito me ajudou.
Após ter publicado o primeiro livro, continuei os estudos lendo livros direcionados à escrita, fiz cursos, mini-cursos, participei de eventos em universidades, continuei vasculhando textos pela internet, fui a centros culturais e aprendi um pouquinho de cinema, dança, teatro, fotografia, artes plásticas, música e a ver relação da literatura com essas outras linguagens.
Infelizmente, não fiz parte de oficinas literárias, visto não existir nenhuma em Fortaleza ou Teresina. No entanto, creio que muito me ajudariam.
Ainda hoje acompanho o que está sendo publicado, viajo em sites de universidades e busco entender as discussões em torno da literatura, o que os escritores dizem. Aliás, gosto, principalmente, de escutar o que eles têm a dizer.
Quase esqueço de falar que, no início, eu mostrava os meus textos a um amigo que estudava letras. Um grande amigo, o Marcelo Magalhães, que possuía uma paciência enorme comigo.
Quase esqueço de contar que eu possuía uma turma que me emprestava livros, discutia literatura comigo, a quem, mais tarde também mostrei meus textos. São poetas inteligentes e sensíveis, a quem eu dava a liberdade de dizerem quando não gostassem de um texto meu. Júlio Lira, Eduardo Jorge, Diego Vinhas, Eli Castro, Rodrigo Magalhães.
Era difícil escutar de alguém que não gostou de um poema meu, mas eu cresci muito com isso. O mais interessante é que nós, da turma, seguimos caminhos diferentes e que nossas maneiras de ver a poesia nunca foram iguais, mas que, mesmo assim, sempre nos respeitamos bastante.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Publiquei quatro livros e eles são tão distintos entre si que parecem não terem sido escritos pela mesma pessoa. Apesar disso, são meus e eu os adoro. Digo isso, porque eu me encontro em uma situação em que meus textos talvez não formem um conjunto. Tenho procurado trilhar sempre um novo caminho e me sinto já uma pessoa multifacetada.
O meu livro Cruviana, por exemplo, traz uma temática nordestina que destoa de tudo o que é produzido nos grandes centros, como São Paulo e Rio. É por isso que me pergunto sobre quais autores me influenciaram e que foram referenciais para o meu trabalho.
Leio os autores brasileiros da década de 90 para cá, principalmente. Sinto atração por certa poesia americana do século vinte como William Carlos Williams e Robert Creeley. Quanto aos modernistas, prefiro Drummond, Bandeira e Murilo Mendes.
Gosto de ler autores inventivos, experimentais e que trabalhem a linguagem. No entanto, acredito que nem as obras destes autores, muito menos eles, se reconheçam como referenciais ao meu trabalho.
Ivaldo Ribeiro Filho. Nasci em Picos, Piauí, em 1974. Como meu pai era bancário, morei em várias cidades do interior do nordeste, durante a infância. A maior parte no Ceará. Residi durante dezoito anos em Fortaleza, e moro pela segunda vez em Teresina, onde estou desde 2006.
Sou graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará e tio da Marina.
Publiquei quatro livros: "O Chão Visitado" (2003), "No Intuito de Nenhuma via" (2005), "Cruviana" (2005) e "Quebranto" (2007). Publiquei a reunião "Poesia até Agora" (2007) e participei de três antologias.
Estive na Bienal Internacional do Livro do Ceará de 2006, no Primeiro Encontro de Revistas Literárias do Brasil, como debatedor.
Escrevi artigos que foram publicados nos sites Corsário (CE), Cronópios (SP) e Poema Show (RJ), além de outros.
Atuei como jornalista cultural no Portal de Internet Tribuna do Sol (PI), nos anos de 2006 e 2007.
Tenho textos na internet que podem ser encontrados ao colocar o meu nome completo (ivaldo ribeiro filho), entre aspas, no google – gerando uma pesquisa específica.
Participo do site Clicfolio. Um site voltado para portfólios de trabalhadores do setor criativo. Basta por Clicfolio no google e procurar escritores do estado do estado do Piauí. Lá são encontradas informações detalhadas das atividades que desenvolvi. E-mail: ivaldoribeirofilho@gmail.com
28 abril 2009
Micheliny Verunschk à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
A poesia para mim é a forma mais eficaz de alcançar algo inatingível, a essência do real ou, antes, o real em essência. É também o único modo pelo qual posso enxergar o mundo. Ela está um degrau acima da filosofia e um degrau abaixo do amor.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Ter uma dicção própria apesar de todas as referências que o acompanham.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
João Cabral de Melo Neto
Ezra Pound
Sophia de Mello Breyner Andresen
Os três, em diferentes momentos da minha vida, me ensinaram (e continuam a ensinar) os caminhos não só para um bom poema, como para a poesia. Isso é tudo e não é pouco.
Micheliny Verunschk é autora de Geografia Íntima do Deserto (Landy, 2003), indicado ao prêmio Portugal Telecom de 2004, e O Observador e o Nada (Edições Bagaço, 2003). Escreve o blog Ovelha Pop (www.ovelhapop.blogspot.com).
24 abril 2009
Alfredo Fressia à queima-roupa
1. O que é poesia para você?
Caro Edson, elétrico e aceso, primeiro minhas desculpas pelo meu atraso (três meses?) em responder as tuas perguntinhas sapecas. Confesso que não gosto dessas perguntas gigantes –o que é a vida, o mundo, para que existe o homem-. Uma resposta “ontológica” está condenada a ser incompleta. Idem as respostas fenomenológicas. Eu prefiro dar uma “resposta” –gigante também- assumidamente incompleta, a saber, a poesia é o melhor, mais profundo e mais denso espaço de reflexão da experiência humana. Por isso ela não é simpática ao capitalismo (assim dizia um verso de Gelman), nem aos tempos que correm, regidos pela pressa, pelo sumiço do homem nas multidões e pelas manipulações mediáticas. Ela é sabidamente perigosa e rebelde, uma teimosa mosca na sopa.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Iniciante ou velho de guerra, o poeta deve lembrar dessa rebeldia da poesia. O trabalho poético é artesanal, e não é vendável. A unidade da poesia é o poema, eventualmente até o verso, por isso o suporte livro não é absolutamente da sua natureza intrínseca. A poesia pode existir em qualquer mídia e qualquer paisagem humana, o jornal, a tela do computador, ou nessa “mídia” chamada memória. Ou na lua, lembraria o peruano Jorge Eduardo Eielson, onde queria ser enterrado e queria enterrar um poema dele, coitadinho.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Não, meu caro Edson, só três textos de só três poetas eu não escolho. A poesia é feita por todos, dizia meu patrício, o Isidoro Ducasse (e olha que ele se dizia Conde), ela é um tecido infinitamente polifônico, até pelo avesso do avesso o poeta é referência. Não há lugar para a penumbra em se falando de poetas. Quanto aos meus poetas mais amados, não somente eles são “íntimos” como também a obra deles quase não ilumina os poemas que me tocou escrever. Juro, é assim.
Caso Edson, não acho uma fichinha em português. Não tem tu vai tu mesmo em espanhol:
Alfredo Fressia nació en Montevideo en 1948. Radica en Saõ Paulo, Brasil, desde 1976, donde ha sido profesor y periodista cultural. Su trabajo literario, que incluye la traducción de poesía, la crítica y la crónica, se centra sin embargo en la creación poética. Su obra, traducida a varias lenguas, se compone hasta el presente de los siguientes poemarios:
Un esqueleto azul y otra agonía. Ediciones de la Banda Oriental. Montevideo. 1973. Premio del Ministerio de Educación y Cultura.
Clave final (Montevideo-Niterói 1975-1979). Ediciones del Mirador. Montevideo. 1982.
Noticias extranjeras. Ediciones del Mirador. Montevideo. 1984.
Destino: Rua Aurora. Edición del Autor. São Paulo. Primera y segunda ediciones. 1986.
Cuarenta poemas. Ediciones de UNO. Montevideo. 1989.
Frontera móvil. Aymara. Colección Arequita. Montevideo. 1997. Premio del Ministerio de Educación y Cultura.
El futuro/O futuro. Edición bilingüe. Versión portuguesa a cargo de Hermínio Chaves Fernandes. Edições Tema. Lisboa (Portugal). 1998.
Amores impares. Collage de poesía sobre la obra de nueve poetas uruguayos. Aymara. Colección Cuestiones. Montevideo. 1998.
Veloz eternidad. Vintén Editor. Montevideo. 1999. Premio del Ministerio de Educación y Cultura.
Eclipse. Cierta poesía 1973-2006. Civiles iletrados. Montevideo-Maldonado. 2003. Reeditado por Alforja Conaculta-Fonca, Colección Azor, México D.F., 2006.
Senryu o El árbol de las sílabas. Linardi y Risso. Col. La hoja que piensa. Montevideo, 2008. Premio Bartolomé Hidalgo 2008.
E-mail: alfress@uol.com.br
22 abril 2009
Marcelo Ariel à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
A busca do Real fora da ficção do eu, onde a linguagem renasce como uma luz e um mapa para a descoberta do mundo.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Deve perseguir a renúncia ao eu através da linguagem, mesmo que para isso esbarre na incompreensibilidade e na obscuridade, aliás, a obscuridade limpa. Deve ler muito e sempre, principalmente os antigos que tinham a elegância de não assinar, ler os livros sagrados: Os Vedas, o I-Ching, a Bíblia (Nas versões de Martin Buber e André Chouraqui), O Tao Te King, o Dhammpada, o Alcorão, o Masnavi, enfim a leitura dos livros sagrados é a fonte da melhor poesia , não existiria Shakespeare sem a Bíblia do Rei James.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Herberto Helder e sua Poesia Toda, Helder abriu para mim um campo vasto de significados para a imagem como o acontecimento mágico, no sentido mais profundo e menos metafísico dessa palavra.
Wittgenstein e seu Tractatus Lógicus Filosoficus, um livro que me emociona até as lágrimas, porque seu autor tenta recuperar a dignidade do silêncio e desmontar a grande falcatrua do iluminismo, que até hoje serve de base para uma visão equivocada da vida e do mundo.
Fernando Pessoa e sua Obra Poética, Pessoa me mostrou a possibilidade que temos de criar universos quando nos afastamos um pouco da ficção do eu ou o reviramos pelo avesso, a poesia é a essência da magia e só a magia é real, aprendi isso com Pessoa.
Marcelo Ariel, nasceu em Santos-SP em 1968, Poeta, autodidata e perfomer. Autor dos livros: ME ENTERRE COM A MINHA AR 15 (Coletivo Dulcinéia catadora-SP-2007), TRATADO DOS ANJOS AFOGADOS (Letraselvagem-SP-2008) e O CÉU NO FUNDO DO MAR (a ser lançado pelo Coletivo Dulcinéia Catadora). E-mail: marceloahriel@yahoo.com.br
20 abril 2009
Paulo de Toledo à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Poesia é a arte de transformar signos simbólicos em signos icônicos (sempre no sentido peirceano).
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
O novel deve tentar descobrir as características que tornam os melhores poetas melhores do que os não-melhores-poetas. Depois de descobertas essas características, ele deve tentar descobrir uma forma de incorporar essas características de maneira a parecer que essas características sejam exclusivas dele. De que maneira? Não sei. Ainda estou tentando descobrir.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Os poetas e livros citados a seguir referem-se àqueles que serviram de base para a minha formação.
Os poetas: Fernando Pessoa, e. e. cummings e Augusto de Campos.
O Pessoa foi o poeta que primeiro causou em mim o deslumbramento poético. Quando li pela primeira vez coisas como o poema “Aniversário”, só consegui pensar em virar poeta.
Já em cummings e Augusto, encontrei um aspecto lúdico que tem muito a ver com o meu temperamento e biografia. Pra quem foi alfabetizado lendo gibis da Marvel, as Letras devem necessariamente ter cor, sabor, movimento etc. O preto no branco nem sempre dá conta do que rola na cabeça e no coração.
Os textos: ABC da Literatura (Ezra Pound), Understanding Media (Marshall McLuhan) e Semiótica e Literatura (Décio Pignatari).
Só quando descobri o ABC, é que comecei realmente minha alfabetização literária. A lição poundiana me possibilitou ter uma atitude crítica com relação a todo e qualquer paideuma — ou coisa que o valha—, inclusive aquele elaborado pelo magnífico autor dos Cantares.
McLuhan me revelou as engrenagens das coisas. Ler Marshall McLuhan foi como ingressar numa escola de relojoaria. Com ele, pude entender melhor as especificidades da literatura em relação às outras formas de arte. E, principalmente, pude compreender melhor a diferença entre poesia e prosa, entre poesia oralizada e poesia escrita, entre som e letra.
Semiótica e Literatura foi um dos livros mais importantes da minha vida. Posso dizer que ele, juntamente com a leitura posterior dos escritos peirceanos, foi o hardware que permitiu que eu pudesse “rodar” todos os softwares artísticos e poéticos com que me deparei vida afora.
PAULO DE TOLEDO (Santos/SP, 1970) é poeta. Publicou 51 Mendicantos (Ed. Éblis, 2007, Porto Alegre). Venceu o V Projeto Nascente (USP/Ed. Abril). Tem poemas, contos, traduções e ensaios em vários sites de arte e literatura e nas revistas Babel, Sítio, Coyote, Cult e nos jornais Augusto, Casulo e Correio das Artes. Participou da edição crítica de "Catatau" (ed. Travessa dos Editores), obra de Paulo Leminski. Alimenta um blog de estimação: http://paulodtoledo.blog.uol.com.br E-mail: paulodtoledo@uol.com.br
18 abril 2009
Jairo Pereira à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Até tempos atrás sustentava que poesia era produto fenomênico do pensamento, extrato de experiências cósmicas... extrema liberdade das linguagens. Hoje fujo de qualquer definição da dita.
Na verdade, poesia é mistério apreendido por um milagre das linguagens. Nem sempre acontece, mas com técnica (tipo um método subjetivo detido pelo verdadeiro poeta) o milagre tende a se repetir inúmeras vezes.
Poesia supera a filosofia na inauguração dos novos espaços do pensar, que o próprio visionarismo possibilita. Poesia, acata a dinâmica das linguagens que sempre se renovam, e atrás do poeta devem correr antropólogos, filósofos, exegetas e toda sorte de pensadores.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Considerar a poesia quase como um ofício, do qual não se pode esperar retorno financeiro. É missão na vida do sujeito criador. Missão de fé e descoberta das linguagens. Ninguém se mantém poeta por que quer, mas algo misterioso o faz poeta pra toda vida.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Angusto dos Anjos, me marcou com sua poesia forte. Não pela forma, mas sempre pelo conteúdo.
Edgar Allan Poe, pelo poema “O corvo” que lia e relia abismado.
Manuel Bandeira q. me emocionou quando li na escola o poema “A última canção do beco”.
Os poetas que cito, apenas me chamaram a atenção pra poesia, numa época em que sequer escrevia poemas, dos 17 aos 21. Comecei a escrever em poesia somente aos 24 anos, embora já tivesse alguns manuscritos bem amadores.
jAirO pEreIra. Nascido em 23/03/56 em Passo Fundo-RS. vive e trabalha em Quedas do Iguaçu-PR há mais de vinte anos. editou sete livros, sendo: O artista de quatro mãos – contos - ; O antilugar da poesia – manifesto poético - ; Signo de minha prática – poesia - ; Meus dias de trabalho – poesia - ; O abduzido – romance/ensaio e o livro-poema Capimiã pela Editora Medusa, Coleção Ruptura Réptil e ESPIRITH OPÉIA, Editora dos Recusados, poesia. Tem ensaios e artigos publicados em várias revistas e jornais (revistas escritas e eletrônicas como TANTO, EM TEMPO, A ARTE DA PALAVRA, BLOCOS, VERBO 21, COYOTE, PALAVREIROS,ONTEM CHOVEU NO FUTURO, REVISTA ZUNÁI, CRONÓPIOS, CAPITU, as últimas três de São Paulo e outras.
E-mail: jairopereiraadv@hotmail.com
Site: www.jairopereira.com.br
16 abril 2009
Affonso Romano Sant'Anna à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Poesia é o espanto transverberado.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
A mesma coisa que qualquer iniciante em qualquer matéria ou profissão. Iniciar sempre, até o fim. Ou, no caso da poesia, desconfiar dos que oferecem a receita da “verdadeira” poesia.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
O rei Davi, salmista
Camões, o lírico
Drummond
A Bíblia
Cartas e ensaios de Mário de Andrade
Introdução à metafísica - Heidegger
Affonso Romano de Sant’Anna: Um dia dizendo seus poemas no Festival Internacional de Poesia Pela Paz, na Coréia (2005), ou fazendo uma série de leituras de poemas no Chile, por ocasião do centenário de Neruda ( 2004), ou na Irlanda, no Festival Gerald Hopkins(1996), ou na Casa de Bertold Brecht, em Berlim(1994), outro dia no Encontro de Poetas de Língua Latina(1987), no México, ou presente num encontro de escritores latino-americanos em Israel(1986), ou participando o International Writing Program, em Iowa(1968), Affonso Romano de Sant’Anna tem reunido através de sua vida e obra, a ação à palavra . Nos anos 90 foi escolhido pela revista "Imprensa" um dos dez jornalistas que mais influenciam a opinião pública. Em 1973 organizou na PUC/RJ a EXPOESIA, que congregou 600 poetas desafiando a ditadura e abrindo espaço para a poesia marginal; foi assim quando em 1963, no início de sua vida literária, tornou-se um dos organizadores da Semana Nacional de Poesia de Vanguarda, em Belo Horizonte. Com esse mesmo espírito de aglutinar e promover seus pares criou, em1991, a revista “Poesia Sempre” que divulgou nossa poesia no exterior e foi lançada tanto na Dinamarca, quanto em Paris, tanto em São Francisco quanto New York, incluindo também as principais capitais latino-americanas. Atento à inserção da poesia no cotidiano, produz poemas para rádio, televisão e jornais. Tendo vários poemas musicados (Fagner, Martinho da Vila), foi por essa e outras razões convidado a desfilar na Comissão de Frente da Mangueira na homenagem a Carlos Drummond de Andrade, em 1987. Apresentou-se falando seus poemas, em concerto, ao lado do violonista Turíbio Santos. Tem também quatro CDs de poemas: um gravado por Tônia Carrero, outro comparticipação especial de Paulo Autran, outro na sua voz editado pelo Instituto Moreira Salles e o mais recente outro pela Luzdacidade, com a participação de atrizes e escritoras. Seu CD de crônicas, tem participação especial de Paulo Autran. Escreveu dezenas de livros de ensaios e crônicas. Como cronista, aliás, substituiu Carlos Drummond de Andrade no “Jornal do Brasil” (1984). E-mail: santanna@novanet.com.br
14 abril 2009
Reforma da Lei Rouanet
Reproduzo abaixo o texto que o poeta Ademir Assunção postou em seu blogue e que, para o bem dos escritores, deverá repercutir na rede e em outras instâncias. A discussão e a ação dos autores é importante, pois, o que está em jogo é se a Literatura vai ser considerada ou não como uma arte literária ou simplesmente como um resultado das edições em livros. Temos que interferir!
É COM VOCÊS, ESCRITORES
Não sei se todos estão acompanhando. Uma nova lei, que substitui a Rouanet (mas não acaba com ela, ao contrário do que os barões da cultura dizem) vai ser enviada ao Congresso Nacional. Para votação. A pressão contrária vai ser brutal. Por quê? Há muita grana envolvida na parada. E os barões da cultura e as grandes empresas não querem perder a mamata de fazer marketing privado com dinheiro público.
A nova lei propõe a incrementação do Fundo Nacional de Cultura. Na minha opinião, é um mecanismo que vai favorecer os independentes. E os barões da cultura não querem isso. O texto da nova lei está disponível para consulta pública no site do Ministério da Cultura. Todo mundo pode opinar (de preferência, com propriedade, sabendo o que está falando).
No nosso caso, dos ESCRITORES, ainda há uma distorção. Continuam nos colocando no guarda-chuva do “Livro e Leitura”. Eu cansei de falar contra isso nas reuniões que participei. Uma bosta isso. Livro é livro, é o produto. Literatura é o que vem antes: a arte literária. Livro é o produto industrial das editoras. Literatura pode se manifestar em outras formas: revistas, sites, cds, cds-rom, jornadas literárias, encontros de escritores com leitores, enfim, uma infinidade de outras coisas que não se resumem ao livro.
A nova lei cria o Fundo Setorial das Artes que inclui, repare bem, teatro, circo, dança, artes visuais e música. Reparou? Literatura não está incluída aí, como arte. Eu estou cansado de bater na mesma tecla. Estou também sem tempo (preciso batalhar minha própria sobrevivência). Mas sugiro que todos os escritores que ainda têm alguma consciência façam uma coisa simples: entrem no site no Minc, sigam ao link da consulta pública da nova lei e exigam que a literatura seja considerada como uma arte. Que ela saia do guarda-chuva “livro e leitura” e passe para o Fundo Setorial das Artes. Só assim, a criação literária poderá receber recursos públicos, justos, através de editais públicos, e não sob a (má) vontade de um gerente de marketing de uma grande empresa (que nunca está interessado num projeto literário).
Depois, não adianta espernear quando barões da cultura surgirem com projetos mirabolantes. A oportunidade é agora. Se mexam. Todos os outros setores estão se mexendo. O link do Ministério da Cultura é esse aqui: http://www.cultura.gov.br/site/ À direta no site você vai ver de forma bem visível: Reforma da Lei Rouanet. É ali.
Ademir Assunção é poeta e jornalista, autor dos livros, entre outros, LSD Nô, Zona Branca e Adorável Criatura Frankenstein e do cd Rebelião na Zona Fantasma. É um dos editores da revista Coyote. Blog: http://zonabranca.blog.uol.com.br
Site: http://zonafantasma.sites.uol.com.br E-mail: zonabranca@uol.com.br
É COM VOCÊS, ESCRITORES
Não sei se todos estão acompanhando. Uma nova lei, que substitui a Rouanet (mas não acaba com ela, ao contrário do que os barões da cultura dizem) vai ser enviada ao Congresso Nacional. Para votação. A pressão contrária vai ser brutal. Por quê? Há muita grana envolvida na parada. E os barões da cultura e as grandes empresas não querem perder a mamata de fazer marketing privado com dinheiro público.
A nova lei propõe a incrementação do Fundo Nacional de Cultura. Na minha opinião, é um mecanismo que vai favorecer os independentes. E os barões da cultura não querem isso. O texto da nova lei está disponível para consulta pública no site do Ministério da Cultura. Todo mundo pode opinar (de preferência, com propriedade, sabendo o que está falando).
No nosso caso, dos ESCRITORES, ainda há uma distorção. Continuam nos colocando no guarda-chuva do “Livro e Leitura”. Eu cansei de falar contra isso nas reuniões que participei. Uma bosta isso. Livro é livro, é o produto. Literatura é o que vem antes: a arte literária. Livro é o produto industrial das editoras. Literatura pode se manifestar em outras formas: revistas, sites, cds, cds-rom, jornadas literárias, encontros de escritores com leitores, enfim, uma infinidade de outras coisas que não se resumem ao livro.
A nova lei cria o Fundo Setorial das Artes que inclui, repare bem, teatro, circo, dança, artes visuais e música. Reparou? Literatura não está incluída aí, como arte. Eu estou cansado de bater na mesma tecla. Estou também sem tempo (preciso batalhar minha própria sobrevivência). Mas sugiro que todos os escritores que ainda têm alguma consciência façam uma coisa simples: entrem no site no Minc, sigam ao link da consulta pública da nova lei e exigam que a literatura seja considerada como uma arte. Que ela saia do guarda-chuva “livro e leitura” e passe para o Fundo Setorial das Artes. Só assim, a criação literária poderá receber recursos públicos, justos, através de editais públicos, e não sob a (má) vontade de um gerente de marketing de uma grande empresa (que nunca está interessado num projeto literário).
Depois, não adianta espernear quando barões da cultura surgirem com projetos mirabolantes. A oportunidade é agora. Se mexam. Todos os outros setores estão se mexendo. O link do Ministério da Cultura é esse aqui: http://www.cultura.gov.br/site/ À direta no site você vai ver de forma bem visível: Reforma da Lei Rouanet. É ali.
Ademir Assunção é poeta e jornalista, autor dos livros, entre outros, LSD Nô, Zona Branca e Adorável Criatura Frankenstein e do cd Rebelião na Zona Fantasma. É um dos editores da revista Coyote. Blog: http://zonabranca.blog.uol.com.br
Site: http://zonafantasma.sites.uol.com.br E-mail: zonabranca@uol.com.br
12 abril 2009
O culto ao amador e aos amantes
A reação começou há algum tempo. E vai gerar muita discussão, polêmica, defesas e táticas de guerra.
Na Ilustrada deste sábado (11/04/2009) podemos conferir a “crítica” de colunista da Folha sobre o livro de Andrew Keen, O culto do amador, recém-lançado no Brasil pela Jorge Zahar. Keen, que foi professor da universidade de Massachusetts e de Berkeley (EUA) e um dos pioneiros do Vale do Silício, já se tornou figurinha carimbada com suas opiniões medrosas e amedrontadoras que vaticinam o fim de nossa cultura se a liberdade e a facilidade da web 2.0 continuar com os seus milhões de blogueiros e “pseudo-editores” gerando e postando conteúdos e informações na Net. O subtítulo de seu livro em inglês já diz tudo: “como a internet de hoje está matando a nossa cultura”.
Você pode acompanhar e conhecê-lo mais acessando o seu blog (sim, claro, ele também bloga), http://andrewkeen.typepad.com/.
O colunista [João Pereira Coutinho], em sua “crítica”, não deixa de se colocar e tomar partido (pois o texto está sem aspas...): “A internet, e o culto do amadorismo que ela promove, ameaça as instituições culturais que fizeram o nosso mundo. Jornais, música, literatura ou cinema estão sendo assaltados por milhões de internautas que não respeitam os direitos autorais e roubam conteúdos sem um pingo de vergonha. Sem falar do resto: exércitos de blogueiros em pijama que acreditam e professam um radical igualitarismo de opiniões. Na cacofonia da internet, um Ph.D. de Harvard, que passou os melhores anos da sua vida enfiado em bibliotecas, não tem mais valor intrínseco do que um autodidata adolescente, que plagia ou inventa na cave do seu subúrbio. Será possível suportar este assalto?”
O mesmo jornal já havia publicado uma entrevista com ele, Keen, em 2007. Se você tiver acesso ao UOL ou a Folha poderá conferi-la aqui. Nela ele diz que “Há um legado hippie na filosofia libertária da blogosfera, no desprezo à autoridade, à mídia tradicional. Acho que a autoridade do Estado, da mídia, são coisas que devemos prezar, porque têm valores significantes que, se minados, criariam a anarquia. A rejeição da autoridade vista nos blogs não é progressista, é anarquista.”
Para mim é justamente este o ponto de inflexão e de possibilidade inovadora gerada pela Net — pelos sites e pelos blogues. Principalmente, em se tratando de Cultura. São vozes alternativas e não viciadas que, justamente por não se afinarem ao establishment, poderão romper paradigmas e criar caminhos novos e insuspeitados.
Os blogues surgiram em 1999 e hoje estão longe de serem simples diários umbigóides e sem interesse geral. Estima-se que existam mais de 10 milhões de blogues na rede e a cada instante milhares de novos blogues são criados. O crescimento é assustador e não pode ser ignorado. E não está sendo. A reação da mídia tradicional toma corpo e desloca-se para o campo das idéias, e das noções de autoria/autoridade e de direitos.
Já houve um debate sobre o livro no Prosa Online. Confira.
O jornal O Estado de S. Paulo, também, já faz parte da história deste confronto com sua campanha que “insinuava” serem os blogueiros meros macacos. Veja aqui.
Acabo de ler o livro de Hugh Hewitt, BLOG – Entenda [entendendo] a revolução que vai mudar seu mundo. Esperava mais, bem mais... No entanto, para quem se preocupa com a questão, ou está no meio dela, é um livro que precisa ser lido. O cara é um republicano autodenominado de centro-direita, professor de Direito na Chapman University e já foi apresentador de TV e agora de rádio.
Quando escreveu o livro, havia em torno de quatro milhões de blogues na rede e ele conta, de seu ponto de vista e de outros blogueiros, a invasão dos blogues na “seara da política e do jornalismo”. A partir daí, os blogues e blogueiros começaram a chamar atenção e, alguns, a serem mais respeitados do que os comentaristas e jornalistas da mídia tradicional.
Apesar de todo papo republicano e antiesquerdista (pré-Barack Obama, que usou como ninguém a Net e a blogosfera) de Hewitt ele acerta o alvo quando diz: “O que permitiu que Lutero fosse bem-sucedido em sua reforma quando outros tinham fracassado? O que permitiu a Calvino moldar o pensamento de todas as gerações que vieram depois? A imprensa. Em 1449, Gutenberg amplificou a voz humana de tal modo que ela pôde ser ouvida em todo o mundo. Ele forneceu os meios pelos quais uma pessoa pode se comunicar com as massas sem a interferência das estruturas institucionais. Finalmente os indivíduos podiam falar, e ninguém podia silenciá-los.
Para a mídia hegemônica, estamos ao mesmo tempo em 1449 e 1517.”
Em outro momento do livro ele diz: “Os blogs são feitos de velocidade e confiança e a mídia tradicional hegemônica é lenta demais e tem confiança de menos.”
Em outras palavras, o que concluo baseado em meu próprio trabalho e incursões na Net é que a autoridade do Estado, da mídia, das grandes corporações, das editoras, da Academia, não deve ser menosprezada e sim levada em consideração na “cruzada” por uma nova cultura mais aberta, mais solidária (com o reconhecimento e valorização das inúmeras diferenças) e “verdadeira” — com consciência e sem ingenuidade. Uma Cultura onde os fundamentos possam ser questionados e, quiçá, redirecionados. Se queremos um novo mundo, precisamos interferir nele. Conhecer e utilizar suas amplas ferramentas.
10 abril 2009
Ana Elisa Ribeiro à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
Eu não sei bem o que é, mas certamente é algo necessário em minha vida. A poesia é um aspecto das coisas que só alguns conseguem transformar em texto. Talvez isso. E esse texto precisa ter certas características. Umas delas são óbvias, formais; outras são mais sutis. João Cabral de Melo Neto dizia que o poeta sabe quando o poema está pronto porque o texto faz um clique, algo parecido com o clique dos estojos quando se fecham. O pulo do gato da poesia, para o poeta, é esse clique. Para o leitor, o texto precisa provocar um outro clique desses.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Ele deve perseguir a precisão. Não é engraçado? Geralmente, associamos a poesia à subjetividade, à abstração. Essas coisas têm um quê de vaguidão. Mentira. O poema precisa ser exato, justo. Não pode ter palavra demais.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Não são exatamente escolhas. São cliques. A gente lê um poeta, um dia, e calha de ele fazer clique na gente. Foi assim com Paulo Leminski, que me deixou perplexa por uns dias. Conheci os poemas dele no colégio. João Cabral de Melo Neto me deixava perplexa de um outro jeito. E, por fim, a Adília Lopes, que tem uma ironia que me causa muito estranhamento.
Ana Elisa Ribeiro nasceu em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, em 1975. Graduou-se em Letras, língua portuguesa, e desenvolve tese de doutoramento sobre a formação de leitores de textos na Internet. Publicou Poesinha (Poesia Orbital, 1997) e Perversa (Ciência do Acidente, 2002), além de minicontos e poemas em revistas e jornais, no Brasil e em Portugal. É cronista do site Digestivo Cultural (www.digestivocultural.com). Tem dois livros prontos para serem publicados: Meu amor é puro sangue, de contos, e Portáteis, de poemas. E-mail: escrevaquerida@gmail.com
08 abril 2009
Anibal Beça à queima-roupa
1) O que é poesia para você?
A poesia se há uma função para ela, é a de ter o poder de transformar o irreal no real e o real no imaginário. Tem o poder de humanizar um mundo que está zangado consigo. Este mundo em que vivemos em meio a tanta barbárie.
Creio no poder da poesia, que me dá razões para ver adiante e identificar um clarão de luz. Eu sou um trabalhador de metáforas, não um trabalhador de símbolos.
Eu considero a poesia uma medicina espiritual. Posso criar com palavras o que não encontro na realidade. É uma tremenda ilusão, mas positiva: não tenho outra ferramenta com que encontrar um sentido para minha vida ou para a vida daqueles do meu chão (vide “Filhos da Várzea”). Tenho o poder de outorgar-lhes beleza por meio de palavras e plasmar um mundo belo expressando também sua situação. No feio também há beleza. Tudo é matéria para o poema.
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Ler muita poesia. No café, no almoço, no jantar. Ler sobre poesia. Imitar os mestres num primeiro momento. Depois saber cortar o umbigo. Poderia sugerir algumas leituras como pré-requisito: A poética de Aristóteles, Poesia de Massaud Moisés, As Vanguardas e seus manifestos de Gilberto Mendonça Teles, Poesia experiência de Mario Faustino, Poesia de T.S. Eliot, ABC da literatura e poesia Ezra Pound, Cartas a um jovem poeta de Rainer Maria Rilke, “Itinerário de Pasárgada” de Manuel Bandeira, entre muitos outros.
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
Mario Quintana, Cecília Meireles, Manuel Bandeira e Jorge de Lima. O primeiro, pela descoberta da poesia, pela criatividade e por saber manejar com o mínimo um vasto universo poético. O segundo, pela musicalidade, pelo ritmo do verso, aliados às imagens, às ideias e pensamentos de modo singular O terceiro, pelo lirismo do cotidiano, das coisas banais, tratados na simplicidade com maestria. E por último, não nessa condição, senão o primeiro dos primeiros, pela genialidade.
"O modernismo e três de seus poetas", "Razão do poema", "A volta do poema", "O fantasma romântico" ensaios críticos de José Guilherme Merquior; "Signo e Sibila" e os dois volumes de "Ensaios escolhidos" de Ivan Junqueira e "Poesia e desordem", "Romantismo", "João Cabral - a poesia de menos" e "Escritos sobre poesia e alguma ficção", de Antonio Carlos Secchin. Pelo rigor, pela atualidade, pela discussão de idéias centradas na modernidade sem perder o seu vínculo com a tradição.
ANIBAL BEÇA é o nome literário de ANIBAL AUGUSTO FERRO DE MADUREIRA BEÇA NETO, poeta, tradutor, compositor, teatrólogo e jornalista, nasceu em Manaus, na Amazônia brasileira, em 13 de setembro de 1946. Trabalhou como repórter, redator e editor, em todos os jornais de Manaus. Foi diretor de produção da TV Cultura do Amazonas, Conselheiro de Cultura, consultor da Secretaria de Cultura do Amazonas. Vice-presidente da UBE-AM União Brasileira de Escritores, presidente da ONG “Gens da Selva”, onde atualmente exerce o cargo de vice-presidente, bem como de presidente do Sindicato de Escritores do Estado do Amazonas e presidente do Conselho Municipal de Cultura;.é membro da Academia Amazonense de Letras. Neste ano de 2009, completa 43 anos de atividade literária e 45 de atuação na música popular, tendo vencido inúmeros festivais de MPB por todo o Brasil. Em 1994 recebeu o Prêmio Nacional Nestlé, em sua sexta versão, com o livro "Suíte para os Habitantes da Noite", concorrendo com 7.038 livros de todo o Brasil.
Ao lado de seus afazeres literários e musicais, tem se destacado em prol da causa da integração cultural latino-americana, seja traduzindo escritores de países vizinhos, ou participando e organizando festivais e encontros de poesia. Representou o Brasil no IX Festival Internacional de Poesia de Medellín, no III Encontro Ulrika de escritores em Bogotá e no VI Encuentro Internacional de Escritores de Monterrey. Sua produção poética tem sido contemplada em importantes revistas: “Poesia Sempre” (Brasil), “Casa de las Américas” (Cuba), “Prometeo” (Colômbia), “Ulrika” (Colômbia), “Revista Armas & Letras” da Universidade de Nuevo León ( México), “Tinta Seca”( México), “Lectura” (Argentina), “Frogpond Haiku”( Estados Unidos), “Amazonian Literary Review” (Estados Unidos), “Mississippi review” (Estados Unidos).
LIVROS PUBLICADOS: Convite Frugal, Edições Governo do Amazonas (1966), Filhos da Várzea, Editora Madrugada (1984), Hora Nua, Editora Madrugada (1984), Noite Desmedida, Editora Madrugada (1987), Mínima Fratura, Editora Madrugada (1987), Quem foi ao vento, perdeu o assento, Edições Muraquitã (teatro, 1988), Marupiara – Antologia de novos poetas do Amazonas, Edições Governo do Amazonas (organizador, 1989), Suíte para os habitantes da noite, Paz e Terra (1995), Ter/na Colheita, Sette Letras (1999), Banda da Asa – poemas reunidos, Sette Letras, (1999), Ter/na Colheita, Editora Valer (2006, segunda edição), Noite Desmedida, Editora Valer (2006, segunda edição), e Folhas da Selva, Editora Valer (2006). Chá das quatro, Editora Valer (2006) Águas de Belém, Editora Muhraida(2006); Águas de Manaus, Editora Muhraida( 2006). PALAVRA PARELHA reunindo os livros Cinza dos Minutos, Chuva de Fogo, Lâmina aguda, Cantata de cabeceira e Palavra parelha, Edições Galo Branco, Rio, 2008.
CD – MÚSICA: ANIBAL BEÇA – O Poeta solta a voz (2001) e DUAS ÁGUAS – 2006
E-mail: anibal.beca@vivax.com.br
06 abril 2009
Tavinho Paes à queima-roupa
Crédito: PAULO BATELLI
do work-in-pro FACES::TRANSFORMATIONS
1) O que é poesia para você?
...no meu caso específico, muito além do trato com palavras de uma língua que quem a usa deveria amar, posso dizer categoricamente que a poesia foi meu ganha-pão desde anos 70 e 80 ... portanto, apesar de me confundir com platônicos desesperados que de Homero não ouviram o recado, seria politicamente correto afirmar que, a poesia (se já não foi ou se ainda será), é a máquina da minha vida ... mas, no caso especificamente técnico da pergunta, a poesia pode ter sido aquela luz que projetou a sombra do homem no fundo de uma caverna, variando como os ventos que correm o mundo, entre a vida arcaica e a morte moderna ... acredito que, sem a poesia, o arco-íris não teria sete cores, as flores não exalariam odores, as borboletas não sairiam de seus casulos, o zero seria nulo e os frutos que sucedem uma flor num pomar, não conheceriam sua forma evoluída nem suas propriedades vitais contra a fome que, no homem, é capaz de matar ... se a poesia não existisse, as musas dos poetas não seriam lindas e amar alguém seria tão instintivamente triste quanto um deserto sem oásis ou um luar sem a possibilidade de um eclipse ... se para alguns contemporâneos meus, a poesia tem sido água que mata a sede e, em alguns casos clinicamente mais graves, o ar que ajuda o coração bombear sangue no corpo, para mim, a poesia é como o feedback do sinal de um sonar; e, muito embora, para alguns, seja motivo de estudos profundos, capazes de determinar o motivo da morte de um defunto, a poesia é a morte que em vida se persegue cada vez que se a evita ... quem sabe o que é a poesia, sabe que, pelo Hades, a carona na barca de Carontes é para todos, mas o passeio é para os poucos que souberem admirar a paisagem que, incontinente, desfila em ambas as margens...
2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
... primeiro, perceber no fundo da alma que não é (nem nunca será) um iniciante; mas, um iniciado num saber esotérico onde deus, seja católico, muçulmano ou judeu, não lhe pedirá que pague nenhuma promessa nem lhe oferecerá nenhum milagre ... segundo, ao contrário do que atualmente lhe impõe o mercado (este transcedental demônio do mundo pós-moderno e da democracia neo-liberal dos poetas de Chicago), não deve ignorar o olhar da Medusa que chamamos de Tradição (a qual, se for possível, pode-se, de forma original, desmontar) ... nem abstrusamente quebrar, como um rebelde sem causa tão cheio de liberdades que à liberdade não tenha nada a declarar, o pacto inter-geracional que nos insere no voltaico fluxo da história e faz com que a presença dos poetas (e a de seus versos) possa ser digna das fundamentais memórias do futuro, evitando ficar só, em seu umbigo egocentrado, desafiando o mundo com a soberba das vaidades mais provincianas e inexatas, perdido como um calendário que não calcula idades, sem qualquer referência daquele presente que havia antes que sua vida começasse e que vai estar presente quando ela se acabar ... para fazer poesia (mesmo a mais concreta e imaterial), além de ler (mesmo que a título de ilustração descartável) o iniciante deve perceber que, em tempo real, os verbos não têm tempo de informar em que tempo estão sendo conjugados, como se o presente do indicativo, dobrado pela língua em que está sendo falado, não tivesse mais futuro nem passado...
3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
... aquele poema de Baudelaire, em que 3 gerações de mendigos aproximam-se da vidraça de um restaurante e observam um casal degustando algo da ordem palatoniana dos fois-gras: o avô olha faminto a iguaria criada por um poeta dos molhos e temperos que o casal aristocrata come em estado de graça; o pai, ainda romântico, observa com interesse emocional o amor com que o paladar do acepipe sagrado juntou àquela mesa de amantes socialmente privilegiados; enquanto o neto, com a língua exigindo mais do que um item num cardápio, simplesmente inaugurando a modernidade, fixa seu olhar na luz elétrica recém instalada e percebe que o futuro é o único desejo da alma da gente que se mantém latente tanto no presente quanto no passado...
... aquele poema de Fernando Pessoa que identifica que a dor que o poeta sente é uma dor ausente, que só se faz presente nas palavras do poema em que é fingida e desejada como uma amiga querida, trazendo consigo, tanto na cicatriz quanto na ferida, a magma certeza de que, no ato em que é sentida, funda a incerteza da poesia que a retrata viva, numa alma, que, sem a vida, não passaria de uma fantasia abstrata...
... aquele poema do Augusto de Campos, em que um substantivo-signo (cidade) sufixa palavras comuns ao Frances e ao português de tal maneira, que torna o idioma inglês mais latino do que derivado do germânico híbrido que precisou de Sheakspeare para ser realmente inventado ... neste poema incrível, quando sua heterodoxa leitura em voz alta é chamada, a polissílaba palavra criada, que é dita pela voz que toca na língua que fala, vai e volta ao infinito das possibilidades das línguas que ainda poderão ser faladas neste planeta, em que a maioria lê sem poder doar aos demais sentidos o que lendo vê e lido pode ser ou não ser aquilo que dito se fala...
... mesmo que três seja o bastante sendo, como diz o ditado: demais ... não quero esquecer da Pedra de Drummond, da Usura de Pound nem da Língua de Caetano Veloso (especialmente quando recitada à capella por Elisa Lucinda) ... são mais de três, os fotogramas falados com os quais Glauber, Eisenstein e Godard me ensinaram a ver como sílabas de palavras imaginárias que a tudo definem a partir do nada ... são mais de três, as imagens inscritas palavras que artistas como Duchamp, Nan-June-Paik e Oiticica me ofereceram para entender exatamente o quê num poema cala, enquanto a poesia nele fala ... são mais de três, as figuras da santíssima trindade, já que o espírito santo, além de santo, é são e são muitos os espíritos que, como ele, chamam de mãe quem, além dos desígnios de deus, uma a vida lhes deu ... três, dito de uma só vez, é sempre mais do que um simples três ... dizem os cosmopatas que pode até se mais do que três se outro três ao cubo lhe elevar ... assim sendo, são por mais de três lembranças que, a poesia, que de velho me faz criança, da mais abstrata ao mais metrificado soneto, sempre foi minha guia para a perdição ... meu mapa, meu mundo, meu amuleto e meu patuá...
Tavinho Paes é aquariano com ascendente em aquários, nasceu carioca da gema em janeiro de 1955, pelas mãos de uma parteira, na Praça da Apoteose (Catumbi-RJ). Editorialmente, pela Ibis Libris, lançou seu primeiro livro BUZINAÍ NAÏF, em 2008, posto que OS MOMOSSEXUAIS (todos os poemas podem ser vistos/escutados na web, de 2007, por não conter mais de 48 páginas, não é considerado livro, mas um panfleto. Aliás, desde 1974, no mercado informal dos 100% independentes, coleciona, até agora, 104 panfletos e livretos, que vão do mimeógrafo ao xerox, vendidos pessoalmente de mão-a-mão, com títulos como: O TRAVESTI BOSSAL (1976), CAT-XUPE (1978), O OGÃ DE OGUN (1984) e A CINDERELA DESCALÇA (1989) - uma antologia do período está sendo organizada por João José de Melo Franco, sob o título de PALESTRA, com data de lançamento prevista para o segundo semestre de 2011. Crendo que cantar seja uma das muitas formas de se falar e ler um poema, o poeta acumula mais de 250 registros fonográficos com sucessos na voz de Caetano Veloso, Gal Costa , Marina Lima , Lobão , Roupa Nova e por aí vai... Fundador do Cep 20.000, com Chacal, Carlos Emílio Lima e Guilherme Zarvos (1991) e do Festival Poesia Voa , com Bruno Cattoni, organiza eventos de poesia como o poemaShow, cinePoesia o recente kineCubB ... Foi Editor de O PASQUIM, e participou de filmes como: Rio-Babilônia e A Idade da Terra. Desde 2000, atua na internet com mais de 10 canais ativos e atualizados que podem ser acessados através de seu sítio pessoal...
Tavinho Paes by the web
www.tavinhopaes.com.br
http://tavinhopaes.wordpress.com
BLOG TAVINHO
POEMATRIX
e os mais bacanas, que tem download free
AUDIO VISUAL VOX (audio layers to audiovisual mix'n'remix)
CARNAVAL MIX (marchinhas)
add: http://tavinhopaes.04 abril 2009
Washington Benavides à queima-roupa
1) ¿Qué es poesía para usted?
La quinta pata del toro asirio o sea la ficción que sostiene a la realidad (¿una segunda realidad?) o la “tercera orilla” de Joao?.
2) ¿Qué debe perseguir un iniciado en poesía y de qué manera?
Deberá (tal vez) buscar el tono en las palabras que le sea familiar. La manera? Es un manojo de maneras: Lecturas, experiencias, diálogos, la papelera siempre llena con “los crisantemos de la desesperación”.
3) Cite tres poetas y tres textos referenciales para su trabajo poético. ¿Porqué de estas escuelas?
J.DONNE: Los metafísicos ingleses (según Eliot) son contemporáneos por su insólito matrimonio de ciencia y poesía, alquimia y descubrimientos, por la originalidad de sus imágenes.
E.POUND: El viejo Ezra es un resumen de búsquedas y reencuentros: Provenza, cantares, dolce stil novo, ideogramas sino-japoneses. Azote de la Usura (deida de lo moderno).
DRUMMOND: Encontró a la poesía en una piedra del camino.
JOHN DONNE (1573-1631) “La Canonización”
“Por Dios, guarda silencio y deja que te quiera,
o increpa ya a mi gota y perlesía, búrlate
de mis cinco cabellos grises y de mi ruina;
tu posición mejora con riquezas, tu mente,
con las artes. Avanza hasta lograr un puesto;
observa a quienes llaman “su honor” o bien “su gracia”;
el acuñado rostro del Rey o el verdadero
contempla;
aprueba lo que más te guste,
y dejarás así que yo te quiera.
¡Ay de mí¡ Por mi amor ¿a quién le llega daño?
¿Qué barcos mercantiles hundieron mis suspiros?
¿Quién dice que mis lágrimas sus tierras inundaron?
¿Cuándo apartó mi frío la pronta primavera?¿Ycuándo los ardores de mis venas
aumentaron en uno la lista de apestados?
El soldado halla guerras, y encuentra el leguleyo
A hombres litigantes, que pugnas mueven, aunque
Ella y yo nos amemos.
Llamadnos como os guste, que amor así nos hace;
Llamadle mosca a ella; decid de mi lo mismo;
Cirios somos también , consumidos muriendo,
Y hallamos en nosotros la paloma y el águila.
El enigma del fénix tiene mayor ingenio
Por nosotros, que somos, dos en uno, el enigma.
Pues a cosa neutral ambos sexos se adaptan,
Idénticos morimos y resurgimos siendo,
Al fin, por este amor, como un misterio.
La muerte podrá darnos, si amor no nos da vida,
Y si no sientan bien cadáveres y tumbas
Para nuestra leyenda, la aceptarán los versos;
Si para alguna crónica no somos pieza digna
Tendremos linda estancia en los sonetos;
Una labrada urna sienta a las más preclaras
Cenizas, cual las tumbas que miden medioacre;
Así, con tales himnos, han de aprobarnos todos
Cuando por nuestro amor nos canonicen.
Y nos digan:”Vosotros, a quien amor rendido
Trocó en ermita el uno para el otro;
Los que en amor tuvisteis paz, que es rabia ahora;
Los que el alma del mundo contraisteis
Guardada en el cristal de vuestros ojos,
Y así espejos se hacían y unos espías tales
Que todo halló en vosotros su resumen:
Países, villas, cortes;
Pedidnos en lo alto
Copia de esos amores.”
EZRA POUND (1885-1972). “La buhardilla”
“Ven y apiadémonos de los que tienen más que nosotros.
Ven, amiga, y recuerda
Que los ricos tienen criados y no amigos
Y nosotros amigos, no criados.
Ven y apiadémonos de solteros y casados.
El alba entra en punta de pie
Como una dorada Pavlova
Y yo estoy próximo a mi deseo.
Nada puede darnos la vida
Mejor que esta hora de clarísima frescura,
La hora de despertarnos juntos.”
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE (1902-1987) “De la mano”
“No seré el poeta de un mundo caduco.
Tampoco cantaré al mundo futuro.
Estoy preso a la vida y miro a mis compañeros.
Se sienten taciturnos pero alimentan grandes esperanzas.
Entre ellos, considero la enorme realidad.
El presente es tan grande, no nos apartemos.
No nos apartemos mucho, vamos de la mano.
No seré el cantor de una mujer, de una historia,
No hablaré de suspiros al anochecer, el paisaje desde la ventana,
No distribuiré estupefacientes ni cartas de suicida,
No huiré a las islas ni seré raptado por los serafines.
El tiempo es mi materia, el tiempo presente, los hombres presentes,
La vida presente.”
Washington Benavides (Tacuarembó,1930). Poeta, traductor, músico, profesor. Más de 20 libros de poesía, 3 de relatos y una novela. Traductor de Drummond de Andrade, Oswald de Andrade, Joao Guimaraes Rosa, Affonso Romano de Sant’Anna, Gregorio de Mattos, Clarice Lispector, Decio Pignatari, Mario de Sá-Carneiro. Profesor de la Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación, autor de canciones para variados intérpretes.
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